No final do século XVIII, no período inicial do romantismo alemão, conhecido como “Tempestade e Ímpeto”, o poeta, filósofo, médico e historiador Johann Christoph Friedrich von Schiller (1759 – 1805) revitalizou o renascimento das ideias da Antiguidade grega e romana, que buscavam a junção da beleza estética com os valores morais do comportamento humano. Schiller buscava redescobrir um ideal de unidade, perfeição, totalidade e completude, que sentia ter sido perdido ao longo dos séculos. Para desenvolver novos conceitos e romper com as formas tradicionais dos gêneros literários, ele defendeu a tese de que para cada época existe um gênero literário próprio, e que os poetas seriam os seus guardiões. O fundamento dessa argumentação está em sua obra Poesia Ingênua e Sentimental, publicada em 1795.
O livro Poesia Ingênua e Sentimental expõe dois argumentos: o primeiro propõe uma nova abordagem sobre os gêneros literários; o segundo, sinaliza o término da arte. A obra se apoia na dualidade entre natureza e cultura, que se reflete também na dicotomia entre o antigo e o moderno. Schiller defende que os poetas devem transcender essa oposição, buscando uma condição ideal que permita recuperar a unidade que se perdeu. Ele afirma que: "Uma vez que o ideal é um infinito inatingível, o homem culto nunca poderá atingir a perfeição em sua espécie" (SCHILLER, F. Poesia Ingênua e Sentimental, tradução de Márcio Suzuki, p. 61). Esse processo deve ser iniciado por meio de uma educação estética.
O início da obra versa sobre duas premissas:
🍃 A primeira está relacionada à natureza em si. Ela trata do interesse do homem culto pela natureza, que é despertado através das paisagens, vegetação, fauna, crianças, habitantes do campo ou antigos monumentos;
🍃 A segunda ao ingênuo. Ela se refere à natureza que aparece ingênua quando comparada à arte, o que evidencia sua superioridade. Isso significa que a arte, de maneira geral, sempre revela a técnica empregada na criação da obra; noutro aspecto, a arte ingênua parece não ter sido moldada pela habilidade do artista, como se tivesse surgido diretamente da própria natureza ou do ambiente natural.
De acordo com Schiller, a experiência que se tem em relação à natureza remete o homem moderno ao estado em que estava inserido. “Um estado de harmonia e paz consigo mesmo e com o mundo exterior” (Ibidem, p. 44). Portanto, deve-se entendê-la como um caminho de retorno ao estado de pureza original. Afirma o pensador:
“A expressão de nossa infância perdida, que para sempre permanece naquilo que nos é mais precioso, enchem-nos de uma melancolia. Ao mesmo tempo, são expressões de nossa suprema completude no Ideal, transportando-nos a uma sublime comoção” (Ibidem, p. 44). Há duas interpretações relacionadas a esse conceito: o Ideal como uma ideia inatingível, uma meta imposta pela razão; e como um modelo representativo para os modernos em relação à arte grega.
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O pensamento de Schiller revela que o homem natural enfrenta limitações, mas é recompensado pela plenitude de sua condição. O homem de cultura é ilimitado e guiado pela nostalgia. Schiller faz uma distinção entre duas formas de nostalgia, cada uma gerando diferentes tipos de homens modernos. Ele declara: “Enquanto meros filhos da natureza fomos felizes e perfeitos; tornamo-nos livres, e perdemos as duas coisas. Surge daí uma dupla nostalgia, e bastante desigual, em relação à natureza: uma nostalgia de sua felicidade e uma nostalgia de sua perfeição. Apenas o sensível só lamenta a perda da primeira; o homem moral pode entristecer-se pela perda da segunda” (SCHILLER, F. Poesia Ingênua e Sentimental, tradução de Márcio Suzuki, p.18).Para concluir, apresento a espontaneidade do poema “Bar das Galegas” escrito pelo professor, poeta e crítico literário Hildeberto Barbosa Filho:
Ainda bem que comprei aquela gaiola.
Ainda bem que certas coisas não têm preço.
Não se vende paz no mercado,
não há no mercado afeto, amor exposto à granel.
O mel custa 30 reais.
Não é o mel da vida,
muito menos o mel que perdi nos teus lábios.
O mercado só abriga homens solitários.
Homens infelizes como os insetos que Deus criou e esqueceu.
Homens que viajam sem sair de si mesmos.
Homens que se habitam e se desconhecem.