Dias atrás, por necessidade extrema, quando a cara-metade viajou para, como dizem, ir lamber a cria lá no Planalto de Piratininga, fiquei só. Na oportunidade (se é que posso chamar essa situação de “oportunidade”) estive mais perdido do que um cego no meio de um tiroteio.
Aqui sempre dividi tarefas, mas nunca precisei assumir sozinho essa lida toda. Tive que ir à pia e ao fogão, não rigorosamente nessa ordem.
Nas bocas fumegantes daquela engenhoca tentei algumas receitas, mas o que salvou mesmo foram o macarrão instantâneo e uma bandeja de ovos. Estes, os ovos, não requerem ciência no preparo e os preparei fritos ou cozidos. Também o cuscuz não reclama por um “chef”, coisa fácil de levar à mesa.
Salada não faltou: rúcula, alface, tomate, cheiro verde, uma pitada de sal e azeite. Tentei outras receitas mais sofisticadas, mas o paladar foi, no mínimo, discutível. Minhas vísceras tiveram que encarar algumas gororobas, mas o fizeram com bravura e destemor.
Na garrafa térmica não faltou café. Abasteci-me de frutas e pela manhã, o suco: abacate, mamão ou banana. Como podem ver escapei com vida e de fome não iria morrer. Mais adiante retornarei à cozinha.
Não deixei louça para lavar depois e a cozinha sempre um brinco com recomendou (na verdade, exigiu) a minha outra metade.
Empunhei bravamente uma vassoura e com mesma imponência e galhardia um rodo agasalhado por um pano de chão. Varri o quintal, lavei a varanda, tirei pó dos móveis, arrumei a cama e ainda queimei uns incensos para perfumar o ambiente.
Com banheiro tive cuidado especial, nada de manchas de pasta de dentes pela pia, e xixi fora do vaso, nem pensar. Mantive aquele cômodo digno de hotel cinco estrelas. Caprichei.
Como a máquina de lavar roupas requer determinados conhecimentos que não domino, também fui ao tanque e depois ao varal. Roupa suja não morou muito tempo no cesto a elas destinado.
Não deixei faltar águas às plantas.
Fico até com medo de que alguém que se digne a ler estes rabiscos vislumbre a possibilidade de me contratar para tarefas domésticas. Já vou adiantando que não estou disponível.
Mas voltando à cozinha para uma revelação. Fui ao YouTube para ver se havia algum vídeo com alguém ensinando como se prepara uma tapioca. Tive a pachorra de assistir pelo menos a uns três e depois fui tentar. Afinal, tela de computador e fogão não são a mesma coisa, nem parecidos são. Era preciso praticar.
E não é que deu certo?
Tornei-me um exper em tapioca, Aprendi a quantidade correta de massa levada à frigideira, o tempo certo na quentura...E já fui ampliando a receita: com coco, queijo, as duas coisas juntas. Com calabresa ficou supimpa. Com sardinha não achei lá essas coisas, mas a de queijo-manteiga, precisam ver só, de juntar água na boca.
Pela manhã o cardápio constou de um suco e uma tapioca. À tarde, batendo 4 horas, era hora levar ao fogo aquelas adoráveis féculas de mandioca com um daqueles recheios que já mencionei.
Meus amigos, minhas amigas. Sou uma outra criatura. Sou um homem que sabe fazer tapioca e tapioca da melhor qualidade. Chego a pensar que a humanidade está dividida em duas categorias de homens: os que sabem e os que não sabem fazer essa preciosidade de nossa culinária. Estou muito pimpão na primeira turma.
Orgulhoso dessa minha nova condição, quis dar as boas novas à consorte. Vou nestas linhas que me restam reproduzir o diálogo no WatsApp.
Eu: Mulher, nem lhe conto a novidade...
Ela: Qual?
Eu: Aprendi a preparar uma tapioca.
Ela: kkkkkkk
Eu: Estou falando sério. Precisa experimentar uma pra ver a qualidade.
Ela: kkkkkk
E assim foi, tudo que eu dizia para exaltar a novidade ela respondia com kkkkk
Meus amigos, minhas amigas, se alguém for fazer algum comentário sobre este meu depoimento, não maltrate meu coração como anda acontecendo nas mídias sociais, não escreva kkkkkk.
Respeitem-me. Sou um tapioqueiro da melhor qualidade.
