Quando morei em Paris adaptei-me ao estilo cotidiano dos Cafés. Eles representavam para mim o próprio caráter da cidade cosmopolita. Qu...

Sobre os cafés de Paris

cafes paris franca turismo
Quando morei em Paris adaptei-me ao estilo cotidiano dos Cafés. Eles representavam para mim o próprio caráter da cidade cosmopolita. Quanto mais uma cidade possui Cafés, mais cidadona ela é para mim.

Eles são ao mesmo tempo interiores de intimidade e impessoalidade. De recolhimento e reunião. Esse gosto ancorou-se em mim com a longa permanência em Paris, a verdadeira cidade dos Cafés.

cafes paris franca turismo
cafes paris franca turismo
Cafés de Paris Venus Major
Os franceses levam uma vida inteira nos cafés. Escolhem o “deles” e fazem do lugar sua morada, seu escritório, no qual eles leem, escrevem, reúnem amigos, comem, bebem, festejam ou apenas se recolhem solitários.

O pessoal do café trata seu cliente habitual com familiaridade e cortesia. Como o Quartier Latin era o bairro de estudantes, professores, escritores, e artistas, o mundo dos cafés era o mundo deles. Não raro nos deparávamos com Roland Barthes, Philippe Sollers ou qualquer um desses nomes consagrados.

cafes paris franca turismo
Acervo da autora
O código rígido das relações da época, a formalidade da cultura francesa os protegia do assédio. O Café de Flore se eternizou como o lugar de Sartre e Beauvoir cuja mesa ficava no primeiro andar. A Brasserie Lipp era ponto de jornalistas, políticos, atores. Era o grand-monde do Bd.Saint Germain-de-Près. Mas entre o Bd. St. Michel e as pequenas ruas adjacentes como a rue de Buci, rue Dauphine, rue St.André-des-Arts, os cafés eram mais populares, podia-se ficar uma tarde inteira com apenas um pedido de um café sem ser importunada.

O La Palette na rue de Seine com seu belo interior decorado com as pinturas de alunos da École des Beaux-Arts situada no mesmo quadrilátero na rua Bonaparte. A sua clientela era quase exclusivamente dos alunos do curso de Belas-Artes. Naqueles anos havia uma atmosfera feérica, um ambiente anárquico, irreverente, ousado.
cafes paris franca turismo
Pedro J Pacheco/div>
Intenso como um nervo exposto. Jovens criativos rompendo regras tradicionais do comportamento social e sexual. Às vezes intimidativo, o modo como eliminavam barreiras de forma provocativa.

Ao mesmo tempo tinha-se a impressão de que havia algo de extraordinário em processo, a sensação de que éramos testemunhas de um acontecimento novo, onde a cadência da vida se acelerava, e costumes antigos morriam. O que acontecia parecia ser uma explosão criativa, alegre, extrovertida. Era o momento das instalações com objetos e esculturas, e performances divertidas. Escrevo “era” porque esse era o mundo do século passado.

Atualmente as grandes grifes e Mcdonald’s invadiram o bairro. O Drugstore St.Germain virou Armani, cinemas, livrarias e cafés fecharam, ou se transformaram em outra coisa. A paisagem humana dos cafés também mudou. Mas, é bem provável, que nos anos 1970 naqueles dias de euforia,
cafes paris franca turismo
@Rosalyn Ding
na Paris da grande concentração de pessoas pensantes, de lançadores de movimentos culturais, e de escolas de novas disciplinas e de novas formas de existir, talvez já contivesse o germe da transformação. A tarde do que estava por vir já se anunciava sem que se percebesse. A vida se transformava feito um vulcão em erupção. Por um momento vivemos dias instigantes e novas formas de vida se instalaram.

O tempo girou até se tornar o mundo de hoje: no qual tablets, computadores e celulares substituem quase por completo o livro em papel. Embora muitas livrarias, Sebos, bouquinistes ainda povoem a cidade. Ainda permanece a atmosfera viva na Place de la Sorbonne com alunos e professores discutindo nos cafés em torno de seus celulares e tablets. O café Boul’Mich desapareceu, há uma obra no lugar, no alto do boulevard o Café de la Gare se transformou em outro sem seu tradicional terraço com cadeiras sobre o boulevard.

cafes paris franca turismo
@Parisology
Eu já voltara muitas vezes a Paris, mas foi desta vez que mais senti as minhas referências apagadas. A Paris que vivi, hoje faz parte de uma história privada. A restauração da Notre Dame ainda em curso e às vésperas dos grandes Jogos Olímpicos para os quais a cidade se prepara com muitas obras, Paris virara um verdadeiro canteiro de obras com valas por todo Bd. St, Michel, Cais do Sena, Opera e adjacências. Vivi uma experiência na qual o interior e o exterior se espelhavam em busca de mim mesma?

COMENTE, VIA FACEBOOK
COMENTE, VIA GOOGLE

leia também