Passeando entre o mar e a colina verde de José Américo de Almeida, entre eles, encontro o senhor tempo decorrido e os bons frutos construídos entre os dois encantos. E assim, poucos metros separam as preciosidades, intercalados pela moradia do ilustre escritor.
O que me remete a este texto é a crônica 'Entre o mar e a colina verde', escrita em 1957 e que integra o livro 'Eu e Eles' (1970). À medida que me debruçava sobre a aprazível leitura, senti-me como que bem acompanhada por José Américo, naquele 'tour', de tão real que parecia.
Celyn Kang
'Soquei-me neste recanto por ser terra paraibana que, além de sua beleza, tem caráter. Nada há que se assemelhe à sua configuração de um pitoresco que não cansa. Aqui não há nada feito; não há padrão. E essa desordem se torna mais sedutora por sua variedade. Não se imagina o que é isto. Um retalho de mata e o grande mar. O pano de fundo e a perspectiva atlântica formando o quadro'.
'Arquiteto', sem estudo e sem diploma, José Américo projetou sua casa pensando em todos os detalhes, estrategicamente, para desfrutar do conforto e da paisagem que seu olhar proporcionaria:
Não é preciso erguer a cabeça para contemplar o céu debruçando sobre as águas ou colado à colina que me rodeia com seu hálito. Tenho no meu gabinete duas varandas, uma para cada lado, alternando a visão dessas paisagens, para não me entediar. Às vezes o mar e a mata se combinam, revestindo-se do mesmo verde. O oceano mais volúvel, ostenta, em certas horas, um colorido fabuloso, aqui verde e ali azul.
O jardim é um dos destaques, enaltecidos pelo nobre escritor. Diz que quando colhe uma flor sente que nasceu de suas mãos, que cercou-se de plantas, com vegetação de vários matizes, para ter a impressão que é 'bicho do mato'. E deleitando-se desse convívio, revela: 'Respiro, além de lodo e sargaço, esse oxigênio'. Refere-se ao seu pomar como se fôra um altar. 'Quero-lhe tanto bem, como a alguém que tivesse criado, somente porque plantei e vi crescer'. Gosta de passear entre as árvores, consideradas tão íntimas e sua segunda família, porque ao tocar em seus galhos, os passarinhos cantam para ele.
Casa de José Américo de Almeida (Praia do Cabo branco-PB)
Acervo da autora
Como bom amante da natureza, já amanhece fazendo uma volta matinal para o banho de sol, que, segundo ele, é bom para coração de velho. 'Tenho esse sol a nascer, rico de novidades, sentado nas ondas, como uma bóia de ouro. Só a noite dá sensação de isolamento. Custa a passar. Mas não faz mal, durmo cedo, o que dá a glória de madrugar. A lua cheia também dá um mergulho e aparece mais branca, lavada nas purezas das ondas'.
Acervo da autora
No decorrer do texto, José Américo solta algumas pérolas, vividas e sentidas no seu recanto, que vale a pena transcrever:
🍃 O relógio não manda em mim; todo o tempo me pertence. Tomo o dia todo lendo, nunca li tanto; não paro de ler.
🍃 Sinto volver a paz. A paz universal reside aqui. O próprio vento, para tornar-se mais amável, mudou de sexo. É brisa, o que há de mais carinhoso na natureza livre, desimpedida e viajada, a afagar como uma pluma macia e delicada.
🍃 Fiquei no meu sossego, fora do turbilhão, disposto a dar as costas a todas as grandezas. Pensei comigo e disse: Basta.
🍃 Meu grande defeito é ser um homem de paixões. Apaixonado, cresço dois palmos. Não mudei e é isso que me preocupa. Envelhecer com o mesmo espírito é meu drama.
Fátima Farias / Busto de J. Américo
Acervo da aurora
Acervo da aurora