POEMAS DO LIVRO “O ORNITORRINCO DO PAU OCO” (Editora Cousa – 2018)     BESTAS, BEATS E BEATOS Na me...

O Estalo da Palavra (XV)

poesia capixaba jorge elias neto

POEMAS DO LIVRO “O ORNITORRINCO DO PAU OCO”
(Editora Cousa – 2018)

 
 
BESTAS, BEATS E BEATOS
Na medida em que o olhar poético flui do verde para o concreto, muito se perde. Cabe devastar a poesia, arrancar a relva, desgastar a terra, impregnar de concreto a carne e esparramar ao sol a pele tatuada dos homens? O non sense, em dizer: Maldito deus. Maldito corpo. Bem vindo à eternidade do instante? Render-se à perversão, atropelando furioso os sonhos, mesmo que a imortalidade já não tenha sentido? Cabe o desperdício de palavras soltas e ignorar a imensa amplidão da transitoriedade fugidia ? Cabe desmentir a necessidade do imenso e a aspiração do infinito?


ENTRELINHAS DA PERDIÇÃO
Farfalha o sargaço no remanso desse mar extinto, despido de surpresas. Perde-se o sal nos lábios ingênuos que recolhem o sabor da morte triturada ― pacientemente ― como uma esperança. Para a folha verde em que deslizo – orvalho – despejando-me – crosta gélida – na teia despetalada da madrugada, o sol é uma possibilidade.


MEU CORPO
Meu corpo é essa areia – rarefeita – que parte do deserto e impregna as pétalas. É um grifo nas dunas que se desfaz em Mundo, a velhice de um tempo desabençoado pelo silêncio. Meu corpo é a textura vulgar de um remendo da insensatez, é pressentimento de moeda que dissolve o pecado. Meu corpo é bojo de névoa ruminada no pasto, é a universalidade de um nada carente de sentido. Exilado na descrença jaz no giral de ofertas de um supermercado.


PARA APAZIGUAR AS BORBOLETAS
Para WJ Solha A sombra é neutra, desandado o escuro, e, se não há certezas, há o adeus da emoção que dura ao saber-se nulo o testemunho erguido de um deus. E se silente a cama – à procura da insignificância hirta – desperta – oferecer leito e cocho à loucura, dizer-se talvez louco, mas alerta. O chão é leito tosco, mas correto a todo ser avesso à esperança, aquele que titubeia e tropeça na pedra desolada e temida, que rola o descaminho, sem inércia. Salvam-lhe a vida, as asas de poeta.


SUBVERSIVO
Régua lisa e desdentada, regra viva e libertina. Mera pausa? Mesa farta? Rega a seca vespertina. Mal calçada, descoberta, virulenta e cabotina, contamina o poeta, a emaranhada rima. Guerra justa, proveitosa, terra fraca, saturada, passa faca, beija a amada, desconserta a rotina. Pois caminho de poeta passa pela velha rima.


SEXO SEM ANJOS
Retirei do teu berço o camafeu com um anjo e desarrumei a tua cama desarranjei a tua vida te despindo de deus Enveredei na noite pois as sombras inocentes dos teus pequenos dedos teciam figuras bizarras nesse ideal de infância Desatinei na lida ao julgar-te segura Foi escolha errada A cinderela atenta disse boa noite nas núpcias do álcool com o sangue da tua carne E a multidão aflita dos jovens sem sossego se embrenhou entre nós mostrando os peitos hirtos as coxas os dedos a urgência dos sexos para te impor um rótulo para te fazer escrava Desconhecida percorria o nada um nada além do vazio dos teus olhos miúdos Já não mais sustinha o ser uno e transtornado essa pasta quântica dos cravos de Jesus Já se ignorava a verdade das açucenas pensas no abismo Desdisse minhas crenças e interpretei o oráculo desse Mundo seco que cruzou faminto com a tua beleza


SAUDÁVEL
Humores, farrapos, cachaça. Rumores, gargalos, cabaços. Batuques, bagulhos, Carcaça. E eu debruçado no ocaso.

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