POEMAS DO LIVRO “XXI Sombras
(Editora COUSA – 2023)
(Editora COUSA – 2023)
“Morte, tu me obrigas a mudar
Nesta estufa em que meu corpo sua
Todos os excessos do século.”
Hélinand de Froidmont
“Os Versos da Morte – Século XII"
(...) porque as palavras, se o não sabe, movem-se muito, mudam
de um dia para o outro, são instáveis como sombras,
sombras elas mesmas, que tanto estão como deixaram de
estar, bolas de sabão, conchas de que mal se sente a respiração,
troncos cortados, aí lhe fica a informação, é gratuita,
não cobro nada por ela...
A morte
José Saramago
As intermitências da morte
Nesta estufa em que meu corpo sua
Todos os excessos do século.”
Hélinand de Froidmont
“Os Versos da Morte – Século XII"
(...) porque as palavras, se o não sabe, movem-se muito, mudam
de um dia para o outro, são instáveis como sombras,
sombras elas mesmas, que tanto estão como deixaram de
estar, bolas de sabão, conchas de que mal se sente a respiração,
troncos cortados, aí lhe fica a informação, é gratuita,
não cobro nada por ela...
A morte
José Saramago
As intermitências da morte
Não identifiquei entre os destroços
nenhuma sombra de dúvidas.
CAMINHAVA-SE,
e o não distante, retinia nos bolsos. (não se atropela com passo inútil a promessa do broto de amanhã) Retiniam nos bolsos os cristais, as balas, o despreparo de ser na miséria. Caminhava-se perdidamente, às cegas, tonto de saber-se tonto, de saber-se.
e o não distante, retinia nos bolsos. (não se atropela com passo inútil a promessa do broto de amanhã) Retiniam nos bolsos os cristais, as balas, o despreparo de ser na miséria. Caminhava-se perdidamente, às cegas, tonto de saber-se tonto, de saber-se.
NOSTALGIA
Me guarde em você. Quero ser seu rabo inútil ou sua sombra dispersa na metade dos dias. Não me recuso a nada, nem que me exploda em Mundo, e partido, fragmento andejo, me esparrame entre seus sonhos. Me guarde em você, assim como a surpresa ou um bocejar de tédio. Me guarde, me recrie no anonimato de sua pueril soberba. Me guarde, simples assim, como um resíduo de pele morta que se agarra à vida ou um som tardio, mínimo.
Me guarde em você. Quero ser seu rabo inútil ou sua sombra dispersa na metade dos dias. Não me recuso a nada, nem que me exploda em Mundo, e partido, fragmento andejo, me esparrame entre seus sonhos. Me guarde em você, assim como a surpresa ou um bocejar de tédio. Me guarde, me recrie no anonimato de sua pueril soberba. Me guarde, simples assim, como um resíduo de pele morta que se agarra à vida ou um som tardio, mínimo.
MADEIXAS DAS SOMBRAS
O Eu apagado, descrente, o crucifixo do outro e toda nudez do medo. Meu martírio: esta fogueira que não vesti. Se restam fagulhas, são versos roubados, pés trocados de outros passos, no silêncio das cinzas.
O Eu apagado, descrente, o crucifixo do outro e toda nudez do medo. Meu martírio: esta fogueira que não vesti. Se restam fagulhas, são versos roubados, pés trocados de outros passos, no silêncio das cinzas.
NOSTALGIA
MINÚCIAS Ah, as minúcias, o quanto lutamos para herdá-las... Colocá-las sob nossas asas, dar-lhes nome, dar-lhes de comer, ser delas o segredo que viceja na inutilidade do resplandecer. Ah, as minúcias, pesadelo dos gládios nesse porão de ossos.
MINÚCIAS Ah, as minúcias, o quanto lutamos para herdá-las... Colocá-las sob nossas asas, dar-lhes nome, dar-lhes de comer, ser delas o segredo que viceja na inutilidade do resplandecer. Ah, as minúcias, pesadelo dos gládios nesse porão de ossos.
SIMUM
Sopro da boca, desagua sua saliva e palavras brutas que necessito desumanizar-me. Se achegue úmido aos frangalhos que se arrastam nos altiplanos sem carne, pois é mais seco meu nome que as dunas que fervilham no deserto. A altivez de sua força é o nada que retorna ao poço fundo de um oásis sem causa — de um escombro sem data E o calor é o menor dano que posso causar aos que te aguardam do lado de lá, nas estufas do Paraíso.
Sopro da boca, desagua sua saliva e palavras brutas que necessito desumanizar-me. Se achegue úmido aos frangalhos que se arrastam nos altiplanos sem carne, pois é mais seco meu nome que as dunas que fervilham no deserto. A altivez de sua força é o nada que retorna ao poço fundo de um oásis sem causa — de um escombro sem data E o calor é o menor dano que posso causar aos que te aguardam do lado de lá, nas estufas do Paraíso.
O NEGRO DOS OLHOS
Céu, novelo azul de vazias formas, o que me assombra é o rodar da terra — eterna ciranda dos corvos — e os carrosséis repletos de sonhos. Esse círculo que contorna a Fortaleza é um abismo imenso onde grilhões em feição de olhos te observam. (O núcleo dispensa a ponte sobre a remora das águas da contradição.) O olhar posto na fenda é teu privilégio de capturar a luz da realidade. O posto, esse existir — estático — te aproximou da Musa do assombro. O horizonte é o fluido que deságua na morada do abismo.
Céu, novelo azul de vazias formas, o que me assombra é o rodar da terra — eterna ciranda dos corvos — e os carrosséis repletos de sonhos. Esse círculo que contorna a Fortaleza é um abismo imenso onde grilhões em feição de olhos te observam. (O núcleo dispensa a ponte sobre a remora das águas da contradição.) O olhar posto na fenda é teu privilégio de capturar a luz da realidade. O posto, esse existir — estático — te aproximou da Musa do assombro. O horizonte é o fluido que deságua na morada do abismo.
O GRANDE ENREDO
O enredo da bala cruzando os olhos do pátio — fingindo inocência O milésimo seguinte — oculto — no debrum do tempo O bolso vazio do corpo embalado em papelão num beco de saudosas paisagens A verdade do paquiderme cobrindo os olhos com enormes orelhas O rústico desfiando o pelo do urso sob os pés enlameados As lantejoulas vestindo perdulários na simetria dos quatro cantos da casamata A textura vulgar do remendo da insensatez A pústula que não rompe não vasa pois já não importa. Sentimento de mártir: cravar estacas e chamá-las realidade.
O enredo da bala cruzando os olhos do pátio — fingindo inocência O milésimo seguinte — oculto — no debrum do tempo O bolso vazio do corpo embalado em papelão num beco de saudosas paisagens A verdade do paquiderme cobrindo os olhos com enormes orelhas O rústico desfiando o pelo do urso sob os pés enlameados As lantejoulas vestindo perdulários na simetria dos quatro cantos da casamata A textura vulgar do remendo da insensatez A pústula que não rompe não vasa pois já não importa. Sentimento de mártir: cravar estacas e chamá-las realidade.