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" São as coisas pequenas de que têm sido feitos meus livros " (Go...

literatuta paraibana gonzaga rodrigues
"São as coisas pequenas de que têm sido feitos meus livros"
(Gonzaga Rodrigues)

Clamoroso equívoco, diria Eduardo Portela, quem considera a crônica um gênero menor, um desdobramento marginal ou periférico do fazer literário, quando ela é, sem tirar nem pôr, o próprio fazer literário.

Não faz muito tempo, escrevi que imaginava o cronista à semelhança de um camelô vociferando a céu aberto, vendendo o seu produto: o cotidiano, que é a matéria do dia a dia que nutre a crônica, quer o camelô grite a plenos pulmões, quer se feche em copas, introspectivo, conversando com os seus botões, consigo mesmo, embora procure fazer com o que ele diz repercuta entre os que se aglomeram inamovíveis ao seu derredor.

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Kitap Yayinlanirken
Se o título do livro de Gonzaga Rodrigues é “Com os olhos no chão”*, Antonio Candido utiliza um termo mais ou menos semelhante para observar “(...) que a celebração da vida ao rés-do-chão pela crônica é enfocada na tradição da prosa modernista, como conversa aparentemente fiada”.

Aqui, valho-me de um texto do poeta Mario Quintana: “Subnutrido de beleza, meu cachorro-poema vai farejando poesia em tudo, pois nunca se sabe quanto tesouro andará desperdiçado por aí... Quanto filhotinho de estrela atirado no lixo”.

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Desiderius Erasmus
De olhos no chão, o cachorro-crônica de Gonzaga Rodrigues também fareja poesia em tudo, pois sabe cascavilhar e localizar nas coisinhas miúdas, no aparente monturo, nos sobejos de Deus, os filhotinhos de estrela que constelam e iluminam a sua linguagem solar. É um “demiurgo de inutilidades”.

Alguns se admiram da memória de Gonzaga quando ele reconstitui os episódios da infância, da juventude, como se os estivesse vivendo no calor da hora. A mim me alumbra não só a memória, mas, sobretudo, a maneira como ele a concatena de forma inteiriça, com a linguagem firme, ereta espinha dorsal que não se verga, não se dobra, diante dos seus novent’anos recém-inaugurados.

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Manet
Em “Com os olhos no chão”, a par dos pequenos causos que só adquirem significado, importância, grandeza, porque Rodrigues os enlaça com os cordéis dos “demiurgos de inutilidades”, outros escritos tratam da alma das ruas e dos homens, anônimos ou não, que compõem a história da Paraíba. Ou seja, abordam assuntos e temas mais abrangentes, pois em Gonzaga Rodrigues, convivem em harmonia e sem riscos de abalroamentos, o cronista, o articulista, o historiador, o poeta etc.

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* Gonzaga aproveitou o excelente prefácio de Antônio Barreto Neto do livro “Notas do meu lugar” (1978), de sua autoria, como texto de abertura de “Com os olhos no chão”, cuja concepção gráfica é do competente designer e saudoso poeta Juca Pontes. O filho de Gonzaga, Paulinho Rodrigues, colaborou na seleção dos textos. A capa do livro é do excelente Flávio Tavares.

Nutri, durante algum tempo, uma espécie de r...

josafa oros xilogravura poesia paraibana
Nutri, durante algum tempo, uma espécie de ranço preconceituoso com relação àqueles que acumulavam as funções de poeta, de artista plástico, de dramaturgo etc. Quem assim procedia, parecia-me querer açambarcar o mundo com as pernas. E que, não podendo fazê-lo, mostrava-se negligente, incapaz de dar conta do recado.

Fosse "RESSURREIÇÃO - 101 sonetos de amor", de Carlos Newton Júnior, lançado numa época inflacionada pelas experimentações van...

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Fosse "RESSURREIÇÃO - 101 sonetos de amor", de Carlos Newton Júnior, lançado numa época inflacionada pelas experimentações vanguardistas, certamente seria execrado pelos que se propunham à invenção a todo custo, Por quê? Simplesmente por se tratar de um livro que celebra o soneto, gênero poético posto em disponibilidade pelos modernistas, revitalizado pela Geração de 45 e, posteriormente, desprezado pelo concretismo e seus desdobramentos.

Em um texto que escrevi sobre o livro anterior de Sérgio Rolim Mendonça , "O caçador de lagostas", aludi ao fato de o memor...

nicolas rolin sergio rolim mendonca literatura paraibana
Em um texto que escrevi sobre o livro anterior de Sérgio Rolim Mendonça, "O caçador de lagostas", aludi ao fato de o memorialista já nascer vocacionado para exercer esse mister desde quando, criança ainda, deita um olhar nostálgico sobre os seres e as coisas que giram ao seu derredor. Com efeito, o memorialista age motivado pela firme convicção de que tudo o que "é sólido desmancha no ar". E disse ainda que "o título desse livro, longe de ser uma excrescência, ratifica e põe em prática um verso antológico de Cecília Meireles: 'A vida só é possível reinventada.

Alguns críticos jamais perdoaram a suprema heresia de Mario Quintana estrear com um livro de sonetos - ...

mario quintana critica poesia
Alguns críticos jamais perdoaram a suprema heresia de Mario Quintana estrear com um livro de sonetos - "A Rua dos cataventos" (1940) - quando, na época, o próprio Modernismo já começava a ser questionado pelos que iriam mais tarde engrossar as fileiras da Geração de 45. Geração da qual só cronologicamente podem aproximá-lo, pois, embora tenha desde sempre cultivado o soneto, o fez descontraidamente, sem pompas e sem circunspecção, "filiando-se" muito mais ao humor e à ironia de 22 do que à sisudez dessa geração do pós-guerra. Em suma, cotejando-se os seus sonetos com os da Geração de 45, Quintana poderia ser considerado o sonetista que o Modernismo não teve, conquanto tenha sido um gazeador contumaz de todas as escolas...poéticas, inclusive da escola modernista, da qual evitou os excessos em troca de uma dicção lírica em muito tributária do Classicismo.

Se me perguntassem qual o escritor mais metódico da literatura brasileira, eu responderia sem pestanejar: Mário de Andrade. E isso não ...

literatura brasileira macunaima semana arte moderna
Se me perguntassem qual o escritor mais metódico da literatura brasileira, eu responderia sem pestanejar: Mário de Andrade. E isso não só por conta de sua produção abranger quase todos os gêneros literários, mas, sobretudo, por sua correspondência ativa, por sua compulsão em responder, indistintamente, quer ao poeta federal, quer ao estadual, quer ao municipal, inclusive àquele perdido e extraviado nas bibocas, nos grotões, nas brenhas desse Brasil de oito milhões de quilômetros quadrados. Não há dúvida: Mário de Andrade foi o escritor mais metódico da literatura brasileira de todos os tempos.

Que palavras agrupar para escrever sobre Otávio Sitônio Pinto, logo ele um e...

Que palavras agrupar para escrever sobre Otávio Sitônio Pinto, logo ele um exímio encantador de palavras? Inibe-me utilizar as minhas para falar sobre as dele, ora serpentes venenosas, ora favos do mais puro mel. Umas e outras, porém, desprovidas de qualquer excesso, tanto que o veneno liberado por aquelas não é letal; e tampouco dulcíssima a colmeia de onde ele extrai essas últimas. Em Otávio, palavras e sentimentos são sopesados e medidos, principalmente quando buscam reconstituir tudo o que, aparentemente sólido e impregnado de eternidade, o tempo desmanchou no ar.

Nelson Barros tem as suas influências, embora as dilua e evite convertê-las numa espécie de mão única de sua obra poética. Diria até...

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Nelson Barros tem as suas influências, embora as dilua e evite convertê-las numa espécie de mão única de sua obra poética. Diria até que quem dita os seus poemas, quem os escreve de forma livre, solta, é a própria vida, o acúmulo de suas experiências, através do poder transfigurador da linguagem.

escrever/não escrever escrever é um suicídio branco. um consumir-se no fogo brando das palavras. não escrever, um sui...


escrever/não escrever
escrever é um suicídio branco. um consumir-se no fogo brando das palavras. não escrever, um suicídio em branco. um consumar-se sem metáforas.
relações humanas
naquela época ainda não existia garrafa térmica tanto que acordava a preta velha noite adentro para fazer-lhe café café café café e então a preta velha passou a ser uma garrafa térmica

a permanência do fotógrafo (Poema dedicado à memória do poeta Eurico Vieira Carneiro a partir de uma foto minha clicada...

poesia paraibana sergio castro pinto

a permanência do fotógrafo
(Poema dedicado à memória do poeta Eurico Vieira Carneiro a partir de uma foto minha clicada por ele) por mais que jaza sob sete palmos, o insepulto olho do fotógrafo morto ainda me espia: abre-se (zoom!) em forma de fotografia.
o preto cosme, pintor de paredes
o preto cosme caiava como quem dispara tiros a esmo ou como um bêbado que erra o prumo e salpica-se de cal estrela-se de cal enluara-se de cal caiando-se a si mesmo qual fosse um muro branco de susto emparedando um preto

      procissão de jangadas no dia de são pedro o sol acende as velas que iluminam a enseada. em fila, qual brancas formiga...

poesia paraibana sergio castro pinto jangadas procissao dia sao pedro
 
 
 
procissão de jangadas no dia de são pedro
o sol acende as velas que iluminam a enseada. em fila, qual brancas formigas marítimas, lá se vão as jangadas contritas e beatas. (em 29/06/22, dia de São Pedro)

Quando editei o “Correio das Artes” pela primeira vez, Antonio Carlos Secchin foi um dos poetas entrevistados pelo jornalista Jorge de Aqu...

Quando editei o “Correio das Artes” pela primeira vez, Antonio Carlos Secchin foi um dos poetas entrevistados pelo jornalista Jorge de Aquino Filho para a série “Rumos da Poesia Brasileira Hoje”. À época, ele havia lançado o livro Elementos (Editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1983), de poesia, ao qual acrescentaria, entre outros, Poema para 2002, Diga-se de passagem e Todos os ventos. Já como ensaísta, publicou João Cabral: a poesia do menos, Poesia e desordem, Escritos sobre poesia & alguma ficção, Memórias de um leitor de poesia, João Cabral: uma faca só lâmina e Papéis de poesia.

Fiz Direito, mas não fiz muito direito. Minha praia sempre foi a literatura, tanto que a lecionei na Universidade Federal da Paraíba, on...

Fiz Direito, mas não fiz muito direito. Minha praia sempre foi a literatura, tanto que a lecionei na Universidade Federal da Paraíba, onde defendi dissertação de mestrado sobre Manuel Bandeira e tese de doutoramento a respeito de Mario Quintana, poetas que possuem muito em comum, pois na obra de ambos “as pequenas grandezas do universo”, as coisas simples, os sobejos de Deus, possuem um lugar cativo, um lugar de destaque. Isso sem contar que investem na linguagem coloquial, prosaica, além de mesclarem a tradição com a renovação, embora esta última, por não serem pirotécnicos, a exemplo de Oswald de Andrade, tenha tudo para passar despercebido pelo leitor e até mesmo pelo crítico menos atento.

É próprio do homem decretar a morte de tudo e de todos. Foi assim com a pintura, com o livro, com a História e, inclusive, com Deus. Tenh...

É próprio do homem decretar a morte de tudo e de todos. Foi assim com a pintura, com o livro, com a História e, inclusive, com Deus. Tenho para mim que o homem, quando assim se expressa, apenas põe a nu o seu sentimento de finitude diante do que é duradouro e perene. E se esquece de que ‘A vida é breve e a arte é longa’. A poesia é perene, a maioria dos poetas é que passa. Sobretudo os que se deixam subordinar por breviários estéticos ou conteúdos programáticos dessa ou daquela corrente literária.

Dr. Arnaldo Tavares sempre me lembrou uma peça do dramaturgo e ficcionista Luigi Pirandello: “Seis personagens em busca de um autor”. Só q...

Dr. Arnaldo Tavares sempre me lembrou uma peça do dramaturgo e ficcionista Luigi Pirandello: “Seis personagens em busca de um autor”. Só que Dr. Arnaldo não era apenas seis personagens, mas mil e uma personagens, desde o médico, o poeta, o artista plástico, o cientista, o humanista, passando pelo boêmio, pelo causeur, pelo enxadrista, até outras tantas que ele desejasse ser, com a diferença de que não vivia em busca de um autor, pois, como no poema de José Régio, o poeta português, parecia dizer: “Não, não vou por aí, só vou por onde me levam os meus próprios passos”.

      o lápis o lápis é um caniço pensante na maré vazante da linguagem

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o lápis
o lápis é um caniço pensante na maré vazante da linguagem

O primeiro mérito a registrar em “Mosaicos”, livro de ensaios de Marcelo Mourão, é a faculdade que possui o autor d...

O primeiro mérito a registrar em “Mosaicos”, livro de ensaios de Marcelo Mourão, é a faculdade que possui o autor de abordar temas algumas vezes complexos, intrincados, através de uma linguagem simples sem ser simplória, plenamente palatável, inclusive, para os que se iniciam nas lides literárias. Ou seja, Marcelo Mourão não é daqueles que turvam as águas para parecer profundo, procedimento mais ou menos usual, comum, entre os que escrevem dissertações de mestrado e teses de doutoramento. Resumindo, Marcelo Mourão escreve didaticamente, mas sem pretensões professorais.

De nascimento prematuro, só tardiamente estreou em livro. Tal paradoxo seria suficiente para ilustrar a cronologia da vida e da obra de M...

De nascimento prematuro, só tardiamente estreou em livro. Tal paradoxo seria suficiente para ilustrar a cronologia da vida e da obra de Mário Quintana, fronteiriço de Alegrete, Rio Grande do Sul, onde nasceu no dia 30 de julho de 1906.

Na verdade, a cronologia desse poeta gaúcho se perfaz sob a égide da solidão de ter nascido antes da maioria dos seres gerados à época em que ele o foi; de lançar-se a público aos 34 anos com um solitário livro de ressonâncias simbolistas quando se vivia a quase unanimidade do modernismo e, finalmente, pela condição de fronteiriço não por ser natural de Alegrete, mas por extrapolar

Embora muitos considerem o concretismo uma retomada do espírito vanguardista de 22, o fato é qu...

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Embora muitos considerem o concretismo uma retomada do espírito vanguardista de 22, o fato é que esse movimento articulou uma linguagem tão desprovida de humor quanto a de 45, consistindo, pelo menos nesse aspecto, numa vertente desta última. Daí ter-se distanciado do modernismo, o que não ocorreu com Mario Quintana, cuja verve irônica e humorística aproxima-o do Manuel Bandeira de Libertinagem, apenas com uma diferença: no poeta pernambucano, a incorporação do humor é decorrência de uma estratégia intelectual que visa a neutralizar o “gosto cabotino da tristeza” do eu lírico para reajustá-lo ao “mundo dos sãos”. Já no poeta gaúcho, o humor é um componente orgânico, visceral, mas nem por isso menos eficaz no sentido de evitar os excessos de um temperamento regido muito mais pelo sentimento do que pela razão, conforme ele mesmo o diz em Acontece que, do livro Caderno H:

    casa dos 70 (ao amigo e compadre Luciano morais e outros companheiros que se foram na casa dos 70 anos de idade). a casa dos...

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casa dos 70
(ao amigo e compadre Luciano morais e outros companheiros que se foram na casa dos 70 anos de idade).
a casa dos 70 é uma casa mortuária esquife mortalha jazigo casa de repouso dos muitos amigos que cruzaram os seus umbrais para nunca mais nunca mais nunca mais