Nome próprio de pessoa tem plural? As gramáticas que tratam do assunto recomendam que se pluralize normalmente o nome de pessoa, mesmo o de família. Rocha Lima, em sua Gramática Normativa, depois de anunciar a regra, cita, entre outros exemplos, o título do romance Os Maias, de Eça de Queiroz, como prova de que nome de família também tem plural.
Ocorre, no entanto, que a prática entre usuários conceituados da língua tem demonstrado que a regra não é tão simples assim. Se se pluralizam os nomes de batismo (isto é, os prenomes), os de família oferecem na fala certa resistência à pluralização, sobretudo os nomes estrangeiros. Gramaticalmente, parece que existe uma regra dupla: os nomes de família da mesma genealogia não iriam para o plural; as famílias homônimas, de raízes ou linhagens distintas, teriam seus nomes pluralizados. Assim, os Oliveira, sem flexão de plural, designariam todos os membros da mesma estirpe. Os Oliveiras, com flexão, por outro lado, designariam as famílias que tivessem o mesmo nome, mas não tivessem nenhum parentesco entre si.
Um livro que é um imenso corpus para esse tipo de pesquisa é Como você se chama? – Estudo sociopsicológico dos prenomes e cognomes brasileiros (Rio de Janeiro: Documentário, 1974), de autoria de R. Magalhães Jr., não só por tratar exclusivamente de nomes de pessoas, pluralizados ou não, mas também por citar textualmente trechos de outros autores que abordaram o mesmo tema ou forneceram matéria de análise para o Autor, como Carlos Drummond de Andrade e Pedro Nava, por exemplo.
Assim, na p. 36, Magalhães Jr. fala nos Belém, nos Potengi; na p. 54, nos Cavalcanti, nos Wanderley, nos de Holanda; na p. 61, nos Amoretti, nos Barandier, nos Bardy, nos Chambelland; na p. 62, nos Gudin, nos Supplicy, nos Gouthier, nos Frontin; na p. 105, nos Jurema, nos Bocaiúva, nos Timbaúba; na p. 114, nos Portugal, nos Holanda; na p. 115-6, nos Potiguara; na p. 117, citando Oliveira Lima, nos Oiticica, nos Sucupira, nos Ge Acaiaba de Montezuma.
Se a referência é a mais de uma família, ocorre a pluralização: os Cordeiros, os Cabritos, os Bezerras (p. 139); os Leões, os Falcões (p.140); os Aranhas (p. 149); os Paccas (p. 150). Uma nuance nessa regra: na p. 148, Magalhães Jr. fala nos Barata (sem s), ao referir-se à família; e nos Baratas (com s), ao referir-se a cada membro da família a projetar-se social ou profissionalmente. Às vezes, contudo, mas raramente, ocorre um singular entre plurais na mesma linha: os Bezerras e os Bezerril (p. 139); os Pombos, os Pombal (p. 147); ou o mesmo nome ora pluralizado, ora invariável: os Pintos, os Pinto (p. 144); os Camelo, os Camellos (p. 150). Mas é bem possível que se trate de cochilo do Autor ou da revisão, já que, nos outros casos, existe coerência na pluralização.
Os prenomes, contudo, são invariavelmente pluralizados: Paulos, Franciscos, Beneditos (p. 58), Estelas, Virgínias (p. 76, rodapé), Marcelos, Cláudias, Sofias, Vitórias, Elizabeths, Omares (p. 97), Simones, Cristianos (p.98). Até mesmo os prenomes duplos se pluralizam: Isabéis Cristinas (p. 97). E acrescento: “Quantos Ruis Barbosas e Jorges Amados teremos ainda?”
Parece-me que é hora de os estudiosos examinarem com mais cuidado esse capítulo das nossas gramáticas. É possível que Magalhães Jr., um bom usuário da língua, como Rachel de Queiroz ou Oliveira Lima, citados pelo Autor, tenha mostrado, intuitivamente, uma deriva de nossa língua, um sentido na sua evolução brasileira. Apesar de Eça de Queiroz. Aliás, em sua Moderna Gramática Portuguesa (Rio de Janeiro: Lucerna, 1999, p. 125), Evanildo Bechara admite o uso do singular em nomes próprios determinados por artigo plural: “Os Correia de Sá”.