⏤ Qual o número da sua poltrona? – pergunta-me uma loura educada, sotaque gaúcho, em pé no pórtico de um túnel por onde vou descer até o avião. Não propriamente um túnel, uma espécie de, e nada me parece tão adequado a figurar o meu suplício.
E. Yilmaz
⏤ Dezoito – respondo, emprestando a esse vocábulo um tom fatídico. Tenho a alma apertada como a de quem vai ser executado em cadeira elétrica ou câmara de gás.
Na entrada da nave, saúda-me um comissário risonho e afetadamente cúmplice; vendo minha cara, terá sentido o drama e quer me dar coragem. Respondo ao cumprimento e prossigo, sorumbático. Em busca da tal poltrona 18 – noves fora, zero; ou seja, o fim...
Para desalento meu, ela está justamente em cima da asa – e já li que nas asas fica o tanque de gasolina. Setenta, oitenta mil litros de combustível formam uma espécie de lençol inflamável sobre o qual vou pairar, daqui a pouco, a doze mil metros de altura.
Logo uma moça compenetrada e de óculos, postada no início do corredor de bordo, vem dar umas instruções. Manuseando uma máscara de oxigênio, faz uma demonstração macabra.
⏤ Esta nave tem seis saídas de emergência...
SuperJet
Dou-me conta de que, logo atrás de mim, está uma delas. De alguma maneira, conforta; qualquer problema grave, abre-se lá em cima uma das saídas e a gente dá um pulinho, agarrado à poltrona transformada em paraquedas. O importante é não olhar para baixo.
⏤ Em caso de despressurização...
Como é?! Ouvindo isso tenho uma leve despressurização interior, delíquio de todas as minhas fibras e nervos, e por um instante me falta o ar. Vem-me o impulso de segurar a máscara – mas onde? qual? se o avião ainda está em terra!
Faizan
A moça nos sugere a leitura de um folheto onde se encontram instruções sobre como proceder em caso de emergência. Olho sem entusiasmo, como o suicida que lê as instruções de uso do veneno que, dentro em pouco, vai ingerir. Embora sejam essas prescrições de vida, o medo é tanto que me paralisa qualquer impulso de conhecê-las. Me impressiona, no tal folheto, a imagem de um avião boiando sobre o mar, e do qual, amarrados a boias, saem passageiros por janelas e portas. Seria uma prefiguração?
Agora o avião é rebocado até a cabeceira da pista. Pouco depois ligam-se os motores, assobio estrondoso de turbinas que parecem inflar até uma explosão inevitável. Antes que decole – ou exploda – perco todas as veleidades de brio. Olho para um lado e para o outro e, depois de me certificar de que não estou sendo observado, levo a mão até uma sacola em frente e retiro o vidro.
N. Korchagin
É de xarope, mas não contém xarope. Contém coisa bem diversa, própria a me fazer, digamos, planar por conta própria – alheio a máscaras, prescrições e números fatais. Entorno o líquido pouco antes de ouvir o comandante, com voz cava, dizer pelo rádio de bordo: