Numa chuva como esta é comum que alguém se sinta um pouquinho entristecido. Pois costuma se dizer que do frio possa vir o que cha...

Um aceno de euforia

poesia chuva germano romero
Numa chuva como esta é comum que alguém se sinta um pouquinho entristecido. Pois costuma se dizer que do frio possa vir o que chamam depressão. Em verdade, convenhamos, há uma certa nostalgia neste céu que lacrimeja, a tudo umedece e aos poetas enternece. De outro lado, se supõe: o calor que o sol aviva na manhã iluminada é capaz de germinar um aceno de euforia. Desde já, sou réu confesso, se de crime me acusarem por louvar sem discrição toda chuva que nos chega. Ainda que ciente dos estragos que ela causa aos que pouco receberam deste mundo tão injusto, eu me rendo ao deleite em total contemplação. Mas é dia de falar do friozinho e da garoa que pincelam o cenário. Se do clima impiedoso vem qualquer melancolia, não podemos esquecer que da mais profunda agrura, muitas vezes produziu-se o melhor de nossa arte. Na poesia, no romance e na música ao longe, as angústias lapidaram obras primas e eternas. Do contrário, no calor raramente se produz. Volto os olhos ao jardim para pétalas e folhas. As gotículas do orvalho, que da noite remanescem, agora se misturam às da chuva que não cessa. Sob o céu da cor do mar o horizonte se confunde com a linha que os separa. O marulho no silêncio sobressai-se mais solene. Suas vozes são mais claras como limpa, a paisagem. Onde estão os passarinhos? Decerto emudeceram no aconchego do coqueiro que lhes serve como ninhos e onde lá são aquecidos. Alegria é o que encontro na conversa intimista com as ideias que me vêm. Mesmo que a nostalgia se decante em verso e prosa, quando o inverno se aproxima, não consigo ficar triste ao sentir o regozijo destas plantas bem regadas. Lembro do amado pai, que do frio reclamava. Nos alpes, a saudade do calor de sua terra, tantas vezes o chamou. Agora imagino, cobertor não lhe faz falta. Pois a sua consciência, limpa e pura como a chuva, é capaz de aquecer as lembranças mais saudosas, com o amor que aqui deixou.

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  1. Helder Moura16/11/24 21:50

    Belo poema, Germano. Impossível não se deixar embalar pela sua destreza literária tão densa em sentimentos.

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    1. Obrigado, professor! Elogio dessa origem é puro estímulo

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