Longos monstros de braços gigantes espiam sobre a serra. Alertas, atravessam enormes pás ciclopes para além do horizonte na vigilância da serpente negra por onde trafegam inventos que transportam humanos no sentido leste-oeste. A paisagem seca por quilômetros abriga muita vida e o verde desaparecido está à espera de qualquer invernada para reflorescer a região.
A estrada segue como uma serpente negra com altos e baixos, curvas e retas. Nas laterais, um marrom de muitos tons, a secura da terra, da vegetação e da vida dos próprios homens. O céu é de um azul infinito e as nuvens naquele lugar são insuficientes até para projetar sombras à superfície do planeta. Fins de outubro e a primavera é áspera com os caminhos rumo ao Sertão.
Rumo ao Sertão é ultrapassar as casinhas coloridas num recanto de Soledade, as construções de Junco, os espaços desabitados. Serras, pedras esculpidas, casas perdidas e plantas secas pontuam o trajeto. O horizonte é uma massa por onde há uma passagem. Aqui e acolá vacas pastam em fim de pasto verde próximos a micros açudes com resíduos de água, feito oásis no deserto, resto de vida líquida. Em breve, será preciso transferir os animais antes que sejam vencidos pela escassez.
A porta do Sertão é anunciada pela mudança da geografia. Ao passar pelas sentinelas estranhas das megaestruturas de cataventos que capturam energia do vento, as terras se desnudam pelo terreno para além dos exércitos de espelhos refletores que sugam dos raios solares outras tantas forças. Naquele trecho, há um estranhamento e um choque dos olhos com a colisão das tecnologias e da natureza e uma nova poluição se faz presente, na assinatura da limpeza energética.
A serra perigosa desce e adentra a Paraíba. A porta é um declive de ar desértico e ainda assim belo e poético. Vez ou outra a ponta amarela e ilhada da copa de uma árvore em floração grita por atenção ao formar um quadro que avisa sobre a resiliência de ser sertanejo. Magnífico lugar que desafia a vida e permite-lhe a vitória, captura corações de filhos, residentes e visitantes, surpreende com gente e cenários.
O Sertão se abre na mudança geográfica pós-serra de Santa Luzia. A parede de pedra enfeitada por ribanceiras entrecortadas pelo negrume do piche da Rodovia Transamazônica, que brilha ao pino do dia ao contraste do Sol e segue o caminho que será verde e multicolorido em outra época do ano.
Rumar ao Sertão é mergulha em tantas histórias dos seus filhos de hoje e de antes. É tentar entender o amor pela terra, serras, luas, chuvas e pessoas. É ser engolido pelas estradas e passagens.
Sertão visitado que abraça numa lufada de ar quente na réstia de alguma sombra solta. Local cuja quentura dispara ponteiros e aquece a alma. Da agente, o acolhedor e sorridente rosto. Da terra onde o calor fura a pele feito um espinhento facheiro, o céu é uma abertura sem fim de azul despudorado, atreve-se por inteiro, e o Sol reina, beija, afaga, cospe, ama.