Segundo o criacionismo, o mundo foi criado por Deus. Isso, a meu ver, de modo algum O recomen...

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Segundo o criacionismo, o mundo foi criado por Deus. Isso, a meu ver, de modo algum O recomenda. É mais sensato imaginar que Deus queria fazer o mundo perfeito, à sua imagem, mas foi atrapalhado por um assistente inábil. Esse modo de ver se compatibiliza com os inúmeros desacertos que vemos nele. O maior desacerto é o próprio homem, esse bicho marcado pela dualidade do Bem e do Mal.

Há quem atribua nossas lacunas e arestas ao material de que fomos feitos – o barro. Por que Deus não usou um material mais resistente? Ou mesmo um desses produtos modernos, como o silicone? Algumas mulheres procuram hoje reparar o equívoco enchendo partes do corpo com esse nobre produto sintético. Mas é tarde. Por mais que plastifiquem a anatomia, a base continua lá, envelhecendo e se preparando para voltar à lama.

Deus usou o que tinha à mão, e só dispunha de seis dias. Era muito pouco para providenciar a Natureza com suas árvores, rios, vales, montanhas. Como seria possível, nesse prazo exíguo, trabalhar cada artefato com esmero? Um dos enigmas da Criação é saber por que Ele, sendo o patrão de si mesmo, trabalhou num prazo tão curto. Talvez não gostasse do que estava fazendo.

Como se não bastasse a exiguidade do prazo, Deus resolveu fazer o homem no último dia, ou seja, quando já estava exausto e tudo que queria era descansar (o trabalho foi tanto, e sob pressão, que Ele descansa até hoje). O efeito dessa pressa é que Adão foi um protótipo mal testado. Isso constituiu uma brecha para o descalabro que se seguiu: veio a Serpente, assessorada por Eva (ou vice-versa), e levou o primeiro homem a provar do fruto proibido. Adão pecou e logo descobriu, envergonhado, que estava nu – o que é estranho. Como ele poderia se perceber nu se nunca tinha usado roupa? O fato é que, devido a esse primeiro pecado, perdemos o Paraíso e nos tornamos mortais.

Geralmente se considera a morte a pior coisa que pode nos acontecer, mas há nisso um contrassenso. As pessoas aceitam de bom grado que o homem é um ser vivo – nasce, alimenta-se, cresce – mas acham um absurdo que ele vá morrer. Ou seja: querem da biologia apenas o que ela traz de bom. É como se depois de nascidos e já formados devesse ocorrer em nós um cancelamento das leis naturais e alguma forma de transcendência viesse nos animar; alguma coisa que daria a nossas células a eternidade. Infelizmente não é assim, de modo que o melhor é tratar de comprar o jazigo (pode ser em prestações). Tem gente que deixa para fazer isso literalmente “na última hora”, o que não é aconselhável. Comprando logo pode-se escolher o lugar e, com sorte, a vizinhança.

Teorias como a do Big Bang sugerem que a Criação está em curso. O universo continua a se povoar de luas, estrelas, galáxias, buracos negros. E agora, aparentemente, sem o controle divino. Deus pretendia que o Cosmo se resumisse à Terra, ao Sol e a alguns poucos corpos celestes, mas parece que perdeu o controle. Outros dizem que Ele continua descansando, mas um dia acorda e vai dar um sentido a tudo isso. Só nos resta esperar.

Estava a conversar pelo telefone com o amigo Wilson Marinho e ele me dá ciência de uma boa nova: seu neto foi promovido e vai trabalhar e...

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Estava a conversar pelo telefone com o amigo Wilson Marinho e ele me dá ciência de uma boa nova: seu neto foi promovido e vai trabalhar e viver em Belo Horizonte. Começamos então, com o sadio descompromisso das conversas fiadas, a comentar sobre as vantagens de BH sobre o Rio e São Paulo, metrópoles hoje difíceis de habitar, por tantas razões que sabemos. A capital mineira, ao contrário, soube crescer guardando um certo ar pacato de suas origens, o que lhe dá um encanto especial dentre as grandes cidades do país. Vai nisso, estou certo, muito da chamada mineirice dos habitantes das montanhas, sábios desde sempre e mestres na arte do bem viver, indiferentes às modas e novidades de outras plagas ditas cosmopolitas.

A revista “Entrelivros” publicou, em abril/2006, trechos de minha entrevista ao poeta Fabrício Carpinejar sobre Mário Quintana , cujo cent...

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A revista “Entrelivros” publicou, em abril/2006, trechos de minha entrevista ao poeta Fabrício Carpinejar sobre Mário Quintana, cujo centenário de nascimento foi comemorado naquele ano. Por razões de espaço, o texto da entrevista não foi publicado de forma integral, razão pela qual veiculo os trechos que foram omitidos.

Movimentos com as mãos, feitos pelos médiuns passistas, nos indivíduos com desequilíbrios psicossomáticos ou apenas desejosos de uma ação ...

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Movimentos com as mãos, feitos pelos médiuns passistas, nos indivíduos com desequilíbrios psicossomáticos ou apenas desejosos de uma ação fluídica benéfica, com a assistência, invocada e sabida, dos protetores espirituais.

Para o Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, a palavra passe apresenta vários significados, entre outros, é o “ato de passar as mãos repetidas vezes por diante ou por cima de pessoa que se pretende magnetizar ou curar pela força mediúnica.”

Nesse tempo de isolamento, abri mão da diarista que, duas vezes por semana, vinha deixar minha casa limpa e perfumada. Nunca fui madame. D...

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Nesse tempo de isolamento, abri mão da diarista que, duas vezes por semana, vinha deixar minha casa limpa e perfumada. Nunca fui madame. Dei muito duro na vida, na casa, no trabalho, com filhos e tudo o mais. Mas sempre deu pra ter uma trabalhadora em casa, com carteira assinada, e-social, férias, décimo terceiro e todos os direitos trabalhistas. O dinheiro do mundo todo era pouco, para que eu pudesse trabalhar, ter uma cabeça pensante, tempo, principalmente esse, para desfrutar outras coisas da vida. Claro que, desde pequena, tive obrigações: fazer a cama, arrumar o quarto... e sempre nunca gostei dessa parte. Para minha vergonha, nunca precisei lavar totalmente um banheiro. Limpar, limpei muito, mas lavar de água 'pra que te quero', vassoura em punho e os azulejos cheios d'água, não.

Pergunte-se à grande massa dos colegiais do Brasil qual o sujeito da frase “Ouviram do Ipiranga as margens plácidas de um povo heroico o b...

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Pergunte-se à grande massa dos colegiais do Brasil qual o sujeito da frase “Ouviram do Ipiranga as margens plácidas de um povo heroico o brado retumbante”.

Falo daqueles às vésperas do vestibular, recém-saídos de cursinhos ou colégios caríssimo. À turma da escola pública desaparelhada e, salvo raríssimas exceções, com professores mal pagos e desmotivados, nem adianta perguntar.

Maquiada a capricho, os cabelos vastos arrumados, soltos, em ondas bem acentuadas, livres. O olhar voltado para o verde aguardado. Um verd...

Maquiada a capricho, os cabelos vastos arrumados, soltos, em ondas bem acentuadas, livres. O olhar voltado para o verde aguardado. Um verde que poderia tomar outra tonalidade, dependendo da coloração do diálogo previsto, da confirmação do enlace previsto.

Hoje abri um livro e dele caiu a folha de bordo que eu trouxe de Montreal. Flutuou até o chão e o gato a destruiu em segundos. Tornou-se ...

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Hoje abri um livro e dele caiu a folha de bordo que eu trouxe de Montreal. Flutuou até o chão e o gato a destruiu em segundos. Tornou-se pó. Imediatamente lembrei de Elizabeth Bishop e seu poema sobre a arte de perder.

O campo juncado de cadáveres, o sangue fluindo em jorros, cidades bombardeadas e saqueadas, pessoas desalojadas, inocentes mortos, soldad...

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O campo juncado de cadáveres, o sangue fluindo em jorros, cidades bombardeadas e saqueadas, pessoas desalojadas, inocentes mortos, soldados famintos, exaustos e sem cartuchos, comandantes despreparados e um líder fraco, eis como se desenha o cenário da guerra franco-prussiana (1870-1871), num desastre total para a França, em que a besta vencia o homem (la bête emportait l’homme, Segunda Parte, Capítulo VII), assunto do romance La débâcle (A derrocada, 1892), de Émile Zola, cujo título não poderia ser outro. O final dramático visto em La bête humaine (A besta Humana), em que um trem desgovernado, pela morte de seus condutores, porta, no compartimento de carga, soldados para a guerra, como gado sendo levado para o matadouro, aqui encontra o seu destino (considere o leitor “dramático” e “destino”, ambos com o sentido grego):

Não me iludo Tudo permanecerá do jeito Que tem sido Transcorrendo, transformando Tempo e espaço navegando em todos os sentidos Te...

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Não me iludo
Tudo permanecerá do jeito
Que tem sido
Transcorrendo, transformando
Tempo e espaço navegando em todos os sentidos
Tempo Rei, Gilberto Gil, 1984

Os versos da canção de Gilberto Gil, "Tempo Rei", citada como epigrafe, remete ao enfoque do tema (neo)barroco, no contexto do Brasil e da contemporaneidade, com ênfase na interface dos afetos, tecnologia e cultura política. Sua pertinência reside em criar a oportunidade para uma reflexão sobre o Ser e o Tempo, pela via da percepção estética. Joga com as relações entre imanência e transcendência, leva o espectador a despertar para o devir dos seres e coisas, as "dobras da alma", um novo modo de "estar no mundo". Antenado na complexidade do cosmos e da vida social, o artista estimula o ouvinte a perceber os "plurais da psique". A estranha beleza dos versos, construídos à base de oximoros e contrastes, remete à percepção e lógica sensível que temos reconhecido como barroca.

Parece esquisito a expressão do título. Mas como?, perguntaria alguém mais ingênuo. Uma rua pode ser tombada? Bem, claro que não significa...

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Parece esquisito a expressão do título. Mas como?, perguntaria alguém mais ingênuo. Uma rua pode ser tombada? Bem, claro que não significa derrubá-la, no chão ela já está.

Mas... Será que se refere ao tombamento histórico ou arquitetônico? Os seus prédios, talvez? Bom, não é o caso da rua em questão.

Pois se trata da rua Francisco Claudino Pereira, no bairro de Manaíra, na minha João Pessoa. Portanto não é um logradouro histórico, como seria a rua Maciel Pinheiro, por exemplo, no centro antigo da cidade, no baixo comércio.

Até o final dos anos de 1960, na Paraíba vivia um caboclo que tinha a alma cheia de serenidade e sabia cantar o sentimento do povo de sua...

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Até o final dos anos de 1960, na Paraíba vivia um caboclo que tinha a alma cheia de serenidade e sabia cantar o sentimento do povo de sua terra. Ele nasceu em Itabaiana e conquistou o Brasil com seu jeito simples de narrar nosso viver e nosso sentir. Sua poesia, eloquente, espalhava emoção com raízes da terra.

Muitas vezes agimos sem pensar nas conseqüências. As escolhas feitas com precipitação, em geral produzem dissabores. Afinal de contas tudo...

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Muitas vezes agimos sem pensar nas conseqüências. As escolhas feitas com precipitação, em geral produzem dissabores. Afinal de contas tudo tem seu preço. O destino não prega peças, somos nós mesmos que as provocamos. Erros cometidos nem sempre dão para voltar atrás.

Na afamada sentença “Deus está morto” é possível identificar muito mais religiosidade do que niilismo. A afinidade de Nietzsche com a reli...

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Na afamada sentença “Deus está morto” é possível identificar muito mais religiosidade do que niilismo. A afinidade de Nietzsche com a religião, autor da frase que impactou a humanidade no prolífico ambiente pensante do fim do século XIX, se deu desde a infância. Sob influência familiar, logo cedo esboçou vontade de ser pastor, como o pai, o avô, o bisavô, e depois ingressou na universidade para estudar teologia.

Mas as religiões o decepcionaram e até hoje desencantam muitos pela maneira como se estruturaram, sobretudo ética e institucionalmente. O que se entende como natural, pressupondo-se as imperfeições de caráter do ser humano ainda em evolução

No silêncio decretado do domingo, o amanhecer teve o ritual do preparo do café, e uma louça a ser lavada, levou o olhar à janela para o mu...

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No silêncio decretado do domingo, o amanhecer teve o ritual do preparo do café, e uma louça a ser lavada, levou o olhar à janela para o mundo. Essa mesma, que descortina o por do sol à tardinha. . . todos dormem, portas fechadas, carros guardados. A solidão desse momento é agradável e particular. “Aqueles que têm um grande controle ou que estão totalmente absortos no trabalho, silenciam” (Mahatma Ghandhi).

O som de um automóvel, surgiu para quebrar a abstração. E, no terreno anexo, uma pessoa abriu o portão de acesso... um homem alto, magro, pele muito clara, entre 65 e 70 anos, vestido com bermuda, camiseta, boné e luvas cinza. Nos braços, uma pá, uma enxada e um balde. Apoiou seu material no chão, e iniciou um trabalho. Recolheu pedras, de uma por uma que foi encontrando. “ No meio do caminho, tinha uma pedra, tinha uma pedra, no meio do caminho” (Carlos Drummond de Andrade). Empilhou no canto do muro. Não havia pressa nesse ir e vir. Quando se curvava, era visível os cabelos brancos que escapavam da nuca desprotegida. Durante horas, pacientemente, executou sua tarefa.

No dia seguinte, pontualmente às seis horas, o mesmo ruído metálico... e a segunda surpresa prendeu a atenção. Capinou com afinco, como se o senhor daquela terra o obrigasse... não poupou a vegetação nativa: matos, jurubebas, urtigas, carrapateiras, melão de São Caetano e a indomável tiririca. Quando o sol esquentava, o suor colava a roupa ao corpo, procurava a única árvore existente, e à sua sombra descansava por poucos minutos. Retornava mais disposto.

O que levaria um homem dessa idade, que provavelmente exerceu outra função antes de se aposentar, a enfrentar semelhante desafio? Transformar um terreno baldio, abandonado, oferecido e rejeitado por compradores?

“Uma pessoa continua a trabalhar, porque o trabalho é uma forma de diversão. Mas temos que ter cuidado para não deixarmos a diversão tornar-se demasiado penosa” (Nietzsche).

À medida que arrancava os indesejáveis habitantes vegetais, separava em montes, distribuídos simetricamente.

A curiosidade do não conhecido, não decifrado, deixava a observação mais interessante. O que pretendia esse senhor? Uma futura construção? Exercitar a forma física com tal atividade muscular e aeróbica? Sua preocupação com os espaçamentos, com a ordem, não passaram desapercebidos. O obsessivo é um trabalhador modelo, pois seu Superego é excessivamente severo e rude, exigindo do Ego, uma organização, um excesso de consciência, uma perfeição...

Essa fase, foi a mais demorada, consumindo toda a semana. Na segunda feira seguinte, chegou com sacos de lixo grandes, onde colocou tudo que separara, então seco, e mais fácil de acondicionar. Levou cada volume para o carro, em várias viagens, até que nada mais restasse.

“Não posso imaginar que uma vida sem trabalho seja capaz de trazer qualquer espécie de conforto. A imaginação criadora e o trabalho, para mim, andam de mãos dadas, não retiro prazer de nenhuma outra coisa”. (Sigmund Freud).

O próximo tempo foi o preparo da terra, com um grande rolo de mangueira preta, distribuindo de forma retangular, por toda a extensão do terreno. Irrigação pronta, obra concluída e testada com sucesso, expediente encerrado. A observação curiosa chegou ao ápice, o que aconteceria na sequência dos fatos? “A curiosidade matou o gato, mas a satisfação trouxe-o de volta” (Eugene O ‘Neil).

Chegou cedo, e às seis horas, já estava em ação. Cavou depressões circulares, seguindo uma linha imaginária e proporcional. E... começou a plantar. . . bananeiras!!! Olhou uma por uma, até que se formassem pequenas lagoas... que surpresa, uma escolha incomum! Bananeiras cultivadas como flores no jardim. Jorge Ben Jor, fez sucesso com a música: “Olha a banana, olha o bananeiro”... mas o único som, vinha da água que jorrava...

O tempo não o apressava, o prazer ultrapassava a própria imagem, como se nada quisesse perder das atividades. Pequenas folhas, em formato de cone foram surgindo. . . e, ele parava e olhava como se filhas fossem. O homem em questão, de pontualidade kantiana, também se amoldava à sua Teoria de Apropriação: “um homem assume determinada conduta em relação a certo objeto, ele torna-se dono do mesmo, e adquire em relação aos demais seres humanos o direito de excluí-los do uso do objeto”.

Direito conquistado com muito esforço e dedicação. Em Matheus 21.6, a perfeita interpretação de todo o processo acompanhado da janela: “onde está teu tesouro, ali está o teu coração”. Afinal, o que resta ao homem que abandona o trabalho para se ocupar do ócio tedioso, além da tristeza e repetição? O sentido da completude, está em preencher o tempo com uma produção. “Sem trabalho eu não sou nada, não tenho dignidade, não junto meu valor, não tenho identidade” (Renato Russo). O estímulo para a pesquisa, o sentido de viver, a escolha do que cultivar, está em colher o prêmio do seu investimento: a frutificação.

“Não podemos mudar o mundo inteiro, mas podemos mudar uma vida de cada vez, e ela vai mudar outras. Para fazer o mundo florescer, só é preciso plantar. Plantar um deserto de cada vez “ (Dalva Agne Lynch).

A peste do milênio levou os cemitérios para as matas. O cemitério dos pobres, dos que não podem virar cinza antes do tempo. Pequeno, eu...

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A peste do milênio levou os cemitérios para as matas. O cemitério dos pobres, dos que não podem virar cinza antes do tempo.

Pequeno, eu via passar na estrada ao lado do nosso terreiro, acompanhado apenas pelos carregadores, os mortos que iam ser enterrados no cemitério da cidade. Parece que uma lei proibia de enterrar gente no mato, no lugar mais apropriado, como achava seu Herculano, um morador que era ouvido pelo dono da propriedade. “Com essas matas e capoeiras todas, por que não enterrar aqui mesmo? Bota-se uma cruz na cova e pronto”.

Enquanto a música, ecoando ao longe de uma caixinha de som, dava o ritmo suave e pássaros assanhavam em algazarra festiva os galhos das á...

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Enquanto a música, ecoando ao longe de uma caixinha de som, dava o ritmo suave e pássaros assanhavam em algazarra festiva os galhos das árvores na praça; em fim de tarde o mar cheio sacudia batidas de tambores como rajadas de fogos de artifício e a cidade se iluminava de escuro em pequenos pontos piscantes. No horizonte, fronteira dos sonhadores e limite dos terraplantados, a chuva cerrava fileiras para banhar a noite que chegava. "No dia em que fui mais feliz" no rádio do carro, mais um lembrete da efêmera vida, que é preciso construir felicidades.

Normalmente, ao se contar uma história em que existem reis, rainhas, castelos e bobos da corte, abre-se uma cortina de sonhos emocionantes...

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Normalmente, ao se contar uma história em que existem reis, rainhas, castelos e bobos da corte, abre-se uma cortina de sonhos emocionantes.

O livro “O que aprendi com Hamlet”, de Leandro Karnal (2018), que analisa a obra de William Shakespeare (1564–1616) é surpreendente. Com o apoio da leitura e assistindo ao filme Hamlet, com Lawrence Olivier, que estreou em 1940 e recebeu Oscar de melhor ator, torna-se ainda mais evidente a riqueza de detalhes a respeito de nós mesmos, da natureza humana.

Sons de minha alma Ao violoncelo te dedico, Toda a vida e todo o instante Pelo cello é que me expresso O que a palavra em si não f...

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Sons de minha alma
Ao violoncelo te dedico, Toda a vida e todo o instante Pelo cello é que me expresso O que a palavra em si não fala. És parte do meu dia, És o som que me alimenta, Mas trabalho que vicia... Só és tu que me completas E que à alma me sustentas!

Lá na parte de baixo do nosso mapa, o inverno é bem diferente do daqui de cima. É seco, umidade do ar muito baixa e as temperaturas fazem ...

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Lá na parte de baixo do nosso mapa, o inverno é bem diferente do daqui de cima. É seco, umidade do ar muito baixa e as temperaturas fazem espremer o filete de mercúrio abaixo dos 15 graus. Não raro chegam próximas de zero e até abaixo disso

Lá é tempo de seca, raramente chove. Em alguns pontos é fumaça empestando o ar nas cidades e no campo. Elas vêm das queimadas nos pastos e em capões arbustivos que não resistiram à falta d'água. Os reservatórios mínguam a espera das chuvas da primavera. Fora essas contrariedades, quando as fumaças dão uma trégua, as manhãs são azuis, a neblina teima um pouco em não subir como quisesse agasalhar nossas preguiças,
mas passado um tempinho elas se vão e o sol aparece tímido, generoso e acolhedor.

No sol dessas manhãs é que minha mãe gostava de ir para o quintal. Deixava à disposição duas cadeiras. Uma era para ela tomar acento, na outra, os novelos coloridos de lã e as agulhas. Passava horas ali, até que suas panelas reclamassem a presença daquela artesã junto ao fogão e à pia de louças. À tardinha retornava às agulhas e aos novelos.

Guardo com muita ternura a lembrança de Dona Nalva tricotando. Ela sabia muito dessa arte, era ligeira no manuseio daquelas duas pequenas lanças. Muitas vezes a vi comentando consigo mesma: vou usar “ponto arroz” nesse cachecol, nessas luvas “ponto barra”. E por aí ia, cada peça um ponto diferente. Nem me recordo quantos mais.

Para nós eram tempos difíceis, dinheiro curto que mal dava para o essencial. Algumas vezes eram insuficientes para as necessidades mais básicas, mas não tão parcos que não pudéssemos nos agasalhar nos frios que iam do fim de maio ao começo de setembro, porque então podíamos contar com as agulhas e os novelos de Dona Nalva.

Éramos quatro irmãos, uma escadinha. Algumas vezes, roupa que não cabia mais em um podia ser de boa serventia para o que vinha depois. Não com todas as peças, mas com as mais resistentes ao uso, ao desgaste e ao gênero. Ao gênero? Sim, calça que ficava curta para mim, o mais velho, só podia ficar para o terceiro da fila porque o segundo lugar era de minha irmã e isso quebrava a corrente. Mas essas heranças não valiam para os agasalhos porque aí minha mãe fazia questão de renovar nosso vestuário.

Era bonito vê-la tricotando. Aqueles fios de lã iam escorregando dos novelos para submeterem-se à parceria de dedos e agulhas que em rápidas manobras iam transformando aqueles cordões em meias, blusas, cachecóis, luvas, gorros, pulôveres. Podiam ser peças monocromáticas como as luvas ou com mais de uma cor, dependendo da inspiração de Dona Nalva e dos novelos disponíveis.

Como eram mágicas aquelas mãos. Lembro-me que algumas vezes nos chamava. Pedia a presença do futuro usuário.

— Vem aqui para eu ver como é que está ficando.

Com a peça ainda presa às agulhas, estendia a confecção sobre o “freguês” para ver se as medidas estavam corretas. Sentia orgulho em fazer isso. Essas experimentações podiam vir acompanhadas de um abraço, um beijo, um afago, nunca com indiferença. Dona Nalva sabia também aquecer nossos corações.

De quantos anos lá para trás fui desenrolar o novelo de minhas recordações? Sei lá. Uns sessenta, talvez. Acabei encontrando Dona Nalva, minha primeira heroína. E o que me fez embarcar nessa viagem no tempo? Muito simples, nesses dias, até por aqui a temperatura baixou um pouquinho além do costumeiro nesse tempo das águas. Senti um pouquinho de frio. Fui procurar uma blusa e acabei encontrando essas lembranças. Vi minha mãe com suas agulhas. Consegui até me lembrar de sua voz.

Tempos difíceis, aqueles. Veio a “revolução” de 64. Meu pai feito preso político em um navio ancorado na costa santista, o Raul Soares. Nem naqueles meses, Dona Nalva abandonou suas agulhas. Teve que “trabalhar fora”; então, só trocou o quintal nas manhãs de sol por algum canto da casa naquelas noites frias de temperaturas e de esperanças. Mas soube nos manter aquecidos.

Foi um tempo de resistência. Mas Dona Nalva cansou e numa dessas manhãs azuis de inverno, ela decidiu que viver não era tão importante assim.

Essas foram as reminiscências que me ocorreram nesses dias em que um friozinho de pouca monta andou rondando meus travesseiros. Fui eu quem acabou tricotando. Tricotando palavras e saudades.

Essencialmente, sou uma professora! E como fui feliz ao entender desde sempre que nasci pra isso! E como sou feliz com a oportunidade de t...

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Essencialmente, sou uma professora! E como fui feliz ao entender desde sempre que nasci pra isso! E como sou feliz com a oportunidade de ter contato com o fazer da educação!

Refiro-me à minha presença na equipe de professores e professoras voluntárias no cursinho Pré-ENEM da AJC.

A AJC — Articulação da Juventude Camponesa da Paraíba é composta por jovens de assentamentos, comunidades rurais, quilombolas e indígenas que estão cursando ou concluíram o seu curso universitário e querem ajudar outros jovens, com a mesma origem, a conseguirem dar continuidade à vida de estudante.

Quando os negócios vão bem; quando tivemos um dia até satisfatório de trabalho; quando nos preparamos para dormir confiantes no dever cump...

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Quando os negócios vão bem; quando tivemos um dia até satisfatório de trabalho; quando nos preparamos para dormir confiantes no dever cumprido; enfim, quando tudo parece nos predispor à felicidade – eis que aparece a “coisinha”. Ela vem sob a forma de um receio, uma leve preocupação, uma lembrança incômoda que envolve nossa relação com os outros.  

Conheci Walter Galvão aos poucos: primeiro de nome, depois por telefone e só por último pessoalmente. De nome, porque na aldeia seria imp...

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Conheci Walter Galvão aos poucos: primeiro de nome, depois por telefone e só por último pessoalmente. De nome, porque na aldeia seria impossível alguém que lesse jornal não conhecê-lo, ele que não só escrevia como editava, transitando entre os diários da capital com uma competência que era toda sua. Por telefone, quando iniciei minha colaboração quinzenal no Correio da Paraíba, de que ele era então editor. Pessoalmente, já não lembro exatamente quando e onde, tendo me chamado a atenção seu físico franzino, até mesmo frágil, que tinha tudo a ver com a doçura de sua voz gentil e tímida.

MANUAL COM QUESTÕES PARA UM AUTORRETRATO Por que vc tentou se suicidar? Sou artista, trabalho com fragmentos.   Por qu...

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MANUAL COM QUESTÕES PARA UM AUTORRETRATO

Por que vc tentou se suicidar? Sou artista, trabalho com fragmentos.
 
Por que vc se desculpa? Pelo vício de armar arapuca.   Por que vc exagera tanto? Não quero morrer com quebranto.   Por que vc chega tão cedo? Para ter um pouco de sossego.   Por que vc gosta de álcool? Pela chatice de ser sensato.   Por que vc recorre a Deus? Não se admire do que faz um ateu.