"Você ouvirá todos os dias as máximas de uma baixa prudência. Você ouvirá que o primeiro dever é conseguir terras e dinheiro, lugar e nome. "O que é esta Verdade que você procura? O que é esta Beleza?" os homens perguntarão, com escárnio."
Ralph Waldo Emerson
Ralph Waldo Emerson
Esta semana, me deparei com uma revelação intrigante: apesar de minha vasta experiência como jornalista e minha inata cautela, fui surpreendida pela ingenuidade, ao confiar em quem não merecia. O amargor inicial que experimentei era característico da tolice humana, uma nota desagradável que ressoa quando nos vemos ludibriados. Era o eco do meu orgulho ferido, da sensação de injustiça e da impotência
que nos atinge por não poder desmascarar a pessoa que usurpou algo abstrato e difícil de provar: uma ideia, um projeto, um sonho.
Após a turbulência inicial, mergulhei em reflexões profundas sobre os sentimentos que se agitavam em meu íntimo. Acredito firmemente que experiências como essa exigem uma análise minuciosa de cada um dos pensamentos que nos atravessam, pois estes são reveladores.
Encontrei-me diante de um dilema. Qual seria meu dever: buscar a justiça através de um processo que desencorajaria futuros atos de desonestidade, ou abraçar um princípio essencial em minha vida, o desapego, como fonte de libertação pessoal?
Os conselhos de amigos foram unânimes: "Procure reparação, é uma questão de justiça. Não permita que outros sejam ludibriados da mesma forma." Contudo, a complexidade do caso transcende as aparências. Embora possua evidências substanciais, empreender tal ação seria uma jornada custosa em termos financeiros, emocionais e temporais, com perspectivas incertas de sucesso. A apropriação de uma ideia é uma transgressão moral, mas sua natureza abstrata a torna esquiva aos mecanismos da justiça concreta.
Numa introspecção sincera, foquei no mais importante: o auto-exame. Qual é meu verdadeiro desejo nesse embate? A necessidade de expor o usurpador é motivada por necessidade de justiça ou por um impulso de vingança?
Ao confrontar essas questões, reconheci um anseio por uma resposta sincera e um pedido genuíno de desculpas, em vez das evasivas que recebi. Teria acolhido tal gesto e seguido adiante. Assim, as questões do desapego e da vingança encontravam-se respondidas. No entanto, não pude ignorar o ferimento infligido pelo cinismo das respostas, ecoando experiências passadas de confiança traída. O mundo literário-jornalístico é um campo minado de ciúmes, invejas e intrigas, onde o egoísmo muitas vezes esmaga a amizade. Meu cálice de amarguras transbordou, revelando feridas antigas que pensava já cicatrizadas. Esse confronto, embora doloroso, sinalizou o momento de restauração, de deixar para trás as mágoas acumuladas. Recordei que não sou única nessa experiência, que milhares compartilham dos mesmos desafios morais. E, acima de tudo, encontrei consolo na certeza de que é preferível ser enganada do que enganadora.
Foi num tranquilo passeio por Japantown que esses pensamentos ganharam mais solidez. Meu bairro, especialmente nesta época do ano, é encantador. Flores por toda parte, cerejeiras desabrocham diante do templo budista, crianças tomam sorvete, o cheiro delicioso da comida do restaurante coreano da esquina. Bordos e ginkgos exibem folhas tenras, verdinhas. Nenhuma nuvem no céu, passarinhos cantando.
Parei diante do templo para ler um cartaz: "As flores desabrocharão mesmo sem desejar. As flores cairão, não importa o quanto eu deseje o contrário". Sorrio. Indiferente aos meus desejos, a vida poderá tomar outro rumo e isso não poderá me deixar ansiosa e angustiada. Afastar-se do pensamento egocêntrico, abraçando tudo o que me chega e que não posso mudar, é o modo de vida que há muito escolhi para mim.
Em meio a essa serenidade, lembrei que tenho um romance para concluir, uma família para amar e um punhado de amigos verdadeiros. A luz desses pequenos tesouros dissipou a sombra da decepção.
O amor cura.