Nesta véspera de aniversário da cidade, palmas primeiro para o fotógrafo Leonardo Ariel ao flagrar dois jovens restauradores em passarada com os pelicanos do Cruzeiro num banho de restauração e simbolismo que pela primeira vez me surpreende nestes 73 anos de vida pessoense. A foto, um flagrante antológico tanto pela surpresa da arte quanto pelo significado, saiu publicada na 1ª página da nossa A União da última sexta-feira (2).
Não é de graça que os franciscanos tenham elegido o pelicano, pássaro que pouco tem a ver com os nossos lagos e encostas, para ornar o pedestal do Cruzeiro. Há no pelicano uma mensagem simbólica de conteúdo religioso ou no âmbito do barroco europeu cujo significado não me vem à memória, certamente colhida em livro de Clarival do Prado Valadares ou no de Glauce Burity. A foto une restauradores e restaurados, o novo e o velho, numa mesma idade, numa mesma festa, numa mesma revoada pousada para representar um momento de valorização dos bens monumentais e sagrados da cidade.
Tocou-me outra foto do mesmo jornal, esta de Kleide Teixeira, ilustrando o mapeamento das casas em ruínas do Centro Histórico. É uma parceria do Estado (Corpo de Bombeiros), da Prefeitura (Compdec-JP) e do Crea-Pb. E onde seus funcionários são flagrados? Em torno de uma das ruínas que mais me incomodam, as da casinha de esquina da Praça do Carmo com a rua lateral da Academia Paraibana de Letras. Tem tudo para ser uma casa construída bem antes da revolução urbana do sobrado, modelo tão bem estudado e pesquisado pelo escritor ainda jovem Juarez Batista. É toda sentada na pedra, no calcário, a caliça garantindo seus dois séculos de construída, no mínimo. O tijolo veio entrar para vedar portas e janelas, não mais tijolo de barro batido, mas o de furos, moderno. Faz fundos com a Academia de Letras e como vem abandonada há quase meio século cogitamos, desde a gestão de Joacil de Brito Pereira de convertê-la no memorial que a Paraíba deve a Augusto dos Anjos. Já foi desapropriada umas duas vezes sem que se chegue a nenhum resultado. Resistindo assim ao tempo, ao desamparo e a todos os invernos não sei como ainda não inspirou o Crea, a construção civil e a Universidade, para fazer dela uma mostra da taipa dos anos 1800.
Apesar das dificuldades de se manter, a Academia daria ao país, com a montagem de um memorial à altura do prestígio universal do seu poeta maior, Augusto dos Anjos, a resposta justa e mesmo orgulhosa àquela pergunta feita há um século a Zé Lins por Gilberto Freire quando se viram diante da grande estátua erguida a Álvaro Machado pelo irmão também presidente:
“E por Augusto o que vocês fizeram?”.
Luiz Augusto Crispim e Joacil de Brito tentaram responder com a ocupação de uma sala da APL, logo depois ampliada, como memorial da instituição ao patrono de sua cadeira número 1. Abriga o acervo possível de fotografias, de edições do EU e da crítica literária, coroados pelo painel a ele dedicado por Flávio Tavares. Mas, na verdade, Leopoldina fez muito mais com sua Casa de Augusto dos Anjos, fruto de uma convivência de apenas seis ou sete meses com o gênio maior da Paraíba.