Leio que o 25 de dezembro é data improvável. Não, Cristo não teria nascido em tempo tão frio, porquanto o evento não condiz com al...

Então, é Natal?

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Leio que o 25 de dezembro é data improvável. Não, Cristo não teria nascido em tempo tão frio, porquanto o evento não condiz com alguns relatos bíblicos: o de um céu estrelado, o de pastores e rebanhos ao relento e o do censo determinado por César.

Os dirigentes romanos e judeus estavam longe de ser burros. Tirariam pouca gente de suas casas para jornadas penosas até Belém com temperaturas próximas, ou abaixo de zero, como naquelas paragens ocorre
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A estrela de BelémC. Spitzweg, 1870
até os dias de hoje. E, ainda por cima, para dar nome e endereço ao governo e seus cobradores de impostos. Tampouco, os pastores contemplariam estrela-guia debaixo de chuva ou, possivelmente, de neve. Nesta época do ano, bois, vacas, jumentos, cabras e ovelhas permaneciam (e ali ainda permanecem) nos estábulos.

Mas, ouçamos o minucioso Lucas: “Naqueles dias saiu um decreto da parte de César Augusto para que todo o mundo fosse recenseado. Esse primeiro recenseamento foi feito sendo Quirino governador da Síria. E todos iam alistar-se, cada um à sua própria cidade. Subiu também José da Galileia à Judeia, à cidade de Nazaré, à cidade de Davi, chamada Belém (porque era da casa e família de Davi) para alistar-se com Maria, sua esposa, que estava grávida. E aconteceu que, estando eles ali, se cumpriram os dias em que ela havia de dar à luz. E deu à luz seu filho primogênito, e envolveu-o em panos, e deitou-o numa manjedoura porque não havia para eles lugar na estalagem”. (Lucas 2:1-7). Os versículos seguintes falam de pastores no campo com seus rebanhos, de um anjo com a notícia, as condições e o endereço desse nascimento.

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O sonho de José no estábulo em BelémRembrandt, 1645
O que ainda não parece bater bem é este Cristo louro, de olhos azuis. Nem, em outra hipótese, este perfil europeu com olhos e cabelos castanhos, conforme retratado durante séculos desde os templos da Europa até a Paróquia de Nossa Senhora del Pilar, na terra pequena, pobre e sofrida de José Lins do Rego.

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Representações artísticas de Cristo, por: Pompeo Girolamo (1767) ▪ Quinten Massys (1890) ▪ Carl Heinrich Bloch (1873) ▪ Heinrich Hofmann (1884) ▪ Rembrandt (1661)
Tempo atrás, eu grudava os olhos e os sentidos em “A verdadeira face de Jesus”, documentário que retrata, com alguns saltos, o percurso do Sudário, desde os primeiros anos do Cristianismo até os dias modernos. A exibição, na tevê a cabo, fazia parte da enxurrada de fitas típicas da temporada. Ainda agora, liga-se o televisor e pronto: lá está o tema em tudo o que é produção filmográfica, seja com pitadas de ciência e religiosidade, seja nos romances de água de flor de laranja saídos de studios europeus e americanos, sobretudo, destes.


O documentário em questão retrata, em meio a depoimentos de historiadores e teólogos, o trabalho de uma equipe de artistas gráficos liderada por Ray Downing (do Studio Macbeth) que, em 2010, teve acesso exclusivo ao Sudário por cinco dias, em Turim, para o trabalho fotográfico. O propósito era o de um retrato fiel, em três dimensões, do homem da mortalha.

O Cristo, em pessoa? Bem, em 2008, uma pequena ponta daquele tecido fora submetida ao teste com Carbono 14, o mais confiável processo científico de datação conhecido no mundo, que àquilo
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Sudário de Turim (Santo Sudário)
dava entre 1.260 e 1.390 anos. Portanto, mais de 12 séculos depois do nascimento do filho de Maria, segundo a história então alçada às manchetes do jornalismo universal. O público brasileiro dela tomou conhecimento, notadamente, por meio do domingueiro “Fantástico”. Quem, entre os mais adentrados, disso não lembra?

Acontece que alguém logo comprovaria a má escolha dos pesquisadores em relação ao pedacinho extraído da borda do tecido para o exame laboratorial: coincidentemente, um remendo no pano com fios medievais. E a dúvida se instalou. O Vaticano, por sua vez, não mais liberou o Sudário para análises novas. As manchas ali captadas, fotograficamente, por Downing e levadas à perícia mostraram-se, por seu turno, compatíveis com os açoites e o processo de crucificação biblicamente relatados.

Mas vamos à face em 3D reproduzida com o auxílio dos recursos avançados da moderna computação gráfica. O que aparece é um ser de cabelos negros, traços grossos e pele morena. Ou seja, tudo muito de acordo com a aparência dos filhos de Belém, na Palestina, há 2 mil e poucos anos.


Aculturação é fogo, meu companheiro e minha companheira. É o que também nos traz um Papai Noel gordo e nórdico aos natais de quase todo mundo, desde Nova York até Coxixola. E, não menos, faz pesar sobre galhos retirados da Caatinga neves de algodão. Repetindo: não combina bem com a razoabilidade nem um Cristo branco em terra de morenos nem natais nevados em verão tropical, como os por aqui celebrados.

Pessoalmente, nunca fui ao ponto de enfeitar xique-xiques e sempre duvidei, desde muito novo, deste Papai Noel de barba branca, botas de cano alto,
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MS
luvas e roupa ridiculamente vermelha num calor de derreter juízo. Desse camarada gordo que voa de trenó e entra por chaminés. Há muito suspeitei de que sempre estivemos a comprar produto errado, artigo falso. Não é nem nunca foi nosso o “Merry Christmas” desejado ao próximo. É mercadoria alheia.

Tudo bem, compro o que leio e entendo o quanto o assunto é polêmico. Voltemos, contudo, ao suposto aniversariante e combinemos o seguinte: a aparência física de quem quer que seja é o que menos deveria importar à fé e à cristandade.

De modo que o reparo fica por conta do Cristo com traços europeus que nos acostumamos a ver nos grandes e pequenos templos ocidentais. À luz da razão, é mesmo difícil supor que tivesse pele muito branca, olhos azuis e cabelos alourados aquele homem santo e justo que se juntava à ralé, a pescadores e, em alguns casos, a prostitutas, na defesa dos injustiçados e oprimidos haja nascido, ou não, em dezembros nevados. Combinemos, ainda, que o Espírito de Natal deveria pairar sobre nós, todo santo dia, de janeiro a janeiro. Não é? A propósito, conta-se que o Papa Júlio I institucionalizou o Natal em 25 de dezembro, mais de 300 anos depois do nascimento de Cristo.

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  1. Uma pequena aula sobre o Natal e coisas afins. O cronista, quando é preciso, também faz isso. Mas esqueçamos as aulas, que é tempo de férias, e deixemo-nos levar pela benfazeja fantasia da época. Parabéns e feliz Natal, Frutuoso. E obrigado por todos os textos deste ano. Francisco Gil Messias.

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  2. Sou iguamente grato a você, Gil. Pelos comentários que me envaidecem e pelos textos com os quais você encanta a todos nós, seus leitores. Dezembro, 25, ou não, Feliz Natal.

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  3. Parabéns e obrigado aos autores pelo espírito de comunhão e pela enriquecedora interação, tão importante quanto os maravilhosos textos publicados no ALCR.

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  4. Primo, vc é mestre em suas publicações.
    Vc escreve com muito sentimento.
    De coisas simples, vc faz obras prima.
    Gratidao

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