Há momentos inesquecíveis em nossas vidas. Um deles aconteceu no dia 28 de março de 2002, às 23h40, quando fiquei frente a frente com Chico Xavier, em sua residência, onde tive um privilégio extra de ali me hospedar, com a amiga Lisle Lucena. Ela já desfrutava da amizade de Chico, há vários anos, e me convidou. Já ouvira falar da energia emanada por aquele ser de luz, mas a sensação sentida, ao vivo, é indescritível, tipo uma transfusão energética. Foi exatamente Lisle quem me proporcionou este presente especial.
Considerado um dos maiores líderes espirituais do mundo, no século 20, e mensageiro do plano espiritual, era respeitado independentemente de religião. Na Copa, onde passava grande parte do dia, e no seu quarto, simples como ele mesmo, esculturas e imagens de Nossa Senhora. Do micro system ecoavam músicas eruditas e de Roberto Carlos, da fase romântica, além de Ave-Marias, Nossa Senhora e outras do gênero. Como hóspede, percebi que a boa energia do ambiente, simples, mas aconchegante, era saudada logo cedo da manhã pelo canto dos bem-te-vis.
Reconhecido como o 'mensageiro da paz e do amor', o mérito estava em ser o próprio exemplo de não apenas pregar, mas viver a mensagem cristã. Vivia num ambiente simples e não se envaidecida diante de sua dimensão pessoal.
Estadia iluminada
Desembarquei em Uberaba, numa quinta-feira santa, acompanhada por mais quatro amigos: o casal Severino Celestino e Graça Crispim, além de Bob Vagner e Iliseu Garcia, que seguiram para o hotel, mas nos reencontramos diariamente em torno de Chico, durante toda a Semana Santa.
Bem recebidos e acolhidos por seu filho Eurípedes Higino, cumprimos uma agenda diária intensa, conhecendo tudo nos mínimos detalhes, inclusive a sua obra social de distribuição de cestas básicas aos carentes. Mas, incomparável mesmo foi a noite do Sábado de Aleluia. Eram exatamente 19h40, quando Chico Xavier chegou ao Grupo Espírita da Prece.
Com dificuldades para andar e falar, sempre amparado por alguém, mas com muita lucidez, foi recepcionado por uma multidão que o aguardava, dentro e fora do recinto. Gritos, aplausos, tumultos, emoção. Todos queriam tocá-lo ou, pelo menos vê-lo de um melhor ângulo. Muitos haviam chegado por volta de meio-dia, para conseguir um lugar privilegiado na fila. Os portões de acessos abriam às 16h. O gesto era repetido há décadas, aos sábados, mas aquele dia era especial, porque precedia a terça-feira (2 de abril), quando completaria 92 anos.
O último aniversário
A imprensa, principalmente as TV's, geravam matérias e buscavam pessoas que viajaram milhares de quilômetros, exclusivamente para isso e darem suas impressões. Gente de vários recantos do Brasil, conforme indicavam as placas de ônibus e hotéis lotados. Depois da receptividade do público, Chico entrou na sala do culto do evangelho e ocupou seu lugar na cabeceira da mesa. O culto iniciou com uma prece, seguida da leitura do Evangelho e o comentário da senhora Marilene Paranhos, oradora da casa há vinte e cinco anos.
Ela ilustrou sua palestra destacando a importância de Deus em nossas vidas e dos exemplos de humildade e amor de Cristo e Chico Xavier, respectivamente. 'Com todo respeito a outros missionários, mas não se tem notícias de uma pessoa que haja dedicado mais de 75 anos de sua vida ao trabalho de amor ao próximo. Chico Xavier é um missionário de luz, conforto, amor e alegria', destacou.
Questionado pela imprensa sobre um presente que gostaria de receber, Chico respondeu: 'a paz de Deus para o mundo"
Transfusão energética
Concluído esse trabalho, com uma prece final, formou-se a fila para os cumprimentos a Chico Xavier. Expectativa, emoção, alegria, eram sentimentos expressos nas fisionomias das pessoas. Incansável, ele recebeu até o último da fila, com a mesma disponibilidade, atenção, carinho e alegria. Foi beijado e beijou a mão de cada um. Após este gesto muita gente chorava.
Detalhe: quando estendi minha mão, ele a puxou e beijou primeiro. Isso, pela segunda vez, porque em sua casa tive a oportunidade de me sentar ao seu lado, peguei sua mão, mas quando me dei conta, ele que segurava a minha. Nossa! Naquele gesto, parecia que eu estava recebendo uma transfusão energética, de tão especial que era a sensação de bem-estar. Mas, continuando, naquela noite, após os cumprimentos, cada um recebia uma fatia do bolo do aniversário, com refrigerante. Quando deixou o Grupo Espírita da Prece, mais aclamação do público, num momento em que uma bela lua cheia, no horizonte, completava a homenagem, parecendo também saudá-lo.
Impressões
Bastante dócil, exalava um carisma constante, tinha uma receptividade especial e um gesto de carinho para com as pessoas que dele se aproximavam. Seu olhar singular e marcante refletia bem a energia que transbordava de sua alma.
Confesso que sinto dificuldades em resumir a quantidade de fatos que já ouvi sobre Chico. Preciso selecionar. A ex-deputada Iraê Lucena encontrou, em Chico Xavier, o alento para superar a dor, pela perda de seu filho criança, que faleceu afogado numa piscina, e deixou a família despedaçada. Ela começou a reagir e normalizar a vida, após o recebimento de uma psicografia, por intermédio do médium (Leia sobre o fato 👉🏽 aqui) .
Já sua irmã, minha amiga Lisle Lucena (ambas filhas do senador Humberto Lucena), me enviou o seguinte depoimento:
Chico surgiu como uma benção em minha vida! Conviver com ele por dezesseis anos, indo a Uberaba com uma frequência de três em três meses e tendo a oportunidade de me hospedar na casa dele, durante as minhas idas, foi realmente um presente divino, pois o que aprendi com o Chico foram lições maravilhosas que estarão para sempre guardadas em minha memória e no meu coração! Aprendi principalmente o quanto é importante o perdão e a paciência em nossas vidas!
Eis uma interessante curiosidade: bastante sensível e carinhoso com os seres vivos em geral, Maria Higino Miranda, que trabalhou vários anos com ele, revelou que ele não permitia a dedetização da casa, para não matar os insetos. Outra peculiaridade, relatada por Maria, é que Chico era tão atencioso com as pessoas que o rodeavam que ele mesmo confeccionava, artesanalmente, os cartões de saudação que enviava, por ocasião de datas especiais. Uma espécie de hobby que ele cultivava. Estrela cadente
E assim já se passaram quase vinte e dois anos, pois três meses depois, de nossas visitas, precisamente na noite do dia 30 de junho de 2022, ele partiu de mansinho da vida terrestre, após uma parada cardíaca, logo após saber que o país estava em festa, e que a seleção brasileira de futebol havia conquistado o pentacampeonato da Copa do Mundo. Chegou a ser eleito o maior mineiro e brasileiro de todos os tempos, respectivamente. Chico se foi, mas suas cerca de 500 obras psicografadas, traduzidas em diversos idiomas, que garantiram a manutenção dos seus trabalhos sociais, permanecem consolando corações. Com sua partida, a residência transformou-se em Museu e acolheu o Grupo Espírita da Prece.
Fátima Farias em visita a Chico Xavier com amigos da Paraíba Acervo da autora
E, para sintetizar sobre a vida e obra de Chico Xavier, está escrito no jornal Tribuna Espírita, nº 48/1990: 'Doente, deu saúde a milhares de pessoas. Pobre, consolou numerosos ricos. Sem títulos acadêmicos, psicografou uma verdadeira enciclopédia do espírito, versando os mais diversos temas de filosofia e da ciência. De sua boca jamais se ouviu uma palavra de pessimismo, de ódio e de revolta".
Grifo meu: somente palavras de amor, caridade, conforto e felicidade plena.
Gratidão Chico Xavier!!