Venho de outra experiência existencial. Da utopia concreta que é resistência de uma vida inteiramente dedicada à causa da educação. Não à teoria nem aos postos burocráticos, onde o distanciamento costuma esmaecer o impacto da realidade. Venho da linha de frente desta batalha que, perdida, com ela também se perdem todas as perspectivas da sociedade.
1994. Lembro-me bem. Inflação nas alturas, dissolvendo os salários e o dinheirinho daqueles que não podiam ou não sabiam aplicar no “overnight”. A população refém da insegurança e da angústia decorrentes da incerteza sobre o dia seguinte. Medo de consumir, medo de poupar, medo de investir. Ainda na mente – e nos corações – das pessoas o aloprado confisco de Fernando Collor. Dias sombrios. Futuro nebuloso. Lembro-me bem. E quantos mais ainda o fazem?
No dia 09.03.05, a TV Globo, no seu programa “Bom-dia, Brasil”, fez uma reportagem sobre o uso do gerúndio, em frases como “Vou estar trabalhando”. O entrevistado concluiu, inadequadamente, que se trata de um decalque da sintaxe inglesa. Ele não usou o termo “decalque”, mas deu a entender que se tratava de um.
Para os da minha geração, a tendência mesmo é nos deixarem sem nada. Ainda me banho de poder usar o pronome num plural acanhado graças à sobrevivência de uns pouco iguais na idade ou de contemporâneos aproximados, uns reclamando menos, outros mais, todos, porém, sem graça, no prejuízo dos seus mais enraizados costumes, devoções e lazeres.
Dinâmico Presidente da secção paraibana da União Brasileira dos Escritores (UBE), o carioca Luiz Augusto Paiva da Mata reside na capital da Paraíba há alguns anos. É festejado professor de Matemática. Além disso, dedica-se à literatura, desfrutando de elevado conceito nos meios culturais do País, por força dos textos que produz.
O Castelo de Alamut, ou ninho da águia, é uma fortaleza situada no topo da colina de Sabbah, na cordilheira de Elbruz, a noroeste da província de Qazvin, perto da vila de Gazer Khan, a sul do mar Cáspio, no Irão e, na prática, a sensivelmente 100 km da capital, Teerão.
Amores aéreos
Quando eu era missivista,
eu me via assim
com a alma presa na caneta Bic,
(ou na ponta fina
do lápis Crayon),
esculpindo,
cuidadosamente,
um pouco
das paixões que me escorriam
pelo peito.
Viajava a bordo
de beijos e longuidão.
Theodor Ludwig Wiesengrund-Adorno (1903-1969) foi um filósofo, musicólogo, compositor e sociólogo alemão. Em sua obra Dialética Negativa (1966), influenciada pela Teoria Crítica da Escola de Frankfurt, ele versa a libertação da alienação da consciência por meio da dialética como uma maneira de confrontar as forças opressivas da sociedade e do Estado. Para Adorno, encarar esse mal-estar significa despertar para a realidade da própria
existência e reconhecer que tal realidade surge de um contexto prévio que a influenciou, havendo um processo histórico implícito à formulação de políticas e a todas as atividades humanas. Escapar desse ciclo cruel é liberar-se da própria alienação, o que requer a negação das premissas estabelecidas para questionar a própria identidade, caracterizando assim a essência da ‘dialética negativa’ contra à necropolítica, que representa a politização da morte. A dialética adorniana revela modos de pensamento que vão além do que está visível na realidade. O seu senso crítico gera a autonomia do sujeito.
“Como são perfeitas as pessoas que não conhecemos!” Esta frase de Millôr Fernandes é, em todos os sentidos, irretocável, a começar pela ironia que a reveste. Não consigo conceber como pessoas adultas se entregam à exaltação desmedida e à idolatria de políticos, artistas, jogadores de futebol, dos ditos influenciadores et caterva.
A frase parece contrariar o juízo crítico que afirma devermos nos distanciar do objeto para vê-lo melhor e, assim, procedermos a uma análise, o mais possível, isenta. Mas só parece, porque, na realidade,
a aproximação e a vivência diária com alguém é o que vai nos dar uma visão mais verossímil de quem ela é. Acredito que é nesse ponto que entra a alegoria platônica do Anel de Giges, que se encontra na República (359b-360d), expressando um problema mais moral do que filosófico: se você tivesse o dom de ficar invisível, o que você faria? Estando invisível, suas ações seriam condizentes com o que você prega, estando à vista de todos? Com relação ao elenco das pessoas idolatradas, no início deste texto, a convivência diuturna é absolutamente desnecessária, tal é o distanciamento entre palavra e ação.
A conversa girava em torno de erros médicos. Comentávamos sobre uma cirurgia que havia sido feita na perna direita de uma moça com problemas na perna esquerda. Ao redor da mesa cada um queria contar um caso parecido, porém, o dono da padaria tinha preferência. “- Rapaz, eu caí da bicicleta e um táxi me levou ao hospital. Vocês acreditam que ao invés de engessarem meu braço direito engessaram o braço do taxista?”.
Nunca me canso de cultivar reflexões acerca das maravilhas desse mundo, tão pequenino diante da infinitude cósmica, quanto imenso perante o universo microscópico, ainda mais espantoso. Imagino que se aqui na Terra nos foi permitida inteligência humana capaz de criar uma música como a Nona Sinfonia de Beethoven ou o Adagio da Gran Partita de Mozart, o que se pode esperar do além mundo? Maravilhas ainda mais extraordinárias, evidentemente.
O Homem nos Ratos
Nós somos os homens de ratos,
Nós somos os homens nos ratos.
Nosso corpo não é nosso corpo,
Mas sim um acaso de roedores
que se reúnem em forma humana por pouco.
Nosso corpo não é nosso corpo
e nossos olhos não podem ver o terror
nos que trazem pedaços de nossa figura
Eu soube de Luís, um velho amigo. Velho mesmo, posto que eu o conheci por volta dos meus doze anos de idade. Na ocasião, ele tinha uns 18 e havia saído da zona rural com um dedo a menos: o indicador da mão direita então decepado por uma daquelas máquinas desfibradoras de sisal. Desembarcado do trem da Rede Ferroviária do Nordeste S/A, a Refesa da saborosa pronúncia do interior, entrei em casa e tomei a bênção materna. “Vá falar com seu pai antes de desfazer a mala. Ele está na Padaria”, recomendou dona Vininha.
Poderia estar falando do preço de beijos que marcaram a história. Beijos de amor eterno. Beijos fraternos. Beijos traidores. Beijos políticos. Beijos comerciais. Beijos que nada mais representam do que um instante de prazer. Não é a esses e tantos beijos sobre os quais há tanto a dizer que me refiro.
Aquele mesmo pesadelo veio na noite de ontem. Aquele que não tem coragem de enfrentar. Mas, está sempre lá. E ele sabe como o pior pesadelo não é aquele que foi sonhado, mas aquele que foi lembrado. Sempre lembrado, à revelia de sua vontade. Uma corrupção de sua integridade mais íntima. E aquele era algo muito, muito doloroso. Como se, para ele, não tivesse passado o tempo. Todo o resto da vida seguiu em frente, mas aquele episódio, aquele episódio, não. Está como que congelado, em toda a sua crueldade. Então, levanta com dificuldade. Quem o visse, naquele momento, veria uma tristeza infinita no olhar, como uma supressão da vontade de seguir adiante.
Assistindo ao jornal da Band sobre a comemoração de 30 anos do Plano Real, pude verificar como a imprensa pode distorcer os fatos com tanta facilidade. De acordo com a reportagem, a figura mais importante na criação do Real, foi o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o que não é verdade.