Sempre fui afeito à palavra. Desde criança, gostava de refletir acerca de seus significados, questionava sobre o meu desconhecimento ...

Eu, professor

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Sempre fui afeito à palavra. Desde criança, gostava de refletir acerca de seus significados, questionava sobre o meu desconhecimento acerca do nosso vernáculo, a língua portuguesa. Intui-a, pois, tal qual Clarice Lispector, de que a palavra seria/é a minha quarta dimensão e o “meu domínio sobre o mundo” – pelo menos o meu mundo. Tudo que é linguagem e expressão me fascina. Gosto de ler textos em palavras e textos em pessoas.

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GD'Art
Aos 12 anos, disse: quero ser professor de Português. Parece aquelas histórias extraordinárias do tipo predestinação, mas não. Sei que foi chamado, o que alguns chamam de vocação, mas esse chamamento não é de nada se não estivermos cientes de que precisamos aprender a como chegar e também entendermos que não devemos deixar de procurar. E foi por volta desses anos que eu já ensaiava alguns escritos, frases e poemas um tanto aleatórios, mas que me impulsionaram a divulgar entre amigos, familiares e professores.

Em 2006, quando estava na 1ª série do Ensino Médio, apresentei alguns poemas ao professor Plínio Dias, professor de Literatura, que me incentivou a continuar a escrever. Essa também será a figura humana que me servirá como referência para eu me tornar docente.

Em 2008, aos 18 anos, apresentei-lhe meu primeiro livro de poemas, “Lembrança Perseverante”, cujo prefácio é de autoria desse docente que tanto acreditou na minha poética. Próximo aos 19 anos, após concluir meus estudos no Instituto Rio Branco (IRB), ingressei na Universidade Federal
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Léo Barbosa Acervo do autor
da Paraíba (UFPB), Campus I, João Pessoa, no ano de 2010. Nesse mesmo ano, publiquei meu segundo livro de poemas, “Versos Versáteis”. Embora se perceba a escrita estivesse desde cedo presente, sempre tive consciência de que o meu ingresso no curso não era motivado por isso. Fui, de fato, a Letras para seguir a carreira de educador. Recordo-me que, quando anunciei a meu pai o curso escolhido, ele sugeriu que eu procurasse coisa melhor, sob aquela alegação já clichê entre aqueles que escolhem esse ofício de que “vai passar ‘fome’ ou dificuldades”. Porém, veremos que isso em nenhum momento se sucedeu.

Em 2011, iniciando o 3º período, submeto-me ao processo seletivo para ser bolsista do PIBID – Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência –, coordenado pelas professoras Fátima Melo, Graça Carvalho e auxiliado pelo professor Pedro Farias Francelino. Esse programa foi muito importante para que eu pudesse me inserir no contexto de sala de aula e aplicar sequências didáticas e outros produtos desenvolvidos pelo grupo. Por meio deste, atuei durante três anos na Escola Estadual Olivina Olívia em João Pessoa.

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Acervo do autor
Posteriormente, comecei a ministrar aulas em escolas particulares e em cursinhos voltados para o Enem e para concursos. E confesso que comecei antes de concluir o curso, dados os anseios, como o de ter ao menos um pouco de estabilidade financeira. Este é uma das muitas preocupações dos estudantes de Licenciatura – conseguir se firmar no mercado de trabalho.

Em 2013, lanço “Lutos diários” pela editora Patuá, de São Paulo. No segundo semestre de 2014, concluo o curso com a monografia intitulada “O papel dos aspectos lúdicos da poesia infantil na construção do leitor-criança”, em que, movido pelo quanto que a poesia desde cedo foi presente em minha vida, vou abordando – principalmente a partir das figuras de linguagem – esses aspectos que motivam a criança a “brincar” com as palavras e a se encantar por seus jogos de palavras, pelos temas envolvidos, etc. O trabalho foi orientado pela profª Drª Daniela Segabinazi, que sempre foi e é uma professora muito envolvida com o universo da Literatura Infantojuvenil.

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Léo Barbosa e Daniela Segabinazi Acervo do autor
Em 2016, iniciei uma pós-graduação em Linguagem e Ensino, coordenada pelo prof. Dr. Denilson Pereira de Matos, na UFPB Virtual. Concluí no primeiro semestre de 2017, com a defesa do trabalho sob o título “O ideal do leitor proficiente: competências de leitura na prova do Enem – entre teoria e prática”, orientado pelo Prof. Dr. Francisco Vieira da Silva.

Em relação às oportunidades de trabalho em instituições particulares, foram diversas que, por limitações de espaço, não elencarei. Vou me ater, por ora, às expectativas, angústias e reflexões que me acompanharam/me acompanham.

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Léo Barbosa Acervo do autor
O fato é que me tornei professor com a mesma energia que me motiva a ser leitor assíduo e escritor: viver muitas vidas em uma só. Se “cada cabeça é um mundo”, eu me desafio a interpretar cada terreno que encontro em sala de aula. Não, não é fácil. Nem todos os solos são férteis, mas a alegria ocorre no plantio. Eu semeio e frustro-me ao constatar que algumas sementes não conseguem mostrar o máximo de suas potencialidades.

Não me tornei professor, mas profetizo. Professo minha sede de almejar ser melhor, o desejo de ser útil e trazer um pouco de sol a mundos que por vezes são tão obscuros, para alguns órfãos de pais vivos, para pessoas que necessitam apenas de um olhar mais demorado, sem pressa. Tenho vocação. Sou chamado, mas estou aprendendo como chegar lá. Espero que esta busca pelo caminho harmônico nunca cesse. É a avidez, a ânsia pela novidade que me conduzem.

Não quero ceder à mesmice e me dar por satisfeito. Como disse Paulo Freire: “ensinar e aprender não podem dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria”. (Freire, 1996, p. 90). Alguém pode nutrir uma admiração pelo professor porque vê a categoria como “seres iluminados, dotados de vocação, quase como um sacerdócio”, mas assim não é. Professor é alguém povoado de esperança – isso não há como negar, porque só não enxerga quem não quiser:
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Acervo do autor
os docentes que se comprometem com o ofício apresentam um contrastivo sentimento de expectativas e desilusões. Ser professor é algo que me consome, mas não me esgota, pois tamanha é a satisfação quando ouvimos “professor, eu aprendi isso contigo”, “você fez diferença em minha vida”. Sim, vivo esse ofício de resistência. Nado contra a correnteza – dos baixos salários ao desinteresse de alunos. Como dar de beber a quem não tem sede? Por mais que se insista, há sempre aqueles que não acreditam em si, fecham-se para novos conhecimentos, não entendem que saber e sabor têm a mesma raiz. Ser professor é dosar temperos. Enorme é o desafio: há muitos paladares e nem todos são apurados. Por que sou professor? Porque tenho fome.

Ademais, um bom professor não deve alimentar em seus alunos um espírito de competição pautado apenas no argumento de que precisam passar no vestibular. Em tempos de tantas distrações, em que o trabalho intelectual tem menos valor que entretenimento sem nenhum refinamento, creio que um dos maiores, senão o maior papel do professor, é combater a mediocridade. Mediocridade como sinônimo daquilo que se nivela apenas pela média. Por que sermos “mais do mesmo” se podemos ir além? Educar é desenvolver potencialidades. Para tanto, devemos ser exigentes a fim de evitarmos que esse vírus da pequenez se propague por toda a sociedade.

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Léo Barbosa Acervo do autor
Exercer autoridade diante da falta de perspectivas não é sintoma de autoritarismo. Educador é aquele que estabelece limites sem que isso implique cerceamento ou limitação. Cada aluno tem de ser desafiado a superar. Não para ser o maioral, mas para oferecer o melhor de si. É preciso recordar ao aluno que, embora pareça evidente, ele não estuda para os pais, para o vizinho, ou para ostentar conhecimentos tal como um presunçoso. É preciso estudar para alcançar crescimento pessoal e intelectual e não somente para obter um diploma.

Muitos alunos permanecem nas escolas com olhares tristes e desesperançosos. Cabe ao professor adotar uma postura de otimismo, acreditando na sua competência para ensinar e na capacidade dos alunos em aprender, para não ser aquele tipo de professor que anuncia fracassos. E que não demonstre frustração para que sua escolha não pareça um fardo, pois assim poderá destruir sonhos. Recordo-me de que, quando eu cursava um período numa turma de inglês em uma escola de idiomas, uma aluna expressou sua vontade de ser professora. A docente, que ministrava a aula, retrucou: “não, não queira, porque você vai sofrer!”. Lamentável. Se estava inconformada com seu ofício, por que não o abandonou?

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Léo Barbosa Acervo do autor
Um professor competente não espera as condições ideais para se empenhar, pois encara os obstáculos como desafios. O entusiasmo faz toda a diferença. Certa feita, uma aluna me chamou de louco pela tamanha empolgação que eu expressava numa aula sobre orações subordinadas. Disse-lhe que, se eu não demonstrasse alegria, tornaria a aula mais enfadonha. Transmitindo a alegria em ensinar, o aprendizado torna-se menos penoso. Mas, infelizmente, há ainda quem aconselhe o professor a não sorrir para os seus alunos…

Outro desafio enorme na carreira docente é a indisciplina, a desmotivação dos alunos. A maioria ainda não percebeu, ou melhor, sentiu a importância de estudar. E, como disse o professor António Estanqueiro (2010): “ensinar a quem não quer aprender é como lançar sementes em um terreno pedregoso. Não dá frutos”.

O professor precisa sempre reforçar o seu valor como agente de transformação. Mesmo que as informações sejam hoje tão facilmente obtidas, cabe ao professor o papel de ordenar o conhecimento, selecionar aquilo que há de mais importante e, sobretudo, formar seres críticos, formuladores de opiniões,
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seres autônomos como bem diz Paulo Freire em “Pedagogia da autonomia”. Ser professor é guiar pela mão, olhar nos olhos de seus discípulos e recordá-los e relembrar-se de que a perseverança é um valor que devemos construir todos os dias.

Um educador é aquele que sabe o momento certo para dizer “sim” e quando precisa dizer “não”. É improvável que o excesso de permissividade faça de alguém uma pessoa madura. Os pais e mães, na correria do dia a dia, estão negligenciando os seus papéis de educadores e, com o intuito de suprir a ausência na vida de seus filhos, perdem a autonomia ao delegar para a escola tarefas que lhes cabem.

O professor Cortella (2014) alerta que “as famílias estão confundindo escolarização com educação. É preciso lembrar que a escolarização é apenas uma parte da educação. Educar é tarefa da família”. A escola informa, a vida forma. Se por acaso a escola cumpre o papel de formadora, é porque não devemos ignorar que a formação cidadã, e a retidão de caráter não deve ser ignorada. Afinal, não raramente, as crianças e adolescentes passam mais tempo na presença dos professores.

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A crise de autoridade afeta diretamente o professor a ponto de ouvirmos respostas como: “meu pai não manda em mim, você vai mandar!?”. Muitas vezes vai ser o docente a primeira figura a exercer a figura de autoridade. Não foi ensinado à criança e ao adolescente que não estamos contra eles, que amar consiste em estabelecer limites, podar arestas tal qual fazemos com uma árvore para que ela cresça harmonicamente.

Sofre aquele que acredita que os seus desejos são os seus direitos. Pena aquele que não conhece os seus deveres e não desenvolve responsabilidades e empatia. Como disse o filósofo Rousseau (1995): “A maneira mais certa de deixar seu filho infeliz é acostumá-lo a receber tudo”. Mas, dizer “não” apenas por dizer está longe de ser uma atitude sábia. Respeito é algo que se conquista e não aquilo que se impõe. Precisamos ser categóricos e mais explícitos em nossas ordens, porém abertos ao diálogo.

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A falta de comunicação gera revolta porque diminui a autoestima. Educar exige tempo, firmeza nas palavras e atitudes, para que essas crianças não permaneçam para sempre infantilizadas, por não terem sido estimuladas a desenvolver uma inteligência emocional.

A exacerbada proteção os tornará pessoas que acreditam ser princesas e príncipes que não devem descer do trono, pois todos têm obrigação de satisfazê-lo a toda hora. E o pior: estas não são vilãs – são vítimas. Vítimas de uma educação que se pautou pela falta de fronteiras e de frustrações. Quem não suportar o choro da criança estará condenado a sofrer com as birras de adultos mimados.

REFERÊNCIAS CORTELLA, Mario Sergio. Educação, Escola e Docência – novos tempos, novas atitudes. São Paulo: Cortez, 2014.
ESTANQUEIRO, António. Boas práticas na educação – o papel dos professores. Lisboa: Editorial Presença, 2010.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários a prática educativa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1996.
KOCH, I. V.; ELIAS, V. M. Ler e compreender: os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2010.
KOCH. I. V. O texto e a construção dos sentidos. 9ª Ed. São Paulo, Contexto, 2008.
LISPECTOR, Clarice, «Declaração de amor », Jornal do Brasil, 11/05/1968, p. 2.
MARCUSCHI, L. A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola, 2009.
ROUSSEAU, J-J. Emílio, ou Da Educação. São Paulo: Martins Fontes, 1995

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  1. Você é, de fato, um vocacionado para a docência e para as letras, Leo. É o seu destino. Que você faça desse destino a sua felicidade. Sou seu admirador desde sempre. Francisco Gil Messias.

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  2. Fugiu um pouco da realidade de um professor. Quem escolheu ser professor , tem o destino descrito pelo seu pai. O mundo dentro de uma escola pública é muito diferente dos cursinhos , escolas particulares. Quando vamos escolher a profissão por vocação, precisamos ter em mente toda a realidade que nos espera. E digo mais, um diretor bom resolve 90% dos problemas de um professor. Quero deixar aqui que não sou professora, mas conheço bem a realidade do professor.

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