Há vários tipos de dicionários: de etimologia, de usos, de língua, de morfologia (O Dicionário Morfológico da Língua Portuguesa, de Evaldo Hackler, Sebold Back e Egon Ricardo Massing, publicado pela Unisinos, de São Leopoldo, em 1984, é, que eu saiba, o único dicionário morfológico do mundo), de afixos e desinências, de análise do discurso, de sinônimos e antônimos, de linguística, de termos literários, de provérbios, de origens de expressões, de filologia, de filosofia, de gramática, de onomatopeias, de vozes de animais, de palíndromos
(palíndromo é palavra ou frase que pode ser lida da esquerda para a direita ou vice-versa, como arara ou subi no ônibus.) etc., cada um com suas funções e utilidades específicas, além dos dicionários bilingues que auxiliam nas traduções.
O dicionário de língua traz a significação de palavras cujo sentido desconhecemos ou cuja grafia queremos verificar. Mas há um dicionário que traz a palavra que ignoramos para o significado que já conhecemos. Por exemplo: sabemos que existe a mania de comprar coisas sem necessidade, mas não sabemos como dizer isso numa palavra só. Aí recorremos ao dicionário analógico, em cujo índice remissivo existem as palavras-chave, como vício, mania, loucura... Pelo índice, procuramos o substantivo, o adjetivo ou o verbo adequado ao sentido que já conhecemos. É claro que o dicionário não traz significados, mas apenas a lista de palavras relacionadas a vicio, mania ou loucura, em colunas para as três classes de palavras: adjetivo, substantivo ou verbo. Assim, escrevemos as palavras que julgamos necessárias para procurar no dicionário de língua qual delas é a que melhor traduz o sentido que já conhecemos. E entre elas encontramos: oneomania (ou oniomania) que significa “impulso de comprar coisas sem delas precisar”. Foi consultando um dicionário analógico que descobri que a adoração de santos se chama hagiolatria.
Conheço três bons dicionários analógicos: o Dicionário Analógico da Língua Portuguesa – Tesouro de vocábulos e frases da Língua Portuguesa, de Carlos Spitzer, S.J., lançado pela Editora Globo em 2ª edição em 1962; o de Francisco Ferreira dos Santos Azevedo, Dicionário Analógico da Língua Portuguesa – Ideias Afins, lançado em 1ª edição pela Coordenada Editora de Brasília — nome antigo da Editora Thesaurus —, em 1974, com prefácio de Bernardo Élis; e o de Kurt Pessek, com prefácio de Arnaldo Niskier, lançado pela Thesaurus, de Brasília, em 2010, com o título Dicionário de palavras interligadas — analógico e ideias afins, o melhor, o mais volumoso e o mais rico lexicalmente. E também, por óbvio, o mais caro.
Talvez por incompetência minha, não consegui descobrir a lista das palavras que designam mania, no dicionário de Spitzer. No de Francisco Azevedo, as manias adjetivadas são divididas em clássicas (como andromaníaco, dipsomaníaco, etc.), excêntricas (como iconomaníaco, habromaníaco – inexistente no dicionário de língua), ordinárias (piromaníaco, plantomaníaco, prussomaníaco, estes últimos inexistentes nos dicionários de língua), além de maieusomaníaco, que se relaciona ao parto ou ao puerpério.
Tudo isso vem a propósito de uma informação do uruguaio Carlos Liscano, no seu maravilhoso livro Lengua Curiosa (Montevideo: Ediciones del Caballo Perdido, 2003; segunda edição em 2007, que é a que tenho em mão). Ao falar de alguns medos, como oclofobia (temor de amontoamento de pessoas – multitudes, hacinamiento, no original espanhol --, talvez sinônimo de agorafobia) ou nosofobia (temor de enfermidades, sinônimo de patofobia), ele menciona algumas manias, como rinodactilomania (mania de meter o dedo no nariz, quase sinônimo de rinotilexomania, que é a mania de enfiar o dedo no nariz para tirar meleca) e otodactilomania (mania de enfiar o dedo mindinho ou auricular na orelha). Entre as manias que ele cita está, na ortografia original, kirstakostoepsomania, que é o costume de cofiar o bigode, gesto típico de Lula, quando se sente pressionado, nervoso ou impaciente.
Quando falei a meus alunos do curso superior a respeito do dicionário analógico, ninguém sabia o que isso quer dizer. E ninguém sabia que esse tipo de dicionário existe, talvez por ser difícil de encontrar nas livrarias, o que me leva a crer que somos carentes de boas livrarias. O que é uma lástima.