Ainda que estejamos no século XXI e que tanto se alardeie o discurso de que avançamos bastante, suscita-nos perplexidade o fato de homens e mulheres optarem por não ter filhos. Passados mais de 50 anos desde a Revolução Sexual, com o advento da pílula que proporcionou à mulher o controle (parcial) sobre o seu corpo, ainda se discute a maternidade e a procriação como se fossem cláusulas pétreas na vida dos casais.
M. Handi
Essa discussão faz parte de um currículo oculto que merece ter destaque na escola, se a considerarmos de fato um espaço em que a identidade se constrói e a esta se vinculam questões relacionadas a gênero e sexualidade. Afinal, a escola não pode se isentar da responsabilidade de formar cidadãos críticos, capazes de refletir sobre as imposições culturais que ainda recaem sobre determinados grupos. O currículo tradicional, pautado em normas heteronormativas e patriarcais, perpetua valores que naturalizam a maternidade como obrigação, negligenciando as múltiplas formas de vivência e escolha.
Dessa forma, convém trazer para o ambiente escolar questões relacionadas à sexualidade e ao planejamento familiar, o que requer bastante cuidado por parte das instituições e dos docentes. Infelizmente, muitos setores da sociedade confundem essa
Cottonbro Std
As teorias pós-críticas nos abriram para a compreensão dos processos de dominação que atravessam o currículo tradicional, estruturado sob formas de coerção que se impõem sobre os corpos, sobretudo o das mulheres. Quando o movimento feminista clamou pelo direito de cada mulher ter posse sobre o próprio corpo, muitos não compreenderam a dimensão dessa reivindicação, que ultrapassa a esfera física e adentra o campo da subjetividade e da liberdade individual. Afinal, como já lembrava a ativista Carol Hanisch com o lema “o pessoal é político”, as decisões individuais das mulheres, incluindo a recusa à maternidade, são atravessadas por estruturas políticas e culturais que tentam regulá-las.
M. Libot
R. Lach
Assim, discutir a maternidade como escolha e não como destino obrigatório é um passo fundamental para a construção de uma sociedade mais justa. Que possamos avançar para um cenário no qual cada indivíduo possa decidir, sem culpa ou imposições externas, os rumos de sua própria vida. Afinal, o verdadeiro progresso não está apenas no desenvolvimento tecnológico ou econômico, mas também na ampliação das liberdades individuais e na desconstrução de normas que perpetuam desigualdades.
▪ Texto originalmente publicado no jornal A União em 18/4/2025