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O mais recente livro de poemas de Alexei Bueno, Naquele remoto agora (Rio, Anadiômene, 2024), circunscreve-se na busca da apreensã...

rio paris antigamente
O mais recente livro de poemas de Alexei Bueno, Naquele remoto agora (Rio, Anadiômene, 2024), circunscreve-se na busca da apreensão dos instantes. Diversos os instantes, diversas as formas de dizê-los e as fôrmas para apreendê-los.

Nova carta a Germano Romero Germano, meu amigo, O substantivo naufrágio , vem de naufragĭum, numa síncope de * navifragĭum , te...

mitologia lingua portuguesa etimologia naufragio
Nova carta a Germano Romero

Germano, meu amigo,

O substantivo naufrágio, vem de naufragĭum, numa síncope de *navifragĭum, termo hipotético que deriva de navifrăgus, adjetivo que significa “que quebra o navio, que provoca o naufrágio”.

A lei maior do Universo é o movimento. Para Platão, a imortalidade da alma se dá por ela estar sempre em movimento. Com a Literatura n...

A lei maior do Universo é o movimento. Para Platão, a imortalidade da alma se dá por ela estar sempre em movimento. Com a Literatura não poderia ser diferente. O movimento é que permite a literatura alimentar-se de literatura e espalhar-se, incessante e ilimitadamente, em vasos comunicantes. É o que teoricamente se chama de intertextualidade ou de

Subia a Sousa Pinto, na calçada oposta ao aqueduto de São Sebastião, em Coimbra, indo em direção à Praça D. Dinis, quando deparei-me co...

fliparaíba camoes
Subia a Sousa Pinto, na calçada oposta ao aqueduto de São Sebastião, em Coimbra, indo em direção à Praça D. Dinis, quando deparei-me com a fachada da Real República Rápo-Táxo (Rapa o taxo), cujo dístico atraiu a minha atenção:

A pergunta retórica se restringe a si mesma. Quem a formula já tem consigo a resposta à pergunta formulada. Se é a resposta cert...

homem montanhas augusto anjos
A pergunta retórica se restringe a si mesma. Quem a formula já tem consigo a resposta à pergunta formulada. Se é a resposta certa ou errada, aos ouvidos do público a quem ela foi dirigida é outra questão a ser discutida, que não cabe nos limites da pergunta retórica, por ser ela simplesmente um recurso fático em via única. Ela inquire com a intenção de desafiar, de provocar, de aguçar a curiosidade, quem sabe até de procurar despertar o auditório do torpor.

A Mirabeau e Suely Dias Encontrava-me em Braga , em pleno Sábado de Aleluia, quando, diante da Igreja de Santa Cruz, deparei-me com...

dante divina comedia
A Mirabeau e Suely Dias

Encontrava-me em Braga, em pleno Sábado de Aleluia, quando, diante da Igreja de Santa Cruz, deparei-me com o dístico latino, insculpido em seu frontispício:

Carta ao meu querido amigo e confrade, José Nunes. Uma das imagens, Nunes, que tenho guardadas na memória, do período da minha i...

professor magisterio aula
Carta ao meu querido amigo e confrade, José Nunes.

Uma das imagens, Nunes, que tenho guardadas na memória, do período da minha infância, é com um quadro negro, quadrado, medindo 1x1, na cabeça, e uma caixa de giz com apagador, em uma das mãos, indo dar aula particular de francês, perto da casa onde eu morava.

Há pessoas que começam a ter uma crise de urticária, à simples menção da palavra disciplina . Assim como espelunca não é espelunca e...

mitologia eneida etimologia
Há pessoas que começam a ter uma crise de urticária, à simples menção da palavra disciplina. Assim como espelunca não é espelunca e anjo não é anjo, disciplina não é disciplina. Explico-me. A palavra espelunca é a forma latina (spēlunca) para caverna, proveniente do grego spelunks (σπῆλυγξ), cuja raiz (σπήλ-, de σπήλαιον) se encontra no termo erudito espeleologia, a ciência que estuda as cavernas.

Em conversa com alguns amigos, perguntei-lhes qual o contrário de diabo. A resposta veio pronta: Deus . Não é isto mesmo, caríssimo L...

simbolos simbologia significados
Em conversa com alguns amigos, perguntei-lhes qual o contrário de diabo. A resposta veio pronta: Deus. Não é isto mesmo, caríssimo Leitor? Parece ser, mas não é. O leitor talvez se espante, como aconteceu com os meus amigos, ao saber que o contrário de diabo é símbolo. Por mais estranho que pareça, posso afirmar que, considerando a origem das palavras, o mais acertado seria ter em mente o par opositor diabo/símbolo. Para que a questão possa ter um esclarecimento satisfatório, vamos, então, buscar ajuda na etimologia.

A língua francesa define tour de force como uma ação que exige uma força além da necessária, seja no sentido físico, seja no sentid...

A língua francesa define tour de force como uma ação que exige uma força além da necessária, seja no sentido físico, seja no sentido moral. Linguisticamente falando, fazer um tour de force é, portanto, se jogar num exercício de contorcionismo linguístico, para explicar alguma coisa ou expor um argumento difícil de se sustentar. É o que temos visto, com frequência, na política que se pratica, especialmente, no Brasil.

Meu caro confrade Thélio Farias, Sempre é muito bom ver que Augusto dos Anjos é frequentador assíduo do circuito crítico-literár...

augusto anjos poesia paraibana
Meu caro confrade Thélio Farias,

Sempre é muito bom ver que Augusto dos Anjos é frequentador assíduo do circuito crítico-literário, o que nos mostra, de modo incontestável, a importância da sua poesia. Agradeço ao amigo, a postagem do artigo “A Ideia, de Augusto dos Anjos”, de Wilberth Salgueiro, no jornal Rascunho, o que me deu a oportunidade de fazer mais uma reflexão sobre a obra do nosso poeta. Gostaria,

A ideia deste texto me veio dormindo. Surgiu, portanto, de um sonho. Não se trata de ficção ou de artifícios para pegar o leitor, c...

guerra troia iliada homero
A ideia deste texto me veio dormindo. Surgiu, portanto, de um sonho. Não se trata de ficção ou de artifícios para pegar o leitor, como os manuscritos misteriosos, que chegam às mãos de determinados autores e estes só têm o trabalho de transcrevê-los ou editá-los. No sonho, encontrava-me ao redor de uma mesa, com alguns colegas, e o debate encaminhou-se para a Ilíada.

O eu-lírico, na poesia de Augusto dos Anjos, não é pessimista in totum , embora possamos detectar um certo grau de pessimismo, ...

evolucao galaxia augusto anjos
O eu-lírico, na poesia de Augusto dos Anjos, não é pessimista in totum, embora possamos detectar um certo grau de pessimismo, por exemplo, no soneto “Psicologia de um Vencido”. Há, no entanto, uma causa plausível para isso, determinada pela situação de que o eu-lírico toma consciência.

Meu caro amigo e confrade José Mário. Inicio agradecendo a sua participação, mesmo estando distante, no meu curso, Uma Introd...

camoes lusiadas restelo

Meu caro amigo e confrade José Mário.

Inicio agradecendo a sua participação, mesmo estando distante, no meu curso, Uma Introdução a Os Lusíadas, programado para dois sábados (21 e 28/09), num total de seis horas-aula, aberto a qualquer público interessado e ministrado no âmbito de nossa Academia Paraibana de Letras, patrocinadora do evento, em comemoração ao quinto centenário de nascimento de Luís Vaz de Camões.

Meu caríssimo amigo José Nêumanne Pinto , Ao longo da minha vida profissional de professor de Língua e de Literatura, uma boa parte...

poesia jose neumanne pinto antes atravessar livro
Meu caríssimo amigo José Nêumanne Pinto,

Ao longo da minha vida profissional de professor de Língua e de Literatura, uma boa parte do tempo levei a seguir os preceitos formais da análise e da crítica literária. Adianto que, mesmo não sendo crítico literário, para o exercício da minha função de professor, preciso saber manejar a sua técnica, com a finalidade de, tendo analisado um texto, eu possa ter uma visão fundamentada sobre ele. Dizendo de outro modo, a análise literária, que proporciona uma reflexão crítica, é, no meu caso, um meio, para atingir a finalidade maior de ser uma espécie de mediador entre o livro e os leitores, sobretudo com relação àqueles que se projetam professores na área da linguagem.

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Leonid Pasternak
De uns tempos para cá, passei, gradativamente, a abrandar certa rigidez da técnica de leitura em grau mais verticalizado, para buscar outra maneira de ler, sempre procurando ser criterioso, tendo em vista que o texto literário requer um olhar que penetre o reino surdo das palavras, como diria o poeta de Itabira. Procurei dar vazão a uma sensibilidade e emotividade que, às vezes, a formalidade tende a passar por cima. É assim que vejo meus textos, hoje. Não me furto a deixar aflorar o sensível que me belisca e me encanta no que leio, sentindo-me mais perto do leitor, a quem meu texto se dirige, do que dos padrões formais que funcionam, muitas vezes, ao contrário do intentado, afastando-o da leitura do texto de base.

Com essa nova concepção em mente, meu amigo, enfrentei a leitura do seu belo livro de poemas Antes de atravessar (Rio de Janeiro: Ibis Libris, 2022). Não espere, portanto, que eu me detenha nas muitas referências literárias do seu texto – Drummond, Bandeira, Lorca, Rosa, Horácio, o mito greco-latino, a Bíblia..., só para ficar em algumas – porque o que espicaçou a minha sensibilidade foi o resultado que você conseguiu, transformando um livro de poemas, em um livro-poema.

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Leonid Pasternak
Estou habituado, de há muito, à leitura dos livros mais densos e longos. Gosto dos poemas narrativos. Atrai-me o poeta que gosta de escrever e de espraiar-se em versos. Não sou o que se pode chamar de leitor da poesia contemporânea, principalmente no que diz respeito aos poetas paraibanos. Digo-lhe, no entanto, Nêumanne, que conhecendo muitos dos nossos poetas, nossos coevos, agradou-me mais a sua maneira de encarar o fato poético. Quem o conhece e assiste aos seus posts políticos, reconhece imediatamente o tom que ali se encontra nos seus poemas, que não fazem questão de ser econômicos ou de se perder em joguinhos de palavras. Senti algo como se o amigo procurasse deixar o poema respirar, em lugar de sufocá-lo com minimalismos. Deixar o poema falar é abrir a porteira da poesia. E isto você faz com conhecimento de causa, meu amigo. Não se trata só de habilidade, aquilo que Camões chamou de “arte”, mas daquilo que o nosso maior poeta da Língua Portuguesa, chamou de “engenho”. A arte deve subordinar-se sempre ao engenho, para que dali o poema se transforme em poesia, única forma possível de eternizar a sua sobrevivência.

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Leonid Pasternak
Vejo o seu livro, meu amigo, como uma preparação ritualística e bem ensaiada, na compreensão de que a vida é uma travessia inevitável, que ninguém pode fazer por nós. Cada um tem que enfrentar a sua própria, sempre diferente das demais e, frequentemente, diferente do traçado que, um dia, quisemos lhe dar. A idade, entretanto, tem, quase sempre, o condão de nos fazer experientes, para que preparemos uma viagem que começou há muito e que está longe de terminar, porque estaremos sempre fazendo travessias até aprendermos o caminho que nos acomodará na última morada espiritual.

Começo por confessar, Nêumanne, que gosto muito de capas e quando elas são bem escolhidas, tornam-se uma complementação do sentido do livro, não apenas uma parte integrante, para muitos, descartável. E que beleza de capa para Antes de atravessar! O frágil bote, à margem pedregosa, contrastando com a fluidez do rio, em cuja margem oposta, descortinam-se colinas verdes, sobre as quais o céu fulvo predomina, numa indefinição ambígua, que se adequa ao livro, como um fio condutor do poema: é o pôr-do-sol, findando o dia/vida, ou é a homérica Aurora
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dos dedos cor de rosa, no prenúncio de mais um começo? Parabéns a Romildo Castro Gomes e a Chico Pereira, os envolvidos na sua elaboração.

É aí, Nêumanne, que entra o seu verso, parte do título de minha leitura: sem fim, não há começo, porque cada fim nos leva a outro começo e assim sucessivamente, afinal de contas, rosianamente falando, só existem travessias. A outra parte do título – a relevância de alisar as coisas ásperas –, também verso seu, me leva a dois autores, ainda Rosa e o meu querido Virgílio. No Grande sertão, Riobaldo diz, compreendendo a dificuldade das travessias, que “não convém, a gente levantar escândalo de começo, só aos poucos é que o escuro é claro” (22ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2019, p. 141). Já o poeta da Eneida, exige de seu herói, Eneias, em sua fuga de Troia, ordenada pelos deuses, que ele “are o mar”, para poder chegar ao seu novo destino. Assim são as travessias que fazemos e que você, meu amigo, estrutura de uma forma sutil, deixando a encargo do leitor a percepção de uma viagem com preâmbulo, origens, a travessia em si, testamento, despedida e transcendência, que não aparecem necessariamente nessa ordem e nem são estanques, interpenetrando-se o mais das vezes, porque, afinal de contas, a sua criação poética revela um fluxo irrepresável, seja no fundo, seja na forma.

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Ivan Aivazovsky
Para que tudo isso possa tornar-se compreensível e se realizar, o leitor deve começar com o poema Será uma vez, uma Consoada às avessas, em que nada está preparado, porque a morte é apenas uma transição, entre tantas travessias a fazer, e não, com todo respeito a Bandeira, o fim de todos os milagres. Não escapa ao poeta a ironia, com referência ao choro falso dos “inimigos eventuais”, contrapondo-se ao lirismo “dos doces instantes”, que devem ser guardados pelo seu amor. Aliás, ver o Amor como a possibilidade de renascimento (Juventude a três), como um despertar que transforma (Isabel, Mar e Minas), sendo uma ousada celebração da amada (Manual de pintura, cartografia e anatomia), é uma condição sine qua non, para enfrentar com sabedoria a vida. O Amor Eros, que sai do ideal espiritualizado dos Cantares de Salomão, para encarnar na Musa Isabel; Amor maiúsculo, que faz frutificar no ser estéril, uma vida que só ele é capaz de conceder:

Isabel, Mar e Minas O Brasil pisado pelos pés de Isabel, o país moldado pelas mãos de minha mulher, é tudo que eu queria legar pro futuro como uma herança só de paz, sem medo nem desesperança. Ai, que delícia! Estéril como a figueira da Bíblia, meu amor por você dá flores e frutos nas quatro estações.

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Joachim Patinir
Da visão do Amor como essência da vida, surge o preâmbulo da travessia (Antes de atravessar), pois enganar Caronte e alongar a vida só tem sentido se for pela grande arte de amar. Já nas origens, estão dois magistrais poemas, um em verso (Stabat Mater), outro em prosa (Fundação do Pai), este último que denomino um Stabat Pater. São poemas que revelam a consciência de que não morremos e que os nossos vivem em nós e se transmigram sem cessar. Mãe Mundica e Pai Anchieta, meu amigo, não são apenas a genetrix e o genĭtor, que vivem e se multiplicam eternamente em cada célula dos seus descendentes; que vivem espiritualmente no renascimento; são, sobretudo, o mito fundador, com ambos glorificados na poesia. Sob todos os aspectos, o casal mater/pater transcende o tempo e o espaço. E como eu gostaria de ter escrito alguns versos/frases que se encontram nos poemas acima citados:

Fundação do Pai “Eu fui tu, antes de ser eu mesmo.” (p. 104) “Éramos matéria em movimento, almas em harmonia.” (p. 105) “Sem ti, meu pai, gênese e deuteronômio, fui deserdado da genética” (p. 106) “E estaremos rondando por aí, quando mundos novos se dispersarem numa poeira de estrelas, que se fundirem num gás, engendrando novas galáxias e um universo novinho em folha, novinho em fé, novinho em falhas.” (p. 111)

O melhor desse poema em prosa, Nêumanne, guardei para o final:

“Tu não me sabias ainda, mas eu já era teu, então, quando ainda nem havia.” (p. 103)

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William-Adolphe Bouguereau
Qual a compreensão, senão a poética, para sentir o saber e o sabor do maior presente que o Universo nos deu, a Vida, fundidos em um verbo de significado duplo e instigante?

Já em Stabat Mater, surge o retrato mais fiel da mãe, que amalgama as torturas do sofrer e as tonturas do prazer, diante da geração e da criação dos filhos. Mãe, que não estava (stabat), como escolheu o frei Jacopone Da Todi, mas que está (stat), como escreveu João, aquele que foi dado à Virgem, como filho, por Cristo, na hora dolorosa; mãe que está, como processo contínuo, porque jamais deixará de estar presente:

“E, aí, minha mãe vai renascer nos filhos que eu tiver, e vai crescer de novo nos netos que eu lhe der, e vai viver pra sempre nos versos que eu fizer: cantigas de amor na terra bruta, na grama dura, o infinito grão.”

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Joachim Patinir
O testamento está em Legado, expondo aos descendentes a consciência da miséria que nós geramos, o que, porém, é melhor do que deixar a ilusão de que o paraíso foi reencontrado. A despedida encontra-se em A volta de novo; a transcendência, que já se anuncia nos poemas aos pais, revela-se em No Oito, deitados. No meio de cada momento desse, aquilo que chamamos travessia, está a costura de sofrimentos e prazeres, que se fundem e se confundem, fornecendo o fio e o sentido da vida, porque é na exiguidade do espaço-tempo que se decide e se a vida se esvai ou se constrói; se se revela vã ou profícua; se cada um encontra a sua Isabel e, assim, há a remissão, no Amor que alivia como bálsamo, ou se a cada um cabe a sua Medeia e recebe a danação, consumido pelo fogo da miséria e abjeção de um mundo/país que não se ajeita (Medeia aqui e agora):

“E, entretanto, fora de nós, o humano se reinventa no sórdido bis da barbárie e na sublime beleza renovada.”

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Simon Vouet
Destaque-se, portanto, nesse costurar, meu amigo, a travessia, esse louvor ao Amor, encarnado na Musa Isabel, que desperta os gozos e a memória, fusão essencial de Érato e Mnemósine, cujo umbigo rouba à Delfos Apolínia a primazia de ser o “centro do universo” (Manual de pintura, cartografia e anatomia). Destaque-se o Amor, porque alguns teimam em fazem da travessia uma linha sem sentido, com finalidades pífias, deixando o Amor para as vias marginais. E a vida, como você bem o diz, meu amigo, a “vida é pra viver/e não há tempo que se possa perder”, no já citado e magnífico poema Manual de pintura, cartografia e anatomia. Chega de perder tempo, no embrenhado das vias transversas e oblíquas.

Afinal, o compromisso maior é o Amor, exposto sem pejo e sem medida, em seus versos, meu amigo, e amar é saber a “relevância de alisar as coisas ásperas” (Magister dixit). Sem Musa, sem Amor, sem compromisso, sem memória, não há travessia, só fatuidade, e, no dizer de Riobaldo, “o real não está na saída nem na chegada: ele se dispõe para a gente, é no meio da travessia” (op. cit., p. 53).

Grande abraço, meu amigo!

O Livro III de Notre-Dame de Paris é composto de dois capítulos – Notre-Dame e Paris à vol d’oiseau ( Paris vista de cima ou Paris...

victor hugo notre dame paris
O Livro III de Notre-Dame de Paris é composto de dois capítulos – Notre-Dame e Paris à vol d’oiseau (Paris vista de cima ou Paris em rápida visão do alto) – que eu considero a pedra no sapato de quem está iniciando as leituras de Victor Hugo. Não que os capítulos sejam enfadonhos,

O livro As flores do mal ( Les fleurs du mal ), de 1857, revolucionou a literatura francesa, deixando para trás o Romantismo. Seus p...

baudelaire klimt flores mal
O livro As flores do mal (Les fleurs du mal), de 1857, revolucionou a literatura francesa, deixando para trás o Romantismo. Seus poemas, muitas vezes, crus e realistas dariam ao flâneur Charles Baudelaire o status, nada lisonjeiro de início, de “poeta maldito”. Apesar da estranheza com que os seus poemas foram recebidos, em meio ao que se pode chamar de poesia sem halo e poeta sem auréola, como o próprio Baudelaire se definiu, encontra-se uma pérola, aparentemente das mais singelas, um hino a uma determinada Francisca — Franciscae Meae Laudes. Integrando a parte Spleen et idéal,

Este não é um texto para especialistas. É um texto didático, para aqueles que querem aprender sobre estrutura e estilística textual...

gustave dore divina comedia escrita redacao escrever
Este não é um texto para especialistas. É um texto didático, para aqueles que querem aprender sobre estrutura e estilística textual; para os que querem saber como um escritor, que domina a sua arte, constrói uma estrutura bem concatenada e, utilizando referências aparentemente superficiais, as une, através de um processo estilístico, resultando numa compreensão além da superficialidade. Do alto do seu saber irretocável, os especialistas detestam textos didáticos.

Em um dos seus mais belos sonetos, Camões inicia com um excepcional decassílabo, que atiça a curiosidade do leitor: “Mudam-se os tempos...

eleicao eleitoral
Em um dos seus mais belos sonetos, Camões inicia com um excepcional decassílabo, que atiça a curiosidade do leitor: “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”. No Brasil, parece que vivemos num universo paralelo, onde o tempo não passa e, por não passar, as vontades continuam as mesmas. Vivemos um tempo cediço, num atraso de dar dó, em que a pobreza se revela em todos os sentidos: da pobreza econômica, essencial para as mesquinharias de vidas ainda mais mesquinhas, à pobreza cultural, assomando nessa área, a miséria vernacular.

O editorial de Le Figaro , de hoje, dia 21 de agosto de 2024, intitula-se Jeu des dupes , algo como Jogo de burlas. Título bem sint...

le figaro macron titanic ombre chinoise
O editorial de Le Figaro, de hoje, dia 21 de agosto de 2024, intitula-se Jeu des dupes, algo como Jogo de burlas. Título bem sintomático, que revela a situação atual da França, presa a um “teatro de sombras chinesas” (théâtre d’ombres chinoises) que, se não tivesse em jogo o futuro do país, poderia ser interessante e divertido. Mas não é. As sombras só mostram a situação obscura em que a Gália de Astérix se encontra afundada, situação que não era nova, mas que foi revelada com a decisão tresloucada da antecipação das eleições legislativas do último mês de julho.