O problema dos vários porquês tem perturbado escritores e estudiosos. Antes de entrar diretamente na explicação do seu emprego, gostaria de tecer algumas considerações técnicas sobre os diversos tipos de perguntas. Quem estiver interessado apenas nos porquês deve ler em diagonal os quatro parágrafos seguintes, para não se aborrecer com explicações que não dizem respeito diretamente aos porquês, mas são importantes para melhor entender a necessidade da distinção entre os seus vários usos.
Tumisu
Há quatro tipos de pergunta, dois dos quais o linguista Tesnière nomeou, levando em conta a sintaxe da pergunta e a forma da resposta. Assim, Tesnière chama de pergunta nuclear aquela que apresenta um núcleo sintático substituído, na resposta, por outro. Por exemplo, em “Quem saiu?”, ou em “Como vai?”, o núcleo da pergunta (quem e como, respectivamente) é substituído na resposta por outro núcleo (sujeito e adjunto adverbial de modo, respectivamente). O segundo tipo de pergunta é o conexional, que só admite sim ou não como resposta. Em “Você vai?” e em “Ela quer sair?”, a resposta só pode ser sim ou não. Em outras palavras: para Tesnière, a pergunta nuclear não admite sim ou não como resposta; a pergunta conexional, sim.
As boas gramáticas alemãs dividem a pergunta em dois tipos também: a Entscheidungsfrage (pergunta de decisão, equivalente à pergunta conexional de Tesnière) e a Ergänzungsfrage (pergunta de complemento, que corresponde à pergunta nuclear de Tesnière).
Sophieja23
Os outros dois tipos de perguntas são: a dupla e a de pressuposto. A pergunta é dupla quando apresenta dois postos, como em “Você está ganhando dinheiro com seu negócio desonesto?” – Se o interrogado responder não, poderá estar negando o ganho de dinheiro, mas confirmando a desonestidade do negócio. Há, portanto, duas perguntas numa só: “Você ganha dinheiro?” e “Seu negócio é desonesto?”
Tumisu
O último tipo de pergunta é a pergunta do pressuposto, como em “Você ainda bate em sua mulher?” – Seja qual for a resposta – sim ou não –, há o pressuposto de que o interrogado batia na mulher.
No estudo do porquê, os gramáticos nem sempre levam em conta esses quatro tipos de perguntas, quando afirmam que porque (numa palavra só) se usa apenas para respostas. É verdade que porque (numa palavra, sem acento) se usa para respostas, ou melhor, para indicar causa: “Ele trabalha porque precisa de dinheiro” (Resposta à pergunta possível: “Por que ele trabalha?”). Mas pode ser usado para perguntas conexionais (as que admitem sim ou não como resposta): “Ele trabalha porque precisa de dinheiro?”
Tumisu
Assim, temos o uso de porque (numa palavra, sem acento) para perguntas conexionais, para respostas a perguntas nucleares e para indicação de causa: “Ele saiu porque quis.” – Por que (em duas palavras, sem acento) se usa no início de orações interrogativas nucleares (que exigem porque como resposta: “Por que você saiu?”) ou no caso em que o que é pronome relativo (“As causas por que / pelas quais luto são nobres”).
O por que (separado, sem acento) equivale a “por qual” ou “a razão pela qual”: – “Não sei por que motivo você saiu – por que você saiu.” O porquê (junto, com acento) é substantivo; significa “causa”, “motivo”, e é sempre precedido de um determinante (normalmente o artigo): “Não sei o porquê (= o motivo) da renúncia do Jânio”, “Com tantos porquês, a criança enlouquece os pais”.
Finalmente, o por quê (separado, com acento) é a pergunta nuclear em final de oração: “Ele saiu por quê?*”
Teoricamente, por que (separado) equivale, grosso modo, ao inglês why, ao alemão warum e ao francês pourquoi. O porque (junto) equivale também grosso modo ao inglês because, ao alemão weil e ao francês parce que.
Acho que, com essa orientação, o leitor já sabe por que se usa o porquê. Sabe por quê? É porque aprendeu.