Você anda a perder a esperança de um mundo melhor? As guerras, as injustiças, a ingratidão, as separações agudizadas em momento grav...

Um ato de fé

hospital napoleao laureano
Você anda a perder a esperança de um mundo melhor? As guerras, as injustiças, a ingratidão, as separações agudizadas em momento grave do ambiente social e político fazem você desistir das criaturas feitas à semelhança do Criador? Pois bem, não desista, mesmo que você não acredite em anjos e demônios.

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Pátio do Hospital Napoleão Laureano ▪ J. Pessoa-PB TâniaJP / GMaps
Há algo visível e palpável contra essa desistência. É coisa que pode se manifestar em cada um de nós em certas e determinadas situações: em mim, em você, nos amigos que fizemos e nos inimigos que não deveríamos ter feito.

Falo do fenômeno da compaixão. Há quem defina isso como a virtude de sentir o sofrimento do outro. É “o sofrer com” e, portanto, o auxílio, o amparo, a beneficência. Isso tanto independe dos credos que tenhamos quanto das nossas descrenças. É coisa de livre arbítrio e é o que nos diferencia dos bichos. As esperas diárias pelos disparos de um acelerador linear, o milagre tecnológico que me reduziu o PSA a 0.05, ao cabo de 38 aplicações, levaram-me a um lugar onde a compaixão pode ser medida por metro quadrado.

Ali sentado enquanto aguardava o chamamento “para o melhor equipamento do gênero existente no País”, ao que me foi dito, escutei o som crescente de um violão que então acompanhava nove ou dez vozes masculinas e femininas ao longo de salas e corredores. Em cada jaleco daqueles cantores e cantoras de idades variadas li a inscrição “Capelania”. Em seguida, percebi os olhos marejados dos esperançosos da cura quando aquele grupo se aproximava deles com seus cânticos e louvores.

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Hosp. Napoleão Laureano
Afinal, quem era aquela gente para a qual os pacientes do Hospital Napoleão Laureano acenavam, em grande número, com risos e lágrimas? Contaram-me que eram avós, pais, mães, filhas e filhos saídos, voluntariamente, de suas casas a fim de levar o conforto e a esperança aos que disso necessitam. Não mais precisei perguntar das origens e propósitos de jovens fantasiados de palhaços com ingressos na ala infantil do Hospital onde crianças em tenra idade, diante de pais aflitos, tinham momentos de alegria. Também entendi o voluntariado dos que compõem, de muito bom grado, o Conselho Deliberativo da Casa.

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Hosp. Napoleão Laureano
Ambulâncias, vans e ônibus provindos do interior costumam chegar às dezenas, diariamente, ao Laureano, antes do raiar do Sol, com gente de barriga vazia. Isso explica o café, o leite, o chá, o suco, o manguzá, o sanduíche e o bolo igualmente servidos aos enfermos e seus acompanhantes por senhoras com avental, cabelos atados e encobertos por tocas. Não seria preciso dizer que elas também não recebem por isso, a não ser o prazer decorrente da ajuda e da comiseração.

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Hosp. Napoleão Laureano
Agora, eu me pergunto quem inspirou quem ao desprendimento pessoal, à dedicação profissional e à assistência igualitária. Veja bem, a má sorte pode levar você a brigas ferrenhas contra um mal para cuja extinção a ciência ainda não estoca vacinas no postinho da esquina. Então, a depender de quem seja, ou do quanto possua, você está obrigado a buscar um centro de excelência médica com dinheiro vivo, com seu plano de saúde, ou com o número da sua inscrição no SUS.

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Hosp. Napoleão Laureano
Acreditem, não vi cidadãos de terceira dentro de qualquer gabinete médico nem debaixo daquelas fontes de radiações emitidas por equipamentos modernos e caríssimos. Por falar nisso, uma das mais recentes e festejadas aquisições é, ali, um robô manejável à distância por cirurgião ausente da sala de operação.

O voluntariado teria inspirado a atenção e os bons cuidados dispensados por quadros assalariados (médicos, médicas, enfermeiras e enfermeiros) a pacientes ansiosos e assustados, com e sem grana? Ou seria o contrário? Teria inspirado a calma e a paciência do pessoal técnico e das meninas nos balcões destinados à programação de consultas? Pois, aí, é onde a porca torce o rabo.

A organização, as cadeiras a todos dispostas, os ambientes refrigerados, o chamamento por ordem de chegada e por meio de painéis eletrônicos, certamente, elevam a confiança e acalmam as centenas e centenas de usuários do Sistema Único de Saúde assim chegados com a alma aos pedaços. Tudo isso junto, acredito, contribui, ali, para o acolhimento sem recusas, uma coisa a influenciar a outra: o socorro médico, o internamento, os cânticos, os louvores, a alimentação e os sorrisos.


As filas e as demoras poderiam ser menores? Sim, evidentemente. Para tanto bastaria a multiplicação do belo exemplo do Napoleão Laureano, um hospital filantrópico e, assim, necessitado das contribuições financeiras institucionais e pessoais. Filantropia, minhas e meus camaradas, designa o amor à espécie humana. Diz respeito ao apego e aos cuidados com os semelhantes, mas custa caro.

Napoleão Laureano, de quem o empreendimento tomou o nome, justa e merecidamente, foi um oncologista sertanejo, um paraibano de quatro costados, que operava de graça os filhos da pobreza.
Não veio do jornalista e escritor Nelson Rodrigues o entendimento de que toda unanimidade é burra? Sim, o Laureano tem seus críticos e eles se atêm, geralmente, à composição de alguns quadros feitos de escolhas pessoais. O diabo é que não vejo de qualquer dos insatisfeitos ações concretas em favor da enorme legião de desvalidos. Que tal criarem o próprio hospital? Isso apenas exige dignidade, respeito, vontade de servir e poder de aglutinação. Desculpem, exige mais. Requer a perseverança, o trabalho incansável e a súplica ininterrupta por recursos dos quais dependem a modernidade e a eficácia de equipamentos, alguns sem similares em outros pontos do País, no caso do Laureano.

Filantropia, nesses moldes, é coisa para poucos? Então, que tal ajudar esse Hospital na captação maior de recursos? Ou num projeto de ampliação de núcleos de atendimento no interior, a fim de que sejam evitadas viagens diárias da maioria dos pacientes, muitas delas cansativas, pois de larga quilometragem, para injeções hormonais, ou a avaliação dos tratamentos? Isso reduziria as filas e não seria pedir muito aos governos estadual e municipais. Consórcios de saúde já constituídos por grupos de Prefeituras com outros objetivos também poderiam ser, neste caso, de bom auxílio. Cobremos isso deles.
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Antônio Carneiro ArnaudHNL
Podemos assim fazê-lo, de modo fácil, via portais eletrônicos que, exigidos pela Lei da Transparência, todos os organismos públicos dispõem, obrigatoriamente, à sociedade. Batamos à porta dos que nos governam. Expandamos o Laureano.

Vou insatisfazer o médico e ex-prefeito Antonio Carneiro Arnaud, um dos dirigentes da Fundação Napoleão Laureano, o homem que, por trás de tudo, reluta em aparecer. Mas, a contragosto dele, tenho que citar seu nome, pois contou-me histórias que nos fazem acreditar na ajuda divina quando da aquisição de máquinas valiosas por um terço do preço e, não menos, quando do recebimento de donativos inesperados.

“Como posso ajudar vocês?”, ofereceu-se um cantor de grandes palcos. Informado do procedimento em conta bancária e da retirada das doações com as assinaturas de, ao menos, dois diretores, o moço fez um depósito de R$ 100 mil em favor do Hospital, com uma única exigência: a da não identificação.

Mais espantosa foi a visita do emissário de um grande empresário sulista que desceu de avião particular interessado em conhecer as instalações e o funcionamento daquilo de que o patrão ouvira falar lá para as bandas do Rio Grande do Sul. Ato contínuo, o saldo hospitalar tinha o acréscimo de R$ 400 mil.
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Napoleão Laureano ▪ 1914—1951
Seria o pagamento pela cirurgia espiritual realizada com pleno êxito – conforme cria o doador – pelo dr. Napoleão Laureano, o idealizador da Fundação e do Hospital instalado, desde 24 de fevereiro de 1962, na modesta Rua Capitão José Pessoa, bairro de Jaguaribe, na Capital da Paraíba.

Napoleão Laureano, de quem o empreendimento tomou o nome, justa e merecidamente, foi um oncologista sertanejo, um paraibano de quatro costados, que operava de graça os filhos da pobreza. Em 1962, ele não esteve na inauguração do hospital por cuja criação tanto lutou, porquanto a morte o apanhara, no Rio de Janeiro, onze anos antes. Mas ali estiveram, em meio a grande público, a viúva, dona Marcina, o ministro da Saúde Estácio Souto Maior, o governador Pedro Gondim, o diretor do Serviço Nacional do Câncer Antonio Prudente, o médico e deputado federal Janduhy Carneiro. Outro Carneiro, o Antonio das minhas conversas, compôs a primeira direção. Tem sido ali, desse modo, um homem de primeira hora.

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Alcides Carneiro ▪ 1906—1976
São vários e em postos de grande mando os Carneiro da Paraíba. Citemos Ruy (o senador), Raphael (o desembargador) e saudemos Alcides, advogado, poeta e político reconhecido como um dos maiores oradores do Brasil. Eis uma das suas frases saborosas, desta vez, quando da inauguração do Hospital do Instituto de Previdência e Assistência do Estado, o Ipase, no Rio de Janeiro: “Esta é uma Casa que por infelicidade se procura, mas por sorte se encontra”. Diga-se do extinto Ipase, presidido por Alcides de 1947 a 1951, que foi um órgão paraestatal com personalidade jurídica, autonomia administrativa e financeira e sede na então Capital Federal. É de Alcides que lembro quando vou ao Laureano.

E lembro da capacidade, lisura e decência das Isabellas, Caróis, Marcellas, Saulos, Lucianos, Joões, Karinas, Cláudias, Claudetes e Eloás assim pluralizados por representarem um vasto quadro profissional de competência e dedicação admirável àquilo que fazem.


Esforço-me pela universalidade, pela generalização de nomes e faces, dada a equivalência de cada um desses valores técnicos e humanos, mas torna-se inevitável uma nota pessoal: meu beijo e o da dona Miriam em Juliana e Ana. De volta à menção genérica desses profissionais e dos voluntários do Hospital, desejo que não lhes falte o reconhecimento eterno daqueles sob seus cuidados. E que, ali, Deus esteja sempre e sempre com todos.

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O edifício do Hospital Napoleão Laureano, em 1961, poucos meses antes de sua inauguração ▪ Fonte: Inca
Aos críticos suplico algo além da crítica. Peço-lhes o empenho a fim de que se multipliquem os espaços, os equipamentos e as pessoas que fazem de hospitais como o idealizado por Napoleão Laureano um ato de fé. Ou, quando menos, que componham, na inteireza das suas cordas vocais, o grupo de traqueostomizados, um incrível coro a serviço da esperança. Seu título comove e enternece: “Belas Vozes”.


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  1. Flavio Ramalho de Brito7/2/25 05:23

    Muito bom, O Laureano realmente é a "casa que por infelicidade se procura, mas por sorte se encontra", na frase lapidar de Alcides Carneiro

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  2. Anônimo7/2/25 06:11

    Felizmente eu tive a graça de ser paciente desse Hospital. Tive Câncer, hoje estou curado. Vi e senti no meu corpo toda a emoção do ambiente. Hoje sou um outro homem, agradecendo a Deus todos os dias a minha cura.
    Acredito em milagres e na inteligência dos homens. Eu amo tudo que representa aquele hospital. Valeu Frutuoso🥲🥲🥲👏👏👏👏👏🙏🙏🙏

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  3. Anônimo7/2/25 06:41

    José Pinheiro

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  4. Anônimo7/2/25 06:50

    Seu texto é, entre outras coisas, uma convocação à solidariedade, Frutuoso. E faz justiça a pessoas e a uma instituição que honra a Paraíba. Agora foi a minha vez de lê-lo com lágrimas nos olhos. Parabéns. Francisco Gil Messias.

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  5. Fruto, primeiro a felicidade de vê-lo curado . Um resultado que lhe antecipei, com toda a certeza. O Hospital Laureano merece todo o reconhecimento do mundo. Com destaque para o Médico Antonio Carneiro Arnaud, alma daquele extraordinário empreendimento ao qual tem dedicado todas as energias de sua vida. Durante 16 anos integrei o Conselho Deliberativo e conheci, de dentro, a luta incessante do Hospital, movida pelo amor aos que desafiam a terrível doença. Existe, sim, em todos os que se dedicam a esse trabalho, uma força semelhante à força de gravidade que os reúne em incansável devotamento. A Paraíba precisa ter consciência da grandeza e se orgulhar dos que fazem o Hospital Laureano e lhes estender seu apoio.

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    1. Grato, Ângela. Pelos bons votos e pelo compartilhamento do que sabe do Laureano, obra inestimável para cujo êxito você também contribuiu.

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  6. Anônimo7/2/25 14:37

    Parabéns Frutuoso por divulgar a obra belíssima que é realizada no Hospital Laureano , que eles possam proporcionar por muito tempo a restituição da saúde pra todos que os procuram .
    Um abraço,
    Edna Oliveira Frazão

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  7. Marcella Borges Varandas7/2/25 18:43

    Realmente é esperançoso ver a compaixão das pessoas em trabalho voluntário, é Deus agindo através das pessoas. Seja cobrando melhorias do poder público ou arregaçando as mangas levando algum tipo de acalento ao hospital, que sejamos instrumentos divinos a cooperar para o bem.

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  8. Anônimo7/2/25 19:19

    LANA DANTAS

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  9. Anônimo7/2/25 19:21

    Falar do Hospital Napoleão Laureano é reconhecer sua importância como referência no tratamento oncológico na Paraíba, um verdadeiro símbolo de esperança para milhares de pacientes. E quando mencionamos essa história de dedicação e compromisso, não posso deixar de destacar o nome do Dr. Carneiro.
    Ele tem sido uma peça fundamental na gestão e no crescimento do hospital, sempre priorizando o cuidado com os pacientes e a qualidade do atendimento. Seu compromisso com a saúde e sua incansável luta por recursos e melhorias fazem dele um exemplo de liderança humanizada e eficiente.
    O Napoleão Laureano não é apenas um hospital, é um porto seguro para quem enfrenta o câncer. E pessoas como Dr. Carneiro garantem que esse trabalho continue salvando vidas todos os dias!

    LANA DANTAS

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  10. Anônimo7/2/25 20:49

    Caro Frutuoso Chaves. Parabéns por seu artigo. Você faz justiça aos que administram o Hospital Napoleão Laureano. Quem conhece a boa qualidade dos serviços de assistência à saúde dos paraibanos acometidos por neoplasias, que são prestados naquela nosocômio, não compreende os que se limitam a criticar seus dirigentes. Deus abençoe os dirigentes do Laureano, os médicos, os enfermeiros e outros profissionais que ali trabalham. Abraço de Eitel Santiago de Brito Pereira.

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