Tive um amigo gênio. O homem tinha doutorado na Sorbonne, com louvor, e, independentemente de títulos acadêmicos, era inteligentíssimo.
Às vezes, passávamos longas horas juntos, conversando. Na verdade, ele mais monologava do que dialogava, mas eu, como nunca fiz nenhuma questão de falar muito, pela certeza de não ter nada a dizer, sempre o ouvia com muita reverência, carinho e atenção; e acho que ele gostava de ser escutado por mim, a quem considerava uma audiência qualificada.
Certa vez ele me disse:
— Fittipaldi...
Ele me chamava assim por causa do meu nome próprio, adotado pelos meus pais em deferência ao piloto bicampeão de Fórmula 1 e campeão de Fórmula Indy. Nasci em 1973 e Emerson Fittipaldi foi bicampeão do mundo em 1972. Como meu pai apostou que eu seria campeão em alguma coisa na vida, chamou-me pelo primeiro nome da celebridade da época, num ato de amor. Eu preferia me chamar Antônio ou outro nome português que o valha, mas obrigado, meu pai. Agora também sou pai e lhe compreendo demais. Desejamos o bem para os nossos filhos, segundo aquilo que consideramos o melhor; e que nossos filhos nos perdoem depois…
Como eu ia dizendo, ele falou:
— Fittipaldi, quando somos jovens, o tempo sobra, mas depois que envelhecemos, ele é como um trem em movimento: vai bem na frente e a gente correndo atrás. Para quem é moço, o tempo é uma maratona; para quem envelheceu, uma corrida de cem metros. Quando experimentamos um momento agradável, ele foge, mas se estivermos debaixo do sol, sofrendo, passa lento...
Ele tinha consciência do que falava, pois, além de educador, filósofo, sociólogo e químico, era também físico. Sabia que o tempo não é absoluto, e é percebido de maneira diferente, a depender da velocidade com que um objeto se move em relação a um observador, no fenômeno conhecido como dilatação temporal. Segundo a famosa equação de Einstein, o tempo passa mais devagar para um objeto que se move muito rápido em relação a um outro que está parado ou se deslocando de modo mais lento.
Para o observador em alta velocidade, o tempo passa mais devagar. Os jovens correm, enquanto as paisagens permanecem fixas. Porém, para quem já viveu um pouco mais, parece que o mundo os está deixando para trás.
Nelson Rodrigues, perguntado sobre o que aconselharia aos jovens, respondeu, com aparente amargura: "envelheçam!"
Creio que o dramaturgo se referia a "envelhecer" no sentido de melhorar a percepção em relação ao valor do tempo. Neste sentido, é um excelente conselho. O filósofo Teofrasto de Ereso dizia que o tempo é a coisa mais valiosa que alguém pode gastar.
Quem descobriu o valor da vida, não desperdiça seu tempo. De fato, "presente" é mesmo um sinônimo de dádiva, pois a semente do futuro está nele.
Ter uma visão produtivista da vida é uma forma de perder tempo. Viver no automatismo, valorizando a produtividade acima de tudo, ao mensurar o valor pessoal pela quantidade de trabalho realizado e por resultados alcançados, é um desperdício de tempo, e não um ganho. Não se aproveita o tempo que se tem em função de metas externas, como um recurso que só vale se for usado para produzir. Ganha tempo quem o investe em favor do bem, do aprendizado e do crescimento pessoal. Cada momento dedicado ao amor e à bondade é um verdadeiro investimento no progresso da própria alma.
Se vivermos o momento presente com propósito e consciência, sem nos prendermos ao passado nem ao futuro, fará todo sentido a advertência contida no soneto do Frei Antônio das Chagas:
Deus pede hoje estrita conta do meu tempo.
E eu vou, do meu tempo dar-Lhe conta.
Mas como dar, sem tempo, tanta conta.
Eu, que gastei, sem conta, tanto tempo?
Para ter minha conta feita a tempo
O tempo me foi dado e não fiz conta.
Não quis, tendo tempo, fazer conta,
Hoje quero fazer conta e não há tempo.
Oh! vós, que tendes tempo sem ter conta,
Não gasteis vosso tempo em passa-tempo.
Cuidai, enquanto é tempo em vossa conta.
Pois aqueles que sem conta gastam tempo,
Quando o tempo chegar de prestar conta,
Chorarão, como eu, o não ter tempo.