As gramáticas, na parte de sintaxe, omitem quatro problemas sintáticos que podem determinar reprovação em concursos e em vestibular...

Quatro problemas sintáticos

lingua portuguesa sintaxe
As gramáticas, na parte de sintaxe, omitem quatro problemas sintáticos que podem determinar reprovação em concursos e em vestibulares. Um desses problemas é a hendíade.

Um vereador do Rio de Janeiro, ao contestar um processo judicial a que respondia, disse ao repórter: “A justiça e Deus vai julgar-me.” Um gramático estranhou a frase, condenando a pretensa ausência de concordância verbal.
lingua portuguesa sintaxe
No seu entender, o vereador deveria ter dito: “A justiça e Deus vão julgar-me.” A frase do vereador está correta. É claro que a concordância no plural é também adequada, mas no singular também.

A hendíade ou hendíadis é uma figura de sintaxe em que uma coordenação aparece no lugar e na função de uma subordinação. Em outras palavras, o termo essencial, “a justiça e Deus”, pode ser entendido como “a justiça de Deus”, indo o verbo, obviamente, para o singular, como neste verso de Camões: “Em cujo corpo a morte e o ferro entrava” (Lus. IV, 40), em que “a morte e o ferro” é expressão que significa “a morte pelo ferro” (ou “o ferro mortal”). O Dicionário Aurélio, no verbete próprio, dá os seguintes exemplos de hendíadis: Ia andando, no sossego e na tarde (= no sossego da tarde); Respirava o perfume e os campos (= o perfume dos campos). Outros exemplos: ergueu o chapéu e a seda (= o chapéu de seda). O luto e a morte assombrou a família (= o luto da morte). “[...] o exagero e o vício é contraindicado” – frase da repórter Lilian Witte Fibe. Ela queria dizer: “O exagero do vício é contraindicado.” É claro que a concordância no plural é correta, mas aí deixaria de existir a hendíadis.

lingua portuguesa sintaxe
O segundo problema linguístico é a prolepse, terror do aluno a quem se pede análise de orações ou de termos de oração. A prolepse é a antecipação na subordinante de um termo da oração subordinada. Por exemplo: “O rapaz eu tenho a certeza de que vai faltar” – (o sujeito de “vai faltar” está na oração anterior). “Dinheiro eu garanto que você não tem” (o objeto direto do verbo da subordinada está no início da oração principal). Assim, uma frase como “Mandou os soldados que fossem buscar auxílio”, a oração subordinada pode ser classificada como adjetiva, como substantiva ou como adverbial. Como adjetiva, o “que” é pronome relativo: “Mandou os soldados os quais fossem buscar auxílio.” Como substantiva, considera-se a prolepse, e o “que” é conjunção integrante: “Mandou que os soldados fossem buscar auxilio”.
lingua portuguesa sintaxe
E, como subordinada adverbial final, o “que” é conjunção subordinativa, equivalente a “para que”: “Mandou os soldados (para) que fossem buscar auxílio”.

O terceiro problema é de concordância nominal. Quando dois substantivos estão juntos, formando palavra composta como em “couve-flor” por exemplo, ambos os substantivos normalmente se flexionam no plural. Quando, porém, o segundo substantivo não forma palavra composta com o primeiro, ele exerce função de aposto especificativo. O aposto é função substantiva e não adjetiva. Muitos gramáticos consideram que na expressão “calças pastel”, o substantivo “pastel” é adjetivo. Não é. Substantivos em função de aposto especificativo normalmente são invariáveis: comícios monstro, sequestros relâmpago, vestidos laranja, calças cinza, desvios padrão, normas padrão, mandatos tampão, comandos surpresa, leis antidroga, etc. Evanildo Bechara, em Lições de português pela análise sintática, 16.ed. Rio de Janeiro: Lucerna 2001, p.107-8, dá os seguintes exemplos de aposto especificativo, com ou sem preposição intercalada: Rio Amazonas, o Rei D. Manuel, o irmão Joaquim, Tecidos Aurora, Praça da República, Serra da Mantiqueira, etc. Eu acrescento: Elevadores Nacional,
lingua portuguesa sintaxe
Óticas Visão, Supermercados Carone, etc. A flexão é que deve ser considerada exceção!

Confrontem-se as seguintes expressões: raios ultravioleta, raios infravermelhos. Em raios ultravioleta, ultravioleta não se flexiona porque violeta é substantivo que exerce aí função apositiva. Mas, em raios infravermelhos, vermelho é adjetivo, que exerce função de adjunto adnominal, por isso se flexiona.

O quarto problema é com a concordância verbal com “um dos que”, que os gramáticos recomendam no plural, mas é no singular que ela é mais aceitável. Na frase: “Você foi um dos que mais erraram”, a concordância está correta; mas o singular, também: “Você foi um dos que mais errou”. Na verdade, o singular é que é preferível. A concordância no plural, ainda que gramaticalmente correta, pode apresentar erro de natureza semântica. Por exemplo: “O Sol é uma das estrelas que ilumina a Terra” – O plural daria a entender que há mais de um Sol a iluminar a Terra. Outro exemplo: “Jorge Amado é um dos autores contemporâneos que escreveu Capitães da Areia” (A concordância no plural significaria que vários autores escreveram Capitães da Areia, o que não é verdade).

Pena que os gramáticos omitam essas questões sintáticas...

COMENTE, VIA FACEBOOK
COMENTE, VIA GOOGLE

leia também