Mas antes do Tejo, teve Gard du Nord (Paris), com destino a Bruxelas. Cerveja da boa, chocolates tantos e as lojas que me fizeram sentir nas histórias de João e Maria. A Grand-Place e eu com os olhos arregalados naquelas construções medievais lindas e misteriosas. A trilha sonora? Jacques Brel e a sua icônica “Ne me quitte pas”! De lá, também de trem, fomos num bate e volta para Bruges, essa cidade também de boneca, com jardins, parques, charretes, o Grot-Markt e um balde de mexilhões cozidos no vinho branco e aipo. Com as melhores batatas fritas. Assim dizem. Fiquei a mirar aquelas ruas estreitas e floridas e ver a cara de felicidade dos meus pais, quando por ali viajaram, pela primeira vez. As fotos dos meus pais nas ruas de Bruges, me fizeram brindar às suas vidas.
Ana Adelaide Peixoto e Lenita Faissal (Bruges, Bélgica) Acervo da autora
O que me pegou em Bruxelas? Além da beleza, da cerveja e dos chocolates? O Museu Magritte. René Magritte, esse artista do surrealismo com seus cachimbos, chapéus cocos, (e a ironia/pretensão absurda do realismo de mostrar a vida como ela é e as coisas como elas são); seus sonhos e murais loucos. A cada sala um susto. E mais ainda, na loja do museu, quando me admirava com os objetos, cadernos, posters, camisetas, cartões e tantas coisas, como aquele beijo enrolado nos panos. Os Amantes! Uma salsicha temperada e um chope no Parque Santa Catarina, bem em frente ao Palácio do Rei. Manifestações aconteciam nas ruas. Trânsito caótico e o Google Maps tinha cochilado. Aliás, quem não souber usar essa ferramenta, não mais viaja. Taxi, Taxi! Nenhum deles pelas ruas cinzentas. Caminhamos e caminhamos. Perdidas.
Ana Adelaide Peixoto / Museu Magritte (Bruxelas) Acervo da autora/Kasia Wisniowska
Mas, chegar em Lisboa é chegar em casa. Fernando Pessoa, deixei-me fotografar muitas vezes na sua estátua. A Livraria Bertrand bem em frente, folheei Sophia de Mello Breyner e O Nome das Coisas (o querido Zezinho Tavares me apresentou à sua poesia). E fui tomada pelo título: compêndio para desenterrar nuvens de Mia Couto. Namorei a estante especial da querida Annie Ernaux, e todas as estantes com os escritores que já ganharam o Nobel. Especial carinho para Paul Auster, que morreu quando estávamos por lá.
Bolinho de Bacalhau, Praça do Comércio, Azulejos e a Feira da Ladra! Quase me deixo roubar, pois queria comprar de um tudo. Para depois me perder nas vistas do Mirador Pedro de Alcântara com Lisboa aos meus pés. A cidade estava ainda enfeitada das celebrações do 25 de Abril. Cravos por toda parte. Senti um gostinho de Tanto Mar! Sardinhas do Pingo Doce. E vinhos por dois euros. Ai que vontade de comprar um carrinho e levar para casa. Azeite que te quero um, como na história. Ouvia Carminho pelas ruas. Pastel de Belém na Manteigaria! E descia naquelas escadarias sem fim do Mosteiro do Carmo. Morangos frescos na Praça do Rossio. E Ginginha com gosto.
Praça do Comércio (Lisboa) Acervo da autora
Por um dia, basta um dia, teve passeios ao Santuário de Fátima, e uma oração para desatar os nós e a Nossa Senhora, em memória do meu pai que era devoto. O Mosteiro da Batalha e sua arquitetura gótica e impressionante. Nazaré e as ondas gigantes. O meu frio na barriga na beira daquele farol, visualizando Maya Gabeira e a sua prancha imortalizada no museu. Um vento cais naquelas águas verde esmeralda, e um arroz de polvo meio fora do ponto. Óbidos, essa vila com uma muralha fortificada, fundada pelos Celtas, Romanos e Mouros. Branquinha, linda, com a sua típica Ginginha em cada esquina.
Óbidos (Portugal) Acervo da autora/Hasmik Ghazaryan Olson
Nas despedidas, atravessamos a ponte 25 de Abril em busca desse lugar de nome poético: Atira-te ao Rio, lá por trás dos montes. Digo da Almada. Um parque, o Tejo aos meus pés, e um polvo a lagareiro com suas alças molinhas e enroscadas. No caminho, locas e moradia ocupada pelos imigrantes. Ouvi Mia Couto e suas terras sonâmbulas. Desobediência – fala a biografia da poeta Maria Teresa Horta. Depois dos Fartas Brutos e do assento de Saramago nesse lugarzinho nas ladeiras do Chiado, atirei-me em grande estilo. Beirando o Tejo tive prazeres acalorados. Céu azul, dia lindo, turistas tantos, e o cheiro do azeite doce nas mesas. Uma noiva fazia sua despedida de solteira perdida nas gargalhadas e um grupo de amigas mais maduras, cantavam os “Feliz Compleaños”. Viva a vida!
Almada / Lisboa Acervo da autora / Atira-te Ao Rio
“Atira-te ao Rio”, me levou de balsa ao lado de lá. E novamente na Rua Augusta, me perdi por alhos e bugalhos, cartões e marcadores de livro, Uma casa portuguesa, com certeza, e essa certeza de que, quero voltar sempre a Portugal. O mundo é grande. E largo. E os rios? Penso no Guaíba e na Lagoa dos Patos, que transbordam horrivelmente. Enquanto o Tejo, esse, me pede para atirar-me, e assim o fiz. De dentro da balsa, avistando de longe um transatlântico e o Cais do Sodré que me esperava do lado de lá.
Meu caderninho de notas (com a capa de Brigitte Bardot) já não cabe mais de tantos clicks e senhas. Voltei!