Naquele começo de tarde de 1995 – ou 6, consigo ainda, em dado momento, rever-me em minha ativida...

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Naquele começo de tarde de 1995 – ou 6, consigo ainda, em dado momento, rever-me em minha atividade diária da pintura: aos poucos, muito lentamente vou delineando uma figura masculina como elemento central do quadro. O primeiro plano é ocupado por este elemento humano, sentado em um banco de pintor. Ele tem o torso nu, descamisado. Ao lado dele há um garoto. O desenho havia se modelado pela memória de meu filho que já não vivia comigo. Passados 28 anos, consigo ainda lembrar alguns detalhes daquele momento.

Ela foi a terceira pessoa a descer do ônibus das 19 horas, da Sopa, no dizer do pessoal do Interior, por volta de 1960. É termo alusivo...

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Ela foi a terceira pessoa a descer do ônibus das 19 horas, da Sopa, no dizer do pessoal do Interior, por volta de 1960. É termo alusivo ao prato típico das refeições coincidentes com o horário daquelas idas e vindas. Sempre assim: jantar à mesa no santo recesso dos lares e, lá fora, sem falha, a buzina tocada pelo motorista Hilário, da ponta da praça.

Reencontrei o amigo querido na padaria Bonfim depois de muitos anos, na verdade desde os tempos em que estudáramos no IPEP de Dona Mar...

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Reencontrei o amigo querido na padaria Bonfim depois de muitos anos, na verdade desde os tempos em que estudáramos no IPEP de Dona Maria Bronzeado. Do abraço apertado sentamos ao redor de uma mesa e ele começou a contar sua vida errática de empreiteiro.

Tive algumas experiências com a palavra. Claro que escrever romances é bem diferente de escrever poemas, para os quais você puxa o fre...

literatura poesia arte palavra
Tive algumas experiências com a palavra. Claro que escrever romances é bem diferente de escrever poemas, para os quais você puxa o freio de mão. Nos dois casos, porém, as palavras são utilizadas e, em geral, lidas em silêncio.

Aí fiz teatro, e vi atores dizendo tudo aquilo em alto e bom som, dando vida ao que eu criara. Fiz cinema e eu mesmo disse falas e vivi as que escrevera, como se as trouxesse pra outra dimensão.

Ah, os poetas! Se não conhecê-los, como sabê-los? Dizem que quando Deus cuidou de esparramar gente por esse mundão, dividiu a humanidad...

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Ah, os poetas! Se não conhecê-los, como sabê-los? Dizem que quando Deus cuidou de esparramar gente por esse mundão, dividiu a humanidade em duas categorias, os poetas e nós. Eles (estou me referindo aos poetas) são definitivamente criaturas diversas da outra banda onde está a turma do “nós”, em que me incluo.

Serei um andarilho viajante, percorrendo diversos estados deste vasto país. Durante minhas jornadas, vivi experiências únicas e aprend...

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Serei um andarilho viajante, percorrendo diversos estados deste vasto país. Durante minhas jornadas, vivi experiências únicas e aprendi valiosas lições com os mais velhos. Eles, por vezes, se mostraram confusos e frustrados, incapazes de realizar seus próprios desejos devido à criação severa e equivocada que receberam de seus pais.

No silêncio da madrugada de Arara, o galo cantou repetidas vezes e recordei tantas ocasiões semelhantes quando morava no sítio. Acorda...

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No silêncio da madrugada de Arara, o galo cantou repetidas vezes e recordei tantas ocasiões semelhantes quando morava no sítio. Acordado por esse canto do galo madrugador bem próximo, tentei descobrir de onde vinha seu cantar, como fazia no tempo de menino camponês, enquanto dormia o sono dos justos.

As alucinações são características das manifestações delirantes, podendo ocorrer tanto de forma individual quanto em grupo. Um dos se...

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As alucinações são características das manifestações delirantes, podendo ocorrer tanto de forma individual quanto em grupo. Um dos seus sintomas mais intensos é o delírio religioso, que se classifica nos critérios estabelecidos pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM). Sigmund Freud (1856 - 1939), psiquiatra e psicanalista austríaco, em seu artigo intitulado O Futuro de uma Ilusão (1927), afirmou: "A ilusão religiosa é a mais implacável e persistente, ela está ligada a um impulso e se aproxima dos delírios psiquiátricos". Essa falha psíquica pode incluir a projeção de grandiosidade,

      TRISTEZA NO OLHAR Quem me vê, assim, contente, Sorrindo por todo canto, Não percebe que o meu pranto, Habita em mim, aq...

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TRISTEZA NO OLHAR
Quem me vê, assim, contente, Sorrindo por todo canto, Não percebe que o meu pranto, Habita em mim, aquiescente. Sinto o que o coração sente, Preciso compartilhar, Escrever, desabrolhar, O meu verso é profundeza, E o meu olhar traz tristeza, Muita tristeza no olhar.

Em nome de discutíveis ordens, de injustas leis, de absurdas razões, os poetas são impunemente censurados, perseguidos, presos, tortura...

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Em nome de discutíveis ordens, de injustas leis, de absurdas razões, os poetas são impunemente censurados, perseguidos, presos, torturados, fuzilados. Silenciados, enfim, os poetas. E, em cada um deles que se cala, morre um pouco da Humanidade. Sepulta-se parte do imaginário, esse traço atávico, essa força instintiva e divinatória que lhes permite profetizar o futuro, sonhar com outra humanidade, perseguir a utopia realizável de um mundo mais justo e, consequentemente, mais humano e mais feliz.

Acendeu a luz, pressionando o interruptor até ouvir um clique, e entrou no quarto transpondo o umbral que separava esse cômodo da sal...

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Acendeu a luz, pressionando o interruptor até ouvir um clique, e entrou no quarto transpondo o umbral que separava esse cômodo da sala onde se encontrava. Percebeu que estava sozinho, pois ali não havia ninguém. Lembrou-se então de telefonar para Lucélia. Fez isso utilizando o único aparelho que havia no quarto, já que ali não existia outro, e pressionando o polegar nas teclas que correspondiam ao número da moça. Certamente ela ouviu a chamada, pois atendeu. E quase imediatamente, uma vez que não se passou muito tempo, perguntou “Quem é?” – sinal inequívoco de que não sabia quem tinha ligado.

Uma obra de arte, mesmo que composta por resina de poliéster e aço inoxidável, pode inspirar este escritor a sentir o silêncio da fal...

esculturas jaume plensa
Uma obra de arte, mesmo que composta por resina de poliéster e aço inoxidável, pode inspirar este escritor a sentir o silêncio da fala impedida, através da expressão fechada e assustada, como um lamento e vontade de fuga da palavra, que se esconde na alma ansiosa do verbo. O artista e escultor espanhol Jaume Plensa, construiu a escultura "Silent Hortense", um rosto de mulher com mãos na boca, e semblante com dor expressa em olhos, marcados pela angústia e sufoco.

Era um casal simpático. Caseiro. Ele cego. Ela colecionadora de terços. Viviam a estação da colheita. Aguardavam minha visita, cada ta...

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Era um casal simpático. Caseiro. Ele cego. Ela colecionadora de terços. Viviam a estação da colheita.

Aguardavam minha visita, cada tardinha de sábado, e me recebiam efusivos; notava neles uma certa ansiedade se diluindo, enquanto eu me aposssava de confortável poltrona. Ele conversava todos os assuntos mais importantes da atualidade. Passados alguns minutos começava o ritual. A vela acesa num candelabro ímpar bonito e trabalhado.

A escritora Heloísa Buarque de Hollanda, que acabou de tomar posse na Academia Brasileira de Letras, na vaga de Nélida Piñon, resolve...

Heloisa Buarque hollanda trca nome
A escritora Heloísa Buarque de Hollanda, que acabou de tomar posse na Academia Brasileira de Letras, na vaga de Nélida Piñon, resolveu, aos 84 anos, trocar de sobrenome. Reirou o Buarque de Hollanda de seu ex-marido e colocou no lugar o Teixeira de sua mãe. Heloísa é uma intelectual respeitada, independentemente de gênero. É também uma feminista antiga (no bom sentido) e militante, e é provavelmente por este viés que ela explica a inusitada decisão.

O Brasil não merece os brasileiros... O brasileiro não conhece o Brasil... Quando na cerimônia da XXXI Abertura dos Jogos Olímpicos ...

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O Brasil não merece os brasileiros... O brasileiro não conhece o Brasil...

Quando na cerimônia da XXXI Abertura dos Jogos Olímpicos de Verão, no Rio de Janeiro, escolheu-se aclamar Larissa de Macedo Machado em detrimento de inúmeras cantoras de fato, tivemos, ali, um crasso exemplo de que o importante no Brasil de hoje é lacrar, fechar, abafar, parecendo ser, e nada mais...

Em 1987 a grande musicista, já aposentada há tempos, Balduína de Oliveira Sayão concedeu uma densa entrevista ao importante radialista e produtor musical Lauro Gomes Pinto. Desse precioso momento, Bidú nos dá muito o que refletir sobre

Nos poucos momentos de pausa e de lazer, contrapondo-se ao meu exercício da prática médica diária, busco sempre a contemplação, e de im...

exame consciencia reflexao perdao
Nos poucos momentos de pausa e de lazer, contrapondo-se ao meu exercício da prática médica diária, busco sempre a contemplação, e de imediato surgem retalhos, lembranças que me levam a uma viagem retrospectiva no tempo pretérito, ativando sutilmente meu cérebro e meus neurônios. Buscando por conseguinte fatos de minha vida, concomitante as grandes mutações que vem sofrendo a humanidade nos tempos atuais.

“Assim, em toda cultura, entre o uso do que se poderia chamar os códigos ordenadores e as reflexões sobre a sua ordem, há a experiência...

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“Assim, em toda cultura, entre o uso do que se poderia chamar os códigos ordenadores e as reflexões sobre a sua ordem, há a experiência nua da ordem e de seus modos de ser.

... o que se quer trazer à luz é o campo epistemológico, a epistémê onde os conhecimentos, encarados fora de qualquer critério referente a seu valor racional ou as suas formas objetivas, enraízam sua positividade e manifestam assim uma história que não é a de sua perfeição crescente, mas, antes, a de sua condição de possiblidade...”

(Foucault, 1987. P.11)

Neste último 19 de agosto comemorou-se o dia do Historiador. Claro que não existe, entre os diversos saberes humanos, uma hierarquia valorativa que estabeleça graus de importância maiores ou menores, mas distintas características que determinam o seu lugar na ordem dos dias dos homens.

Gastão d'Orleans tinha 22 anos de idade quando, em setembro de 1864, chegou ao Brasil. Seu avô, o rei francês Luis Filipe, fora de...

isabel gastao d'orleans conde d'eu paraiba
Gastão d'Orleans tinha 22 anos de idade quando, em setembro de 1864, chegou ao Brasil. Seu avô, o rei francês Luis Filipe, fora deposto pela revolução que irrompera, em 1848, em Paris, e a sua família se exilara na Inglaterra, onde Gastão foi educado. Depois, ele foi para a Espanha cursar a academia militar de Segóvia e, em seguida, ingressou no exército espanhol onde conseguiu a patente de capitão, tendo se destacado em batalha no Marrocos. Gastão ostentava o título nobiliárquico de Conde d'Eu, que tinha sua origem na Comuna de Eu, na Normandia, onde os Orleans tinham um Castelo.

Travessia: aquele constante entrelugar. O mantra. Entre uma ponta e outra da vida, mas não somente. Entre mundos, entre vidas, entre in...

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Travessia: aquele constante entrelugar. O mantra. Entre uma ponta e outra da vida, mas não somente. Entre mundos, entre vidas, entre instantes, entre dias, entre noites. Deixar, ficar, voltar, permanecer.
Tudo travessia.

(De "Todo o tempo que existe")

No seu livro Todo o tempo que existe, Adriana Lisboa, Belo Horizonte: Relicário, 2022, ensaio de caráter autobiográfico, fala da sua experiência de luto quando da perda dos pais, em curto intervalo de tempo. Entre uma perda e outra, longos passeios pelo Jardim Botânico e devaneios sobre a existência.

Para desfrutar com mais intensidade o sabor das manhãs parisienses, costumava ir logo cedo à “boulangerie” mais próxima, no país onde ...

paris igreja ecumenismo jesus cristo
Para desfrutar com mais intensidade o sabor das manhãs parisienses, costumava ir logo cedo à “boulangerie” mais próxima, no país onde há os melhores croissants e baguetes do mundo. A cidade ainda parecia adormecida, quase ninguém na rua, já que era inverno, quando os dias se encurtam e o Sol se atrasa.

Há coisa de uns quatro anos li aqui em “A União”, no Caderno 2, a inspiradíssima (como soe acontecer) crônica da lavra do acadêmico H...

sonho inveja fantasia
Há coisa de uns quatro anos li aqui em “A União”, no Caderno 2, a inspiradíssima (como soe acontecer) crônica da lavra do acadêmico Hildeberto Barbosa Filho: “Outras vidas”. Se as tivesse, nosso ilustre cronista aventara para elas algumas possibilidades que a presente existência não lhe obsequiou. Quem nunca sonhou para si um cenário de sortilégios? Eu sonhei e não poucas vezes.

O Estado, a Associação, os Municípios Eram mortos. De todo aquele mundo Restava um mecanismo moribundo E uma teleologia sem princípios...

augusto anjos paraiba rua direita
O Estado, a Associação, os Municípios Eram mortos. De todo aquele mundo Restava um mecanismo moribundo E uma teleologia sem princípios.
“As Cismas do Destino”, versos 409-412

Pois é, sonhadores leitores, quando vi a informação de que a loteria americana mega millions iria pagar sete bilhões, setecentos e cin...

loteria sabedoria piada esperteza
Pois é, sonhadores leitores, quando vi a informação de que a loteria americana mega millions iria pagar sete bilhões, setecentos e cinquenta milhões de reais não me contive. Apostei como sempre aposto em todas as loterias brasileiras, porém mantendo o valor mínimo em cada aposta. Nunca me iludi com a possibilidade de ganhar. O que vale mesmo é sonhar o que farei com esses prêmios milionários. É o sonho mais barato do mundo. Mesmo porque não posso ter fé absoluta num sistema que não revela o nome dos ganhadores para conferirmos a veracidade dos resultados.

Friedrich Nietzsche, Arthur Schopenhauer, Andre Comte-Sponville e outros filósofos já discorreram amplamente sobre a relação conflit...

depressao infelicidade relacoes humanas saude mental
Friedrich Nietzsche, Arthur Schopenhauer, Andre Comte-Sponville e outros filósofos já discorreram amplamente sobre a relação conflituosa entre prazer e sofrimento. A nossa incessante busca pelo prazer se mistura ao combate à dor. Na contemporaneidade, o discurso do hedonismo, do “aproveite a vida”, do “deixa a vida me levar” tem promovido a urgência, acarretando patologias. Nessa seara, vivemos uma época de abundância extrema, de tal modo que a expressão não pode ser vista como redundante, mas importante para entendermos as circunstâncias que nos fazem adoecer. Do trabalho às redes sociais, das telas aos alimentos, até a droga e o sexo. Tudo isso como estímulo para nos sentirmos mais interligados à vida, porém afasta-nos mais dela. É um tempo de muita vulnerabilidade, em que, como diria Sartre, o universo das possibilidades nos angustia.