Quem a pede é meu amigo Cleanto Gomes Pereira e, com ele, muitos outros paraibanos zelosos para com a memória de Augusto dos Anjos, ...

Uma ponte para Augusto

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Quem a pede é meu amigo Cleanto Gomes Pereira e, com ele, muitos outros paraibanos zelosos para com a memória de Augusto dos Anjos, poeta nosso e do Brasil. E não é uma ponte qualquer, mas uma que ainda será feita, e que se anuncia festivamente – esperançosamente -, como solução definitiva para a ligação entre os municípios de Cabedelo, Santa Rita e Lucena. Chamam-na atualmente, à falta de outro nome, de Ponte do Futuro, o que, na melhor das hipóteses, é uma obviedade, já que ela ainda não existe no presente. Quando de fato existir – e torcemos para que exista, um dia – deixará de ser “do futuro” e então essa denominação perderá a razão de ser. E para que isso
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Projeto da 'Ponte do Fututo'
pb.gov.br
não ocorra é que Cleanto e tantos outros pedem que a tal ponte se chame desde já Augusto dos Anjos, um nome para a eternidade, ou seja, para além do simples futuro.

Claro que endosso o justo pedido do amigo e de tantos mais. Mas não porque ache que o poeta precisa disso. Augusto, penso eu, não precisa de mais nada: nem de ponte nem de viaduto nem de estátua. Ele, sabemos, é maior que todas essas miudezas materiais e simbólicas, está acima – e prescinde - de quaisquer homenagens que queiram fazer-lhe, aqui ou alhures. Nosso magro poeta alcançou, pelo espontâneo favor popular e também pela crítica que, aos poucos, veio no rastro dessa consagração, alturas tais que o distanciam, olímpico, de toda reverência oficial, principalmente as tardias. É como acontece, por exemplo, com Machado de Assis. O que uma ponte ou um aeroporto ou um navio pode acrescentar à sua glória?

Entretanto, ainda assim queremos a ponte para Augusto. Mais por nós, seus conterrâneos, que por ele. Essa hipotética ponte, sabemos, pode muito bem acabar levando o nome de um político, qualquer que seja, maior ou menor, não importa, com todo o respeito. Melhor, pois, que fique com o nome de um poeta. Os políticos já têm homenagens demais, aqui e em todo lugar. Mas os poetas, coitados, quem se lembra deles? O Brasil tem essa mania de em tudo colocar nome de político ou de militar. Por aí se vê
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José Lins do Rego Funesc
o quanto somos subdesenvolvidos. É como se não tivéssemos artistas e intelectuais. Ou como se não os valorizássemos. Pobres de nós.

José Lins do Rego, sendo quem é, esperou mais de meio século para ter, entre nós, o Espaço Cultural com o seu nome. É pouco, mas melhor que nada. Ninguém se lembrou dele ou de Ariano ou do próprio Augusto para qualquer dessas grandes avenidas que agora cortam a cidade em todas as direções. Algumas delas, para perplexidade geral, ostentam o nome de cidadãos anônimos que, verdade seja dita, nada fizeram de relevante pela urbe. Se alguém de fora (ou daqui mesmo) nos pergunta quem foi o distinto ou a distinta, não sabemos dizer de quem se trata. Não quero dizer com isso que não mereçam, por isso ou por aquilo, alguma homenagem pública. Mas uma imensa avenida é um pouco fora da conta, convenhamos.

Nosso José Américo, patrimônio cívico e literário do Brasil, até que teve sorte nesse quesito. Há um bairro com o seu nome, há uma avenida que o povo insiste em chamar de Beira-Rio, e algumas coisas mais. Mas em tudo, lembremos, foi o político que recolheu as honrarias. O governador, o ministro, o quase presidente da República.
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Em nenhum momento se honrou o autor de A Bagaceira, marco incontornável do modernismo regionalista brasileiro. Tivesse apenas escrito os livros importantes que escreveu e provavelmente “o homem de Areia” não emprestasse seu nome a nada na Paraíba.

Sei que tudo isso é assunto muito delicado, principalmente nas aldeias, onde as vaidades pessoais e familiares vicejam com força. Onde qualquer um, até o bobo da corte, se acha com direito a pomposas posteridades. Onde os parlamentos municipais, sem ter mais o que fazer, distribuem benesses oficiais como quem distribui folheto de propaganda em porta de loja. Ou seja, sem critério, sem justa valoração.

Por isso é justo que se peça a ponte para Augusto. Ele que saiu daqui levando algumas mágoas no bolso do colete preto. Ele que repousa (para sempre?) em Leopoldina, convertido em alheia glória municipal. Ele que se fez apenas à custa de seu gênio.

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pb.gov.br / DG_Art
Confesso que só acreditarei nessa ponte quando um dia puser os pés sobre ela. Tipo São Tomé. Até lá, para mim, ela constitui apenas uma abstração, como todas as promessas o são, principalmente as dos políticos. Para me convencer de sua eventual existência, nem uma fotografia colorida servirá, vou logo avisando. Pois estou bem lembrado do que os nossos homens públicos fizeram com Epitácio e o Porto do Capim. De qualquer modo, torço por essa ponte, como torço por tudo que melhore a vida dos paraibanos. Tenha ela o imenso nome do poeta – ou não.

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  1. Obrigado, Leo. Feliz Ano Novo. Grande abraço.

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  2. Obrigado, Raniery.

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  3. Obrigado, Chico.

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  4. Obrigado, Múcio.

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  5. Obrigado, Lúcia.

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  6. José Mário Espínola31/12/24 14:44

    Texto muito inteligente, Chaguinhas.
    Vamos valorizar o poeta.
    E um dia resgatá-lo

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  7. Obrigado, José Mário.

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  8. Uma boa ideia, e me acosto à proposição.

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