A publicação "Raízes do Brasil" (1936) pelo historiador, sociólogo, e escritor de São Paulo, Sérgio Buarque de Holanda (1902 – 1982), introduz o conceito do "homem cordial", que se tornou fundamental para a compreensão do país. O livro analisa a história do Brasil, de sua população e de suas estruturas, como a influente família patriarcal que surgiu durante a era colonial. Organizado em sete capítulos, a obra versa temas como "Fronteiras da Europa", "Trabalho e Aventura", "Herança Cultural", "O semeador e o Ladrilhador", "O Homem Cordial", "Novos Tempos" e "Nossa Revolução". A palavra "cordial" aqui não se restringe apenas a boas maneiras e gentileza.
Sérgio Buarque enfatiza na definição de "homem cordial" a ambiguidade do caráter do povo brasileiro. Ele afirma:
“Ela pode iludir na aparência – e isso se explica pelo fato de a atitude polida consistir precisamente em uma espécie de mímica deliberada de manifestações que são espontâneas no 'homem cordial': é a forma natural e viva que se converteu em fórmula. Além disso, a polidez é, de algum modo, organização da defesa ante a sociedade. Detém-se na parte exterior, epidérmica, do indivíduo, podendo mesmo servir, quando necessário, de peça de resistência. Equivale a um disfarce que permitirá a cada qual preservar inatas suas sensibilidades e suas emoções” (HOLANDA, 1995, p. 147).
“Vende-se uma linda e vistosa negrinha de 14 anos, sem moléstia de qualidade alguma” (3 de janeiro de 1870). “Vende-se um lindo moleque de 14 anos, copeiro e muito sadio” (4 de janeiro de 1870). “Aluga-se um moleque de 11 anos” (21 de setembro de 1872). “Vendem-se duas negrinhas, de 14 a 15 anos” (12 de maio de 1873). “Aluga-se uma pardinha de 15 anos, para portas a dentro, e uma negrinha de 9 anos, muito esperta, para andar com crianças” (29 de janeiro de 1874). “Vende-se um lindo moleque de 10 anos, muito vivo e inteligente” (18 de janeiro de 1870). “Vende-se uma bonita crioulinha de 8 anos de idade, própria para presente”. “Chega. Chega. Chega”. (5 de janeiro de 1870).
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A ideia do "homem cordial" dissemina a crença de que quanto menos uma pessoa depende dos outros, maior é seu valor. Isso resulta na ausência de bem-estar na sociedade. A permanência da maldade presente na falsa cordialidade é evidente na adoração à personalidade, na exploração da mão de obra, na discriminação, no acúmulo de riquezas, na ganância do poder econômico contra o bem coletivo, revelando-se também em práticas religiosas alienadas. Isso dá ao "homem cordial" uma sensação de ser superior a todos e acima das leis.