Liguei para o conselheiro aposentado Luiz Nunes com o propósito de checar informação relacionada à origem do Tribunal de Contas da P...

Um Tribunal e seu fundador

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Liguei para o conselheiro aposentado Luiz Nunes com o propósito de checar informação relacionada à origem do Tribunal de Contas da Paraíba, um dos três últimos organismos do gênero criados no País. Pediu-me ele, então, que fosse à sua casa para a conversa frente a frente. Entendo que, rumo aos bem vividos 91 anos de idade, faltem-lhe jeito e paciência para tratos mais longos ao telefone.

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Luiz Nunes, conselheiro aposentado do TCE/PB. ▪ Fonte: TCE/PB
Pus-me, assim, a caminho do seu endereço em busca da confirmação para um enredo, quando menos, curioso. Diz respeito ao deslocamento dos três pioneiros – os saudosos Antonio Carlos Escorel e Otacílio Silveira, além do próprio Luiz Nunes – até a Igreja de São Gonçalo, no bairro da Torre, onde o governador João Agripino acompanhava a celebração do casamento de um amigo.

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João Agripino ▪ 1914—1988
Agripino sancionara, em 31 de agosto de 1970, a Lei 3.627 com a qual instituía a Corte de Contas dos paraibanos. A instalação somente ocorreria, no ano seguinte, em 1º de março.

Eis a história da qual eu já estava informado. O Tribunal prestes a se instalar ainda não dispunha do seu prédio. Foi quando um daqueles três fundadores se lembrou de instalações prontas, novinhas em folha, porém reservadas ao Instituto de Medicina Legal. O trio convenceu o governador a conhecer a edificação e este, para surpresa de todos, decidiu fazer isso a pé, naquele exato momento. O motorista partiria com a Primeira Dama para a recepção e os canapés oferecidos pelos noivos.

A consulta que há pouco fiz ao mapa do Google atesta 20 minutos de caminhada desde a Igreja, na Praça Tiradentes, até a Rua Professor Geraldo Von Sohsten, em Jaguaribe, onde o tal prédio aguardava a mobília e os futuros ocupantes. Evidentemente, o inesperado cortejo levou gente às janelas e calçadas da Clemente Rosas, Bento da Gama e outras ruas desse trajeto. O esforço valeu a pena e, ato contínuo, o documento de cessão do imóvel era assinado pelo mandatário, ali mesmo, nas coxas. O pessoal do IML ficou uma fera. Na minha conversa com o conselheiro Luiz Nunes, este, de pronto, lembrou-se do nome do Padre Hildon Bandeira, o celebrante do citado casamento.

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Tribunal de Contas do Estado da Paraíba ▪ Fonte: TCE/PB
Seu amigo Otacílio foi o primeiro a sentar na cadeira de presidente do Tribunal. Fez isso por dois biênios: 1971/72 e 1973/74. Luiz Nunes passou mais tempo. Presidiu a Corte em 1975/76, em 1979/80, em 1993/94 e, em 2003, até 4 de abril, quando se aposentou. Escorel, do trio de pioneiros, deteve a presidência da Casa ao longo do biênio 1977/78.

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Aqui, Otacílio Silveira despachou ofícios e mandados.
Hoje, quem ingressa no prédio da Geraldo Von Sohsten se depara com o gabinete original, aquele de onde despachou seus ofícios e mandos o primeiro dos três amigos. Estão lá, ao fundo, no canto direito do hall principal, um velho armário, um birô pequeno com cinzeiro, carimbos, papéis, uma perfuradora e um telefone de gancho e disco. Ao lado, a mesinha com a indispensável máquina de escrever e, na parede, um enorme retrato de Otacílio.

Mal sabiam aqueles três o quanto se expandiria o Tribunal para cuja fundação tanto contribuíram, 54 anos atrás. O prédio antigo, ao longo do tempo, ganhou quatro blocos anexos e, ainda, o vasto terreno onde funcionou a extinta Associação dos Subtenentes e Sargentos do Exército com sua quadra de esportes e salão para bailes.

Desde 2014, ali se ergue o Centro Cultural Ariano Suassuna com um auditório de 420 cadeiras ocupadas durante simpósios técnicos e jurídicos, concertos musicais sem cobrança de ingressos e apresentações artísticas nas quais
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Centro Cultural Ariano Suassuna
se envolvem os municípios com seus grupos folclóricos e suas escolas. Outros ambientes prestam-se a exposições fotográficas e de artes plásticas. Também, às aulas da Escola de Contas em convênios com Universidades (iniciativa destinada, ora a cursos gratuitos de pós-graduação ora ao aprimoramento de servidores e gestores municipais ou estaduais) e, ainda, ao Espaço Cidadania Digital, um laboratório de onde saem programas e aplicativos de computador dispostos, inclusive, ao controle social dos atos e gastos dos governos. “Esta é uma obra singular e desafiadora. Tem a firmeza do aço e a brandura de um sonho”, inscreveu em placa na parede o criador Fábio Nogueira, com data de 19 de dezembro de 2014. Dez anos depois, ele volta a presidir sua Corte.

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Eventos realizados no Centro Cultural Ariano Suassuna / Fonte: Ascom TCE/PB
O Tribunal dos carimbos de Otacílio hoje faz uso de satélites para localização e identificação de obras públicas, sabe das receitas e despesas dos jurisdicionados tão logo se efetuem e se preocupa com a qualidade das ações governamentais no campo da saúde, da educação e do meio ambiente. Vai além do exame fiscal das contas públicas ao realizar auditorias operacionais para a emissão de alertas aos gestores antes que surjam problemas maiores. São coisas que aconteceram ao longo das sucessivas gestões.

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Luiz Nunes (Severino Sertanejo)
Foi bom rever o conselheiro Luiz Nunes. Depois de uma queda recente em razão da qual esteve por 15 dias em UTI, deixou-me a impressão de que não se dobra facilmente. Tem a resistência do umbuzeiro, a árvore sagrada do Sertão, como a chamou Euclides da Cunha. E, como tal, dá bons frutos. Perguntemos isso a Severino Sertanejo, o poeta que habita a alma desse meu amigo e se expressa em versos bem próximos da literatura de cordel.

Sim, é com este pseudônimo que ele publica livros já enaltecidos por gente como Câmara Cascudo, José Américo, Carlos Drummond e Orígenes Lessa. A Academia Paraibana de Letras o tem entre os seus desde julho de 1975. Não estou bem certo disso, mas acho que as Academias Municipais do Brasil, sediada em São Paulo, pode tê-lo por igual tempo. Ingressou no Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, em agosto de 1979.

Sua “História da Paraíba em verso”, livro editado por ocasião do 4º Centenário de fundação do Estado que o viu nascer em 16 de abril de 1934 (é paraibano de Água Branca) ganhou prefácio do professor Pedro Nicodemus. Também versejados, surgiram, entre outros, “A vida de Delmiro Gouveia”,
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“Inácio da Catingueira, o gênio escravo”, “Coisas da minha sala”, “A princesa Magalona e seu amor por Pierre”, “Napoleão, amor e guerra”, “Juscelino, vida e obra”, este último com prefácio de Murilo Melo Filho. O “Copa de 98” teve apresentação de José Nêummane Pinto e orelhas com textos de Armando Nogueira e Ascendino Leite.

Habitante, há décadas, do movimentado bairro de Tambauzinho, quase à sombra da Fundação Espaço Cultural José Lins do Rego com seu teatro, seu cinema, seu museu e a maior biblioteca da Paraíba, Luiz Nunes recebe os que o visitam com o riso franco e o abraço também sincero dos sertanejos de boa cepa.

Sua casa na Capital tem ares de fazenda. E tem entrada fácil. Difícil mesmo é de lá sair. O acolhimento e a conversa demorada logo prendem o visitante. “Você toma um vinho?”, perguntou-me. Recusei, a contragosto, a fim de que ele não se sentisse tentado a me acompanhar, pois ainda tem encontro marcado com os médicos e a medicina. Mas fiquei para o almoço. Com Luiz Nunes, felizmente, é assim: as recusas têm limites.

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  1. Texto que informa e homenageia ilustres paraibanos. O jornalista/cronista em plena forma. Parabéns, Frutuoso. Francisco Gil Messias.

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