Apesar da prolação generalizada pego (com /e/ (= < ê >), de preferência, e não com /ε/ (= < é > ), há razões para crer que o verbo pegar só admita pegado como particípio.
O Vocabulário Ortográfico da língua portuguesa, da ABL (3.ed. Rio de Janeiro: Corbã, 1999), registra pego e pegado, como particípios de pegar. A 5. edição, de 2009, pela Global, registra pegado apenas como adjetivo, e registra pego como flexão (sic) do verbo pegar. O Novo dicionário Aurélio (4. ed. Rio de Janeiro: Positiva, 2009) registra pego como brasileirismo. No seu Dicionário de dúvidas e dificuldades do idioma nacional (2.ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1944), Antenor Nascentes ensina que pegado é o único particípio de pegar; no Dicionário brasileiro da língua portuguesa, de Macedo Soares (Rio de Janeiro: MEC/INL, 1984, vol. 1; e 1955, vol. 2), há o verbete pegado, mas não há pego; no Manual de conjugações verbais (Rio de Janeiro: Acadêmica, 1961), Cândido Jucá (filho) considera pego forma ainda sem abonação dos mestres (p. 106) e não bem aceita (p. 182); Otelo Reis, mais categórico, condena (Breviário da conjugação dos verbos da língua portuguesa. 31.ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1967, p. 90) como errônea a forma pego; Adriano da Gama Kury (1000 perguntas: português. Rio de Janeiro: Rio, 1983) admite pego como correto, embora considere de menos uso na língua culta (Pergunta 215); Celso Cunha e Rocha Lima, (Gramática do português contemporâneo. Belo Horizonte: Bernardo Álvares, 1970, p. 306; Gramática normativa da língua portuguesa. 15.ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1972, p. 150, respectivamente), admitem o verbo pegar na relação dos particípios duplos.
Nesse mar de opiniões, podemos destacar três linhas básicas:
l. a dos que aceitam pego como forma correta ao lado de pegado;
2. a dos que consideram pegado preferível a pego;
3. a dos que simplesmente consideram pego como incorreto e o rejeitam.
2. a dos que consideram pegado preferível a pego;
3. a dos que simplesmente consideram pego como incorreto e o rejeitam.
As razões que levam os autores a adotar uma dessas três lições não são explicitadas claramente, mas parecem prender-se à baixa frequência do uso escrito de pego, nos escritores consultados como fonte de seus exemplos.
Sempre que ocorre um particípio irregular na língua, esse particípio pode exercer a função de adjetivo. Se há dois particípios, é normalmente o irregular – e não o outro – que exerce a função adjetiva. Vejamos: livro impresso (por “imprimido”), sapato roto (por “rompido”), leito seco (por “secado”), presente aceito (por “aceitado”), encomenda entregue (por “entregada”), aluno expulso (por “expulsado”), etc. Se o verbo tem dois particípios, e o particípio regular também exerce a função adjetiva, como o irregular, então o sentido se altera: carro segurado (coberto por uma seguradora) / carro seguro (que oferece segurança); garota enxugada (sem umidade)/garota enxuta (de corpo bonito); homem omitido (esquecido) / homem omisso (irresponsável); pessoas juntadas (amasiadas)/ pessoas juntas (reunidas), etc. Em síntese, o particípio irregular pode exercer sempre uma função de adjetivo; o particípio regular, nem sempre. Ora, fosse o particípio irregular pego admissível na gramática do dialeto culto, como padrão ideal, teríamos frases como:
l. *Moro numa casa pega com a prefeitura (em lugar de “pegada com a prefeitura”).
2. *Comprei dois apartamentos pegos um com ou outro (por “pegados”).
3. ?Aqui estão os escravos pegos de volta (em lugar de “pegados”).
Ora, se as sentenças acima são agramaticais ou inaceitáveis, é porque pego não pode ser considerado particípio irregular, no dialeto culto, ainda que o possa ser em outro nível de língua ou em outro dialeto que ainda está por ser descrito. Mas isso é outro problema.
Nota: os parênteses quebrados (< >) indicam letras. As barras oblíquas indicam o fonema. O asterisco antes da frase indica a gramaticalidade. O ponto de interrogação antes da frase indica gramaticalidade duvidosa.