Era a vontade de tocar o ouro esparramado no fim de tarde pelos telhados e pedaços de ruas históricas da cidade. Cada vez mai...

Extremos em raios

Era a vontade de tocar o ouro esparramado no fim de tarde pelos telhados e pedaços de ruas históricas da cidade. Cada vez mais o Sol se deitava, seus braços ficavam ainda mais ricos e sutis na carícia das copas das árvores, dos paralelepípedos, das paredes, dos rostos, das nuvens... Como se fizesse uma mesura, beijava a terra antes de desejar boa noite.

Felix Mittermeier
Desde as primeiras horas a chuva inundou o dia. Proibiu o acordar do Sol e toques dourados. O aguaceiro trouxe consigo outros raios, prateados, intensos, efêmeros, um desfilar como uma orquestra que se faz ouvir por todos os recantos. Tímpanos, bombos, caixas e tantos outros instrumentos pipocam por entre nuvens após o rasgo de prata…

Em outro dia, a alvorada trouxe a calmaria amarelada no horizonte marítimo. Surgiam raios rumo à terra, que avançavam imparáveis feito um exército em marcha a subjugar sombras. E tocavam corpos, árvores, concretos poéticos ou artificiais. O sentir dos raios trazia o poder do despertar, do erguer, do esquentar…

E também com poder de soerguer, mas de forma abrupta, já há raios de prata cruzando em reflexos janelas e portas, trazem uma espécie de apreensão. Tormentas anunciadas, tempestades que se aproximam, outros tipos de belezas naturais, encantadoras, escandalosas. O derramar-se do céu sobre o mundo soltando raios como um intenso show de rock cujo palco é a própria vida.

@rioantigo
Raios do Sol outrora queimaram e foram inclementes. Abraçaram violentamente corpos e todos os espaços possíveis que estavam desprotegidos para fazer tostar dolorosamente a pele até arder o juízo. No pino do meio-dia transformar em tortura e tontura uma caminhada curta, produzir uma angústia através do suar que aflora de cada poro.

Há também arte no raio que se divide feito ramos de árvores no céu cheio de nuvens de um azul-negro no horizonte. Tela que atrai os olhos mesmo abismados/assustados/encantados pelos pipocos da festa no infinito existente acima de todos. É belo o rasgar elétrico abrindo caminho celeste até cair em algum ponto terreno. Ou a descarga elétrica que sobe da terra rumo às alturas.

De novo, no fim do dia, o ouro retoma assento ao lado do banco da praça ocupado, nos canteiros floridos, no corpinho do vira-lata sonolento deitado no recanto de rua. E tudo ganha novamente um tom amarelado de ouro. Raios das últimas esquentaduras do dia, a prenunciar o esfriamento da face terra.

Clóvis Roberto
O prateado dos raios apresenta outro rosto. Solta em agitação como um corpo incontrolável em muitas direções. Segue sem estrada se espalhando até o breve encontro com a finitude das marcações temporais, tarde, noite, tudo se confunde... Muitas vezes, pranteia o dia desmedidamente, até soluçar com a inundação de flashs maquinais.

Ouro e prata, prata e ouro... extremos em raios.

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