A travessia do jornal ao livro geralmente demora e não são todos os jornalistas que a fazem – ou conseguem. A maioria permanece res...

Agnaldo Almeida: do jornal ao livro, com louvor

agnaldo almeida livro deu no jornal
A travessia do jornal ao livro geralmente demora e não são todos os jornalistas que a fazem – ou conseguem. A maioria permanece restrita para sempre aos diários (impressos ou digitais), sem que isso, claro, signifique demérito para os profissionais do batente. Afinal, estão em seu habitat natural e isso lhes basta. Mas um ou outro, geralmente os cronistas, aqueles que transitam entre o jornalismo e a literatura, atravessa a fronteira e se converte em livro, numa forma de alcançar uma perenidade que o jornal, com sua intrínseca vocação para se tornar papel de embrulhar peixe, não consegue ofertar. No caso, ressalte-se, a precariedade é do veículo e não necessariamente do texto nele impresso.

agnaldo almeida livro deu no jornal
GD'Art
Os jornalistas profissionais estão acostumados com isso e não esquentam a cabeça. Sabem, por formação e experiência, da efemeridade do que se publica hoje para consumo imediato e provável esquecimento no dia seguinte. Amanhã os fatos serão outros e outros serão os interesses dos leitores, tudo rapidamente mudando, no frenesi natural dos dias cada vez mais agitados e rápidos. Mal se termina de escrever um texto e já se começa a esboçar o próximo: a contínua ação não favorece a contemplação – e até a impede.

agnaldo almeida livro deu no jornal
Agnaldo Almeida / Naná Garcez
Agnaldo Almeida, um dos ícones do jornalismo tabajara, precocemente falecido em 2024, viveu integral e intensamente a sua exigente e não raro ingrata profissão. Diria mais: viveu amorosamente o seu ofício, a ponto de se casar com uma colega, a operosa Naná Garcez, atualmente à frente da Empresa Paraibana de Comunicação (EPC), unindo, com um nó górdio afetivo, a vida profissional e pessoal de ambos. No seu caso, imagino, ao fim do dia, o trabalho não ficava na redação, mas seguia com eles para casa.

Com muitos anos no batente, Agnaldo tornou-se uma referência, um mestre de gerações. Como dirigente de A União, da Secretaria de Estado da Comunicação, da Associação Paraibana de Imprensa e do Sindicato dos Jornalistas, ele esteve dignamente dos dois lados do balcão. E em ambos se saiu bem, granjeando credibilidade e respeito. Soube ser patrão e soube ser empregado, e dessa experiência múltipla construiu sua honrada biografia. Ao lado de outros ícones do jornalismo paraibano, inscreveu seu nome no panteão dos melhores.

agnaldo almeida livro deu no jornal
Naná Garcez
Agora sua viúva, Naná Garcez, em muito boa hora resgata e publica uma coletânea de textos seus, publicados em sua coluna Deu no Jornal, em A União, no período de 2012 e 2013. A ideia é dar-lhes posteridade e torná-los acessíveis aos leitores de hoje, principalmente os mais jovens, que não tiveram oportunidade de conhecê-lo antes. É uma maneira de Agnaldo continuar, lá das alturas, seu magistério informal de jornalismo de qualidade. E é também um momento de celebração para profissionais da imprensa e leitores, parceiros inseparáveis na aventura cotidiana da notícia e da análise dos acontecimentos.

É uma profissão árdua o jornalismo, até mesmo para os astros e as estrelas do ofício. Nas províncias então, nem se fala. Há a restrição do mercado de trabalho, há a remuneração geralmente aquém do mérito e há a natural instabilidade das profissões liberais, sem garantias sobre o dia de amanhã. Ao escolhê-la a despeito disso tudo, é preciso amá-la, é preciso vê-la como o sentido da vida, como razão de viver. E é por isso que há que respeitar os que voluntariamente a elegem e a exercem com dignidade. Sem jornalismo livre e sério não há democracia e a cidadania resta amputada. Não podemos nunca esquecer esta verdade.

agnaldo almeida livro deu no jornal
O livro ficou bonito, vê-se nele o capricho das coisas feitas com amor. O belo volume atesta o nível de qualidade alcançado pela Editora A União, agora superiormente nivelada às melhores editoras oficiais do país. É um orgulho para os paraibanos.

Agnaldo escreveu sobre tudo. Tudo que tenha merecido sua atenção e seu tempo. Seus textos mostram a diversidade de assuntos de sua coluna. Seu olhar abrangia a aldeia, o país e o mundo, tudo podia despertar seu interesse analítico, seu desejo de opinar como jornalista e cidadão. O leitor verá que os artigos continuam atuais, já que as questões e os questionamentos de que tratam permanecem em alguma medida na ordem do dia.

Não sabia que ele era formado em Farmácia e Bioquímica, uma área tão distante do jornalismo. Vejo nisso mais uma razão para admirá-lo, na medida em que teve coragem de seguir a vocação, com todos os sacrifícios que isso provavelmente envolveu. E compreendo-o, já que existem carreiras que são antes de mais nada um sacerdócio, uma total entrega de si mesmo, doação que se faz sem se medir as consequências. O que conforta é saber que ele foi vitorioso. E mais que isso, ouso arriscar: feliz.

COMENTE, VIA FACEBOOK
COMENTE, VIA GOOGLE

leia também