Ironia eu ir assistir ao mais novo filme do cineasta espanhol Pedro Almodóvar, O quarto ao lado, por esses tempos. Falo do impacto que a morte assistida do filósofo-poeta Antônio Cícero me causou, recentemente, (pois o filme tem esse como tema central). Além da vitória do horror do Trump nos Estados Unidos, pois o filme também fala dos tempos sombrios do neoliberalismo. Tudo passeou pelos meus pensamentos, enquanto assistia a esse belo filme.
Bem que eu estava achando muito estranho o seu silêncio. E assim se passaram alguns anos. Mandei e-mails, liguei para os números, mas aqui e acolá, achava que estarias viajando com o Magdalena Project ou visitando Pedro, seu filho, em Hong Kong. Com a pandemia pelo meio, meus radares não me passavam segurança.
Foi em 1985. Estava com o meu primeiro filho, Lucas, com pouco mais de um ano. Mas tomei coragem e deixei-o na casa da minha mãe, com toda a infra necessária. Partimos eu, o pai de Lucas, e mais um casal amigo. De carro, rumo ao Rio. Lá ficaríamos hospedados na casa do amigo, Zé Palhano, na Tijuca, e outros chegariam. Juca, o meu futuro companheiro também viria de São Paulo onde morava na época.
na beira/do açude ouvi/um rumor
não era /zabumba nem/era tambor
apenas um/cisne ouvindo/uma flor (Lau Siqueira)
A primeira edição dessa Feira, há 14 anos atrás, Juca, meu companheiro foi participar e me convidou, mas eu, professora da UFPb e, em pleno semestre, não pude ir. Depois, na 7ª edição, fui com a poeta Vitória Lima lançar meus livros, e lá reencontrei a escritora e minha professora UFPe, Luzilá Gonçalves e ainda conheci o escritor pernambucano Cassio Cavalcante, biógrafo de Nara Leão. Desde aí que admirei o trabalho de Mirtes Solpino e toda a equipe que faz acontecer a literatura em plena praça dessa cidade do Cariri paraibano.
Para Genilda Azeredo e Antônio Morais, Lu Damasceno, Edvânea e Medianeira
Desde que ouvi a atriz Cláudia Abreu estrear o seu monólogo – “Virginia – Um inventário íntimo”, que leio sobre o espetáculo, assisti à sua live de estreia, e acompanhei o percurso desse seu trabalho. Até que o Inventário chegou ao Recife. Logo me acoleguei com amigas para irmos ao Teatro do Parque (que eu não conhecia e fiquei maravilhada com aquele jardim, o teto de engrenagens expostas, pinturas lindas nas paredes e ladrilhos hidráulicos na entrada). O endereço na Rua do Hospício foi um ato falho, talvez, já que iríamos assistir a momentos do último mergulho de uma escritora que viveu atordoada pelas vozes outras e tirou a própria vida – Virginia Woolf!
Começo sempre pela Avenida Paulista – símbolo da nossa maior cidade, onde a força da grana destrói coisas belas. Uma flor lilás aqui enfronhada num prédio cinza e pujante, mas tudo contrasta com tanta pobreza ao relento. Nada mais doído do que numa avenida dessas, cheia de lojas, de apelos, de livrarias, hotéis, e o povo na rua. Tendas, cachorros, pedintes, e cobertores rasgados para o frio da noite. Eu que adoro frio com céu azul, não dava para aproveitar diante daquela paisagem triste.
É o nome de um podcast que gosto muito de ouvir. Muita gente interessante das mais diversas áreas a falar do tempo; quando começa o envelhecer; o que fazer nessa fase; como administrar as agruras. Outro dia ouvi a jornalista Astrid Fontenelle e a astróloga Claudia Lisboa. A conversa rendeu sobre espiritualidade, filhos e empoderamento das mulheres nas últimas décadas. Mas fiquei a pensar sobre os filhos. E das diferenças entre os tempos.
Passamos a semana atordoadas com uma votação que durou vinte e poucos segundos, na maciota e na tocaia, retrocedendo direitos adquiridos sobre o direito ao aborto nos casos de: estupro à mãe. Até esse projeto, o aborto é permitido em caso de estupro, cérebro anencéfalo e quando a gravidez oferece risco de vida à mãe. O PL 1904/2024, cujo autor é o deputado Sóstenes Cavalcante (PL/RJ), acrescenta alguns parágrafos a quatro artigos do Código Penal Brasileiro, que foi instituído em 1940. Segundo a nova proposta em discussão na Câmara dos Deputados, "quando houver viabilidade fetal, presumida em gestações acima de 22 semanas, as penas serão aplicadas conforme o delito de homicídio simples".
Mas antes do Tejo, teve Gard du Nord (Paris), com destino a Bruxelas. Cerveja da boa, chocolates tantos e as lojas que me fizeram sentir nas histórias de João e Maria. A Grand-Place e eu com os olhos arregalados naquelas construções medievais lindas e misteriosas. A trilha sonora? Jacques Brel e a sua icônica “Ne me quitte pas”! De lá, também de trem, fomos num bate e volta para Bruges, essa cidade também de boneca, com jardins, parques, charretes, o Grot-Markt e um balde de mexilhões cozidos no vinho branco e aipo. Com as melhores batatas fritas. Assim dizem. Fiquei a mirar aquelas ruas estreitas e floridas e ver a cara de felicidade dos meus pais, quando por ali viajaram, pela primeira vez. As fotos dos meus pais nas ruas de Bruges, me fizeram brindar às suas vidas.
Ao ver o título desse romance da ganhadora do prêmio Nobel de Literatura 2013, Doris Lessing, achamos fofos. E pensamos que vamos encontrar bolinho de chuva, tricô, e meus netinhos. Pista enganosa!
"Wenders toma para si, em Dias Perfeitos, o trabalho de “cinematizar” esse paradoxo da previsibilidade dentro do caos, revelando um lado da condição humana que quase nunca tem vez no cinema" (Crítica Omelete/internet)
Primeiro vi o post de Glorinha Kalil, jornalista e consultora de moda, falando dos banheiros de Tokyo, mais visitados que os museus. Ela comenta sobre um projeto inusitado: O dono das lojas esportivas e sustentáveis ao redor do mundo, Uniclo, queria fazer algo pelo seu povo e criou o “Tokyo Toilette Projetct”. Junto com os maiores arquitetos, cada um deles desenvolveu um projeto de arquitetura sofisticada para os banheiros públicos da cidade. E depois foi atrás do diretor de cinema Wim Wenders, que fez o filme Dias Perfeitos. Devo dizer que, depois desse filme, fiquei ainda com mais vontade de conhecer o Japão. Nem só de cerejeiras e templos vive uma cidade.
Dias Perfeitos, 2023, direção Wim Wenders (Mubi), a história de Hirayama, um homem silencioso e solitário que trabalha limpando banheiros públicos em Tokyo. No idioma original, o filme de Wenders se chama Komorebi, "uma palavra japonesa para a luz que cintila e as sombras criadas pelo balançar das folhas com o vento". Hirayama, Interpretado silenciosa e lindamente por Koji Yakusho, vencedor do prêmio de melhor ator no Festival de Cannes em 2023. O filme também foi o indicado a melhor filme estrangeiro na festa do Oscar de 2023. Um homem metódico, que mora num bairro pobre e que vê o Skytree de longe e de todas as cores. Hirayama tem como hobby, fotografar, com máquina analógica, as copas das árvores e seus efeitos diante dos raios do sol, ou do sol nascente.
A toda hora vemos a modernidade dessa megalópole, suas vias, sua impessoalidade, versus a vidinha cotidiana do protagonista. Sua invisibilidade no serviço é feroz; as pessoas não o veem cheio de esfregões, detergentes e esponjas. A sua única visibilidade se dá através de um bilhete deixado por traz de um dos vasos, onde ele brinca de jogo da velha com um transeunte invisível também. E pelos momentos do seu dia, vemos através dos seus olhos observadores, as meninas indo à escola, crianças no parque, uma vassoura despertando nas calçadas, um senhor que faz Tai chi chuan no meio do parque ou da rua, pássaros que voam, o céu azul, árvores tantas, ventos, um bocejo, uma bicicleta, a silhueta das pessoas, as sombras das folhagens, tudo isso se constituindo em rimas poéticas no filme.
Hirayama é um homem culto. O seu pequeno canto em um sobradinho apertado, tem estantes abarrotadas de livros; dentre eles: Palmeiras Selvagens, de William Falkner; Eleven, de Patricia Highsmith, e Árvores, de Aya Koda. E coleções de fita cassete, esse objeto estranho e anacrônico, cheio de hits do passado, Van Morrison e “Perfect Days”, de Lou Reed, que dá título ao filme, e “A casa do sol nascente” que, cantado em japonês, fica ainda mais tocante como o próprio sol desse país. “Mulheres não gostam de homens que resmungam, diz a dona do bar e que entoa essa música. Também ficamos sabendo da vida de Hirayama, através da sua sobrinha que cai de paraquedas na sua rotina costumaz. Sua irmã aparece, de outro mundo, dos vários mundos sem conexão, mas com notícias do seu pai isolado. Ele chora copiosamente por esse seu mundo do “lado de lá”. Ou de cá, das copas das árvores.
“Da próxima vez é da próxima vez”, e “Agora é Agora”, diz Hirayama, para a sua sobrinha, quando esta lhe pede para irem até o oceano e mudarem a perspectiva das coisas. Poderia ser um norte para os rumos que a história toma. Um Japão moderno, indiferente, robotizado, mas que a modernidade toma conta dos antigos espaços físicos e subjetivos. Num certo momento, um senhor ao ver um terreno vazio, se preparando para construção diz: “O que tinha aqui antes? Isso que é envelhecer?” Se pergunta amargurado. Realidade nossa de cada dia todo e em qualquer lugar.
Os dias de Hirayama parecem realmente perfeitos. Ele acorda cedo, trabalha, cuida das plantas, faz a barba, escova os dentes, olha pela fresta da janela, ouve suas músicas preferidas, frequenta uma casa de banho, janta sempre no restaurante de uma galeria e termina o dia lendo um livro. Mas seja pela belíssima fotografia de Franz Lustig, ou pelos ângulos que jamais serão os mesmos numa jornada onde se faz tudo igual, Hirayama olha para a câmera de Wenders e, numa tomada longa e profunda, ao som arrebatador de Nina Simone, nos transmite num silêncio sepulcral, o sentido/propósito da vida – VIVER! E a beleza do banal
A escritora inglesa Virginia Woolf dizia que as mulheres sempre escreveram, mas se perguntava no início do século XX porque então não ouvimos falar delas; e responde com toda a sua propriedade: a resposta pode estar trancafiada nos velhos diários, entocados em gavetas, escondidos nas memórias do tempo. Pode estar também na vida e na sua obscuridade, nos corredores sombrios da História, onde vagamente as figuras de gerações de mulheres tão pouco eram percebidas. Porque muito pouco se sabe das mulheres. A História da Inglaterra é uma História de uma linhagem masculina e não feminina. Dos nossos pais sempre sabemos de algum fato, alguma distinção. Eles foram soldados, ou marinheiros, pertenciam a alguma instituição e faziam as leis. Mas sobre as nossas mães, nossas avós, nossas bisavós, o que restou? Nada, mas uma tradição. Uma era bela; outra tinha o cabelo vermelho; uma outra foi beijada pela Rainha. Não sabemos nada delas a não ser seus nomes e as datas dos seus casamentos e o número de filhos que tivera.
(Virginia Woolf, “Women and Fiction”, tradução livre)
No último dia 26 de março, A Fundação Casa de José Américo fez um evento por ocasião dos festejos do Dia Internacional da Mulher, chamado de “Escritas nas Estrelas - Mulheres na Literatura da Paraíba”. Evento esse que, teve como ponto de partida, a pesquisa da Professora Doutora Ana Coutinho, cuja tese de doutorado na UFPe, 2005, título “Tecendo fios de liberdade: escritoras da Paraíba
do começo do século 20”. Tese essa que teve como foco o resgate/visibilidade das escritoras paraibanas do início do século até uma determinada data. Ana trabalhou com memória e estudou algumas das nossas escritoras até então desconhecidas e/ou silenciada, como Eudésia Vieira, Maria Ignez Maris, Olivina Olivia Carneiro e Lylia Guedes, que se destacam pela produção literária significativa. Ana, hoje é voluntária da FCJA, e junto com a equipe dessa Casa e em parceria com a Secretaria da Mulher e da Diversidade Humana e a Empresa Paraibana de Comunicação (EPC), por meio da Editora A União, resolveram estender essa homenagem às escritoras de hoje, da atualidade, dando assim um pontapé inicial para uma catalogação mais efetiva das mulheres que escrevem aqui na Paraíba.
Nessa pandemia tivemos que nos virar nos 30 para sobreviver. Entre quatro paredes. O trabalho doméstico foi um peso, mas também uma saída, os vinhos, as leituras, filmes e séries também. Tudo valia para driblar o medo e a ansiedade.
Esse foi o tema da Roda de Conversa para a qual fui convidada, pelo Ministério Público do Trabalho na Paraíba, em alusão ao Mês da Mulher. Uma alegria esse convite. Ainda mais, na companhia da atriz e educadora Zezita Matos, e da escritora e também professora, Patrícia Rosas. Na verdade, na sincronia de todas sermos professoras.
Uma parte de mim
É multidão
Outra parte estranheza
E solidãoFerreira Gullar
Acho que, desde muito pequena, fui uma criança solitária. Fazia muitas amizades na rua, no colégio, mas a saúde era frágil. Sofria com a garganta e tinha todas as mazelas que afligem as amígdalas. Desenvolvi uma paciência extra para ficar doente, perder aulas, tossir a noite toda, tomar lambedores e não poder tomar friagem, chuvinha fina etc. O que era normal para todos, para mim, era sempre um suspense. Gracias a la vida, tomei
Dizem que o ano começa depois da quarta-feira de cinzas. Acabou o mês interminável de janeiro. Passaram as festas do Ano Novo, as férias, e a festa do momo. Que venham as águas de março e o sabor de recomeço e renovação. O ano letivo também já começou, as ruas movimentadas com os carros e os alunos com suas mochilas. A cidade quase na normalidade, os turistas voltaram para as suas casas. O calor? Teima em continuar escaldante.
“A ideia é trazer um pouco desse caminho cultivado por muitas mãos: das mestras que tivemos o prazer de compartilhar experiências, das mulheres que participaram de nossas oficinas de percussão e que nos ensinam a cada conquista por elas alcançadas, pelas manifestações culturais afro-brasileiras que são o norte de nossa estrada”
(As Calungas)
Tenho um tambor dentro de mim. Digo isso porque, desde menina, não podia ouvir um Ala Ursa que queria seguir atrás. Aquele som, mais a liberdade de sair batucando pelas ruas e anônima, muito me tocavam lá dentro. Literalmente. Sou do Carnaval. Adoro. Muito mais do que o São João, como preferem outros. Mas no meu tempo, como dizem os mais velhos, não tínhamos o que hoje se apresenta. O máximo era o Corso, no Centro, e eu me conformava com o mela-mela, as lança-perfumes e o pouco que brinquei nos Clubes. Mas, nos salões da AABB e Cabo Branco, eu queria sumir entre os confetes e fazer os passos do frevo como hoje vejo no Recife. Deus sabe o que faz! Não fosse o mundo pequeno em que vivia, acho que eu teria dado para passista, se tivesse nascido no Rio. Na Mangueira, (fui uma vez num ensaio oficial e tremi nas bases). Ou no Acho é Pouco, em Olinda, onde brinquei no final dos anos 70 e começo dos 80. Ladeira abaixo.
Geralmente em janeiro é época de chuvas pelo Sudeste e com as mudanças climáticas só o que se vê é enchente, rios transbordando, miséria e tragédias. Anunciadas todas. A natureza é implacável, mas os governos incompetentes não se previnem, não tomam conta da população, não fazem o mínimo do dever de casa. E fico muito triste ao ver na TV as mortes, os carros boiando, as casas destruídas, as pessoas sem casa e perdendo tudo. Outra vez.
Velho, não
entardecido talvez
Antigo sim.
Me tornei antigo
porque a vida,
tantas vezes, se demorou.
e eu a esperei
como um rio aguarda a cheia.(Mia Couto)
Essa velhice do nascedouro tem ambiguidades pontiagudas a juventude sem compromisso e a maturidade latente do peito da mãe que se doa. Carências e ofertas. Tudo junto. Mistura entre lírico e samba, entre tango e frevo. E o torturante fado a me acompanhar. Entre o calar e o gritar.(Albiege Fernandes)
Sou Ana Adelaide Peixoto Tavares – Viúva, mãe de Lucas e Daniel, avó de Luísa. Professora Doutora da UFPB, aposentada – Departamento de Letras Estrangeiras Modernas. Escrevo crônicas no jornal A União e no blog Ambiente de Leitura Carlos Romero. Gosto de viajar e de não fazer nada. De cinema, ler e de dançar. De comer massa com pão de alho. De moda e de música. Não necessariamente nessa ordem... E de contemplar a vida... e todas as horas! “A prontidão é tudo”! Com poesia. Sempre! Já tive os cabelos vermelhos. Hoje não mais.
Assim está o meu pequeno currículo.
Sou aquariana e amante da liberdade. E do sossego. Sou muito grata por ter nascido em meados dos anos cinquenta e ter assistido a transformação inimaginável do mundo. Final do século XX e começo do XXI. Quantas mudanças! e a tecnologia e junto com ela, a gente com um celular na mão e uma loucura na cabeça. Mas tenho que admitir que, sem essa maquininha, a minha vida e transformações íntimas não teriam sido possíveis – ficar viúva, ninho vazio, e morar sozinha. Essa simultaneidade das coisas e instantaneidade me dão companhia e a ilusão de pertencimento, mas, a essa altura, quem quer saber da verdade? Contento-me com a ilusão.
Com tantas décadas no lombo, vamos mudando também. Vou ficando mais parecida com meu pai, ensimesmada. Mas sem o seu xadrez, infelizmente. Sempre fui caseira, mas tinha um pé no mundo. Hoje bem menos. Ainda gosto da rua, mas o calor me deixa dormente.
Gosto de olhar para trás e ver tudo o que aconteceu comigo. Não tudo, claro. Se pudesse mudar, sim, mudaria alguns destinos. Quem nunca?
Festa? Lembro da personagem de Virginia Woolf, Mrs Dalloway, que vivia a dar festas. Uma forma de uma mulher naqueles tempos londrinos observar o mundo, se expressar e viver o mundo público. Eu já gostei muito de festas. Não por esses motivos. Mas também para me expressar dançando, beijando os meninos bonitos, e explodindo as alegrias da juventude. Lembro que nos meus 50 ofereci uma festa para a família e amigos chegados, no Parahyba Café, e amanhecemos o dia, eu e Juca dançando Caetano: “E agora, que faço eu da vida sem você?...você não me ensinou a te esquecer”.
Nos 60, eu estava enlutada e tivemos só um bolinho para a família no aconchego da minha casa. Hoje, com mais uma volta ao sol, completando essa data redonda, 70 anos, quadrada e triangular, agradeço – Gracias a la vida! Que me há dado tanto. E celebro com meus filhos, companheiras, neta, irmãs, sobrinhos e cunhados, a minha vida. Recentemente, tive sustos na saúde, sustos que chacoalham a nossa existência e temos que tirar forças outras para enfrentar a vida: que não vai te tratar bem...
Quem quiser que fale bem de uma idade dita terceira. Queria mesmo era voltar aos 40! Mas não temos opção e seguir em frente é a Pasárgada possível. Comerei pastel de nata, sim! Darei uns mergulhos no mar, e já tenho os meus desejos íntimos. Conquistas? Nunca são muitas. Mas nunca fui ambiciosa. Ter um chão iluminado. Comidinha quentinha na mesa e contas pagas. Saúde e alegria de viver. Quem já teve depressão e síndrome do pânico, sabe do que falo. Um vestido novo, um sorvete de pinha, um entardecer, uma boa noite de sono, são luxos. Mas, e o Carnaval? A loucura dele é um êxtase que me faz falta.
A finitude? Assusta sim. Os cabelos brancos nos lembram sempre dessa data num futuro próximo, mas gosto de pensar num futuro perdido nas nuvens, que não tenho controle, que ele só aconteça.