Temos sido partidários rígidos do cartesianismo na medicina moderna. Tratamos a mente como se esta somente reagisse às doenças do organismo, sem apresentar qualquer ligação com essas doenças. Embora a ciência médica tenha produtivamente dado enfoque à fisiopatologia das doenças, como a biologia tumoral, a doença arterial coronariana e a imunologia, ela o fez às custas do estudo das reações psicofisiológicas do organismo a esses processos patogênicos. Essas reações são mediadas por mecanismos cerebrais e corporais, incluindo os sistemas endócrino, neuroimune e nervoso autônomo.
Embora uma grande proporção da variância relativa à evolução de qualquer doença seja atribuída à fisiopatologia local específica daquela doença, parte dessa variabilidade também pode ser explicada pelos fatores relacionados à resistência do hospedeiro, entre eles a maneira com a qual o organismo responde ao estresse da doença. Por exemplo, em uma série de experimentos clássicos em animais, Riley mostrou que a aglomeração acelerava a velocidade de crescimento tumoral e a mortalidade.
Em uma recente revisão oficial da literatura sobre o estresse humano, McEwen documentou os efeitos adversos dos fatores estressantes cumulativos na saúde e a incapacidade do organismo de adaptar a resposta ao estresse a esses fatores. A ativação do eixo hipotalâmico hipófise supra renal (HHSR) é uma resposta adaptativa ao estresse agudo mas, com o tempo, em resposta ao estresse cumulativo, este “sistema de alarme” pode sofrer degradação. Por isso, fica parcialmente “ligado” o tempo todo, levando a consequências fisiológicas adversas, entre elas alterações do metabolismo da glicose, lesão do hipocampo e depressão.
Mostrou-se que as alterações da função hipotalâmica, incluindo a hipersensibilidade dos receptores de glicocorticoides, também estão associadas ao distúrbio de estresse pós-traumático. Assim, os eventos emocionais adversos, que variam de fatores estressantes traumáticos a pequenos eventos cumulativos, podem desregular o eixo hipotalâmico hipófise supra renal(HHSR). Os glicocorticoides são potencialmente imunossupressores, de modo que, entre os efeitos do estresse agudo e crônico e da hipercortisolemia pode estar também a imunossupressão funcional, como foi mostrado extensivamente em animais e sobre a qual existe um número cada vez maior de evidências em seres humanos.
Por outro lado, o ambiente social pode ter um efeito atenuador no estresse. O mesmo fator estressante que, quando fornecido a um animal sozinho aumenta os níveis plasmáticos de cortisol em 50%, não causa qualquer aumento quando o animal está cercado de companheiros de família. A adaptação social está associada a muito menos danos ao sistema nervoso autônomo do que o isolamento social. Realmente, a conexão social possui profundas consequências para a saúde. Estar bem integrado socialmente reduz em duas vezes a mortalidade ajustada, semelhante ao que ocorre quando as pessoas possuem níveis de colesterol alto versus baixo ou ser um não fumante.
Ademais, a natureza da posição de determinada pessoa dentro da hierarquia social possui consequências para a saúde, incluindo status relativamente maior dentro da mesma classe social. As pessoas são estatisticamente mais propensas a morrer em situações como aniversário recheado de emoções e de feriados festivos importantes.
Portanto, a presença de eventos emocionais adversos, como situações de estresse traumáticos, parece possuir potencial negativo para a saúde, enquanto as boas relações sociais parecem estar associadas a desfechos positivos de saúde. Os resultados de um recente ensaio randomizado de pacientes que, após apresentarem infarto do miocárdio, participaram de um programa que incluiu terapia de grupo, técnicas de controle do estresse e dieta vegetariana, mostraram reversão em longo prazo da oclusão coronariana. Do mesmo modo, três de seis ensaios randomizados publicados forneceram provas de que o suporte psicossocial está associado a maior sobrevida nos pacientes com câncer de mama, melanoma maligno e linfoma. Os pacientes com psoríase, expostos a fitas de treinamento de controle da mente, durante o tratamento mostraram cura mais rápida das lesões do que os não expostos. Um dos componentes das intervenções eficazes é lidar diretamente com o sofrimento emocional associado ao medo da progressão da doença.
Deixamos transparecer para o epílogo dessas linhas, as evidências de que os portadores de doenças cardiovasculares são mais sensíveis, e sofrem muito mais com os impactos do estresse e das emoções dentro de um contexto universal fisiopatológico.