Fé, dúvida, razão e religião. Nesta tetralogia, os quatro termos são simultaneamente complementares e antagônicos. A fé traz em si a incerteza que provém da dúvida, e desse modo fazemos da crença em Deus um desafio, utilizando também o cálculo racional para justificar o que permanece marcado pelo que ele ultrapassa.
Quando mantemos o desafio da busca pela fé, e permanecemos na ideia do credo absurdo, é o momento que estamos mais próximos do que se constitui uma verdadeira fé.
Progressivamente toda crença, não apenas em Deus, mas também na revolução, no homem, na ciência, na ética, no amor, é igualmente um desafio do qual é preciso estar absolutamente consciente. Por isso, é facilmente compreensível que se vê na essência do homem um tecido de contradições, um prodígio, ou monstro no caos de certas épocas, um depositário de verdades seculares, incertezas e erros escolhidos como opções para sobrevivência de poucos, quando a glória e a escória do universo andam de mãos dadas na calçada.
Pascal, que foi nosso mais profundo antropólogo, também percebeu a sensível complexidade da civilização, cuja verdadeira eloquência zomba da filosofia, mas tem consciência da dialógica entre a sabedoria e a loucura, que caracterizam uma condição humana sem a busca de uma maneira a minimizá-la.
As loucuras moldadas por traumas, de certa forma construídos durante nossa existência, foram vividas aos prantos, e com dores em sua vivência. A etimologia da palavra "trauma" nos remete ao termo grego indicativo de "ferida", como consequência de um machucado, mesmo que tenha sido na alma.
Ela também deriva do grego traumatós (furar), e seu significado pode ser descrito como uma ferida com efração, que nos remete ao sofrimento doído pela memória constante à nos lembrar que o passado não pode ser apagado.
A vantagem possível é um esquecimento do que já fomos de ruim, aos que confiaram plena e serenamente em nossas atitudes convincentes em termos e gestos treinados, e não expressados pela alma.
Após isso, fica a dúvida de como as pessoas se vestiriam em nosso funeral? Com algo elogioso à altura de quem o merece, ou seria um desleixo como troco pela vida que proporcionou aos outros.
Sofremos mais na imaginação do que na realidade, é por isso que o espírito encontra secretamente a paz quando você assim deseja.