Por alguma razão, lembra de um texto que escreveu, uns tempos atrás, sobre suicídio de escritores. Dentre eles, Ernest Hemingway. Tiro ...

A maldição continuou

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Por alguma razão, lembra de um texto que escreveu, uns tempos atrás, sobre suicídio de escritores. Dentre eles, Ernest Hemingway. Tiro de espingarda na cabeça. Tinha saído de uma clínica de reabilitação. Mas, havia uma maldição em sua família. Anos antes, seu pai, Clarence, se suicidou, com um tiro de revólver. Seus irmãos Úrsula e Leicester também tiraram a própria vida. A maldição continuou. Décadas depois, sua neta, a atriz Margaux, morreu com uma overdose de soníferos. Parecia um carma de família. E, ao final, os sinos dobraram por quase toda a família.

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Paramount Pictures
Outro suicídio que registrou, com certa amargura, foi o da escritora Virginia Woolf. Gostava de sua literatura. Foi um tempo em que havia lido “Orlando”. E saber que ela premeditou tudo, enfiando pedras em suas roupas para afundar no rio, foi devastador, imaginando uma morte lenta. Diferente de quem se dá um tiro e tem morte imediata. Morrer afogado, naquelas circunstâncias, talvez lentamente. Podia imaginar se, em algum momento, ela teria, mesmo com toda depressão, se arrependido. E já era tarde.

Ah, agora lembra. Decidiu escrever sobre o suicídio de escritores, após a recente morte de David Foster Wallace, jovem ainda nos seus 46 anos, e, de alguma forma, experimentando a fama, com seu livro “Graça infinita”. E lembra ter se indagado: como um escritor que escreveu um livro com mais de mil páginas, experimentando todos os sofrimentos decorrentes desse parto, decide se matar enforcado só depois, quando estava, na verdade, sufocado pela fama, respirando apenas depressão.

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Amy T. Zielinski
Mas, como dizia a também suicida escritora Sylvia Plath, “morrer é uma arte, como tudo o mais”. Talvez de todos, Plath foi a que “melhor”, se é que se pode dizer assim, programou a sua morte. Ela acomodou os filhos pequenos no quarto, deixou leite e pão ao lado. Abriu a janela para ventilar e fechou a porta do cômodo. Então, foi até a cozinha, pôs a cabeça dentro do forno, abriu a mangueira do gás e… esperou pela morte, que veio algum tempo depois. Bem assim.

Então, de alguma forma, desperta, indagando: por que esse assunto de suicídio? Volta-se para o seu cotidiano de solitário, mas livre para consumir. Agora, independentemente das ações escolhidas, a sua desventura parece ser um mergulho abissal não apenas nas circunstâncias externas, mas também em sua própria psique. Lidar com a dualidade entre o extraordinário e o comum pode ser crucial para seu entendimento da insana profundeza do ser.

* Excerto do livro de Hélder Moura, 'A insana lucidez do ser', publicado recentemente (Editora Ideia), disponível na 👉🏽 Livraria do Luiz.

"Vasculhando as profundezas da alma, mergulhando em segredos abissais, Helder constrói um texto denso, rico, profundo, que estimula a reflexão e o debate sobre questões profundas e controversas. Pelas frestas de sua estética genial dois problemas graves se insinuam: o suicídio e a pedofilia, fazendo com que o livro ganhe dimensões de provocação , confrontando o leitor com realidades perturbadoras, muitas vezes negligenciadas. (Nevita Franca)"


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