Itamar Franco à frente de um governo supostamente fraco, dadas as circunstâncias em que chegou ao poder. Mas havia um sincero desejo de conter e se possível extinguir a desenfreada inflação. Uma meta acima dos partidos e das ideologias. E dos interesses eleitorais do curto prazo. Meta digna de estadistas, aqueles poucos capazes de pensar o bem do país e do povo para além das conveniências pessoais. Foi o caso.
Após a frustrada passagem de alguns ilustres à frente do Ministério da Fazenda, o presidente teve a feliz inspiração de convidar seu então ministro das Relações Exteriores para assumir o temido cargo – e seus riscos. Mais um insucesso e iria ao chão qualquer pretensão política do responsável, sem falar no evidente prejuízo biográfico. Uma cartada perigosa e ao mesmo tempo um desafio para o convidado. Felizmente venceu o destemor e foram imediatamente postas mãos à obra.
Uma equipe de ouro foi formada por economistas de escol. Um plano foi aos poucos criado, com uma audácia e uma inventividade talvez nunca vistas em nossa história republicana. O presidente, que não era das ciências econômicas mas da realista e prudente política mineira, comprou as ideias que lhe apresentaram, confiou nos auxiliares e mandou ir em frente. A sensibilidade do juiz-forano falou mais alto, para o bem do país. O político provinciano até então subestimado foi se transformando em verdadeiro homem de Estado, com visão de longo alcance típica dos grandes líderes. As Minas Gerais que já tinham dado Juscelino e que dariam Tancredo, oferecia ao Brasil naquele instante de mar revolto a mão firme – e visionária - de que se precisava.
No Congresso Nacional, uma vez apresentado o Plano, uma minoria antirrepublicana, oportunista e gastadeira colocou, como sempre, seus mesquinhos interesses de curto prazo acima do bem coletivo. Os nomes desses tais estão registrados pela história – e não há quem os apague. Os diversos livros e depoimentos sobre estes trinta anos comemorativos estão aí à disposição dos mais jovens e dos que têm memória curta. A mentalidade dessa minoria era ser do contra apenas para ser do contra. E por aí se vê o nenhum compromisso para com os mais altos interesses do país.
O Plano entrou em vigor, o povo maciçamente aderiu e o resto é história. A economia brasileira se estabilizou, a moeda adquiriu valor, a população se tranquilizou, o país se fez respeitar perante o mundo, dando aos outros povos uma lição de competência ainda hoje citada e estudada, para orgulho da raça tupininquim.
Deve-se lembrar que a muitos o Brasil deve o sucesso do Plano Real. Primeiro, ao ex-presidente Itamar Franco, nome pouco lembrado – ou não suficientemente lembrado, a despeito de ter sido a base de tudo, sem a qual nada teria acontecido; segundo, a Fernando Henrique Cardoso, goste-se dele ou não, pois foi quem arregimentou a equipe de ouro criadora do Plano e lhe apoiou em todos os momentos; terceiro, ao seleto grupo de economistas que elaborou o Plano e o implementou, ajustando-o gradativamente às necessidades conjunturais, de modo a viabilizá-lo; quarto, ao ex-ministro Rubens Ricupero, que, assumindo o ministério da Fazenda no momento crucial do lançamento do Plano, deu-lhe sustentação e continuidade, garantindo seu êxito; e quinto, ao povo brasileiro em sua totalidade, que, absorvendo surpreendentemente a aparente complexidade do Plano, conferiu-lhe efetividade e, mais que isso, legitimidade, tornando-o irreversível, como o são as genuínas conquistas nacionais.
Que não prosperem, pois, os que insistem em defender a esdrúxula ideia de que “um pouco de inflação faz bem”, apenas para justificar o desequilíbrio fiscal decorrente da irresponsabilidade de se gastar mais do que se arrecada. As heroicas donas de casa que vão à feira semanalmente sabem que não é bem assim. Nenhuma inflação faz bem, principalmente aos mais pobres.
Que se comemorem efusivamente estes 30 anos de estabilidade econômica, acima dos homens, dos partidos e das ideologias. Nossos sofredores irmãos argentinos estão aí ao lado para nos lembrar os nefastos efeitos da hiperinflação e da demagogia eleitoreira.
Com o Plano Real e sua estabilidade, o povo brasileiro ficou em condições de se livrar de eventuais “salvadores”, podendo salvar-se a si mesmo. O controle da inflação tornou-se uma conquista de que a população não abre mão. E enganados estarão os que ousarem pensar em contrário.