Alguns confrades afirmam que a tarefa de se publicar um livro tem algo a ver com um parto. Não conheço a dor de se trazer um rebento à luz, mas conheço as agruras que envolvem uma publicação. É deste afogo lancinante que tenho padecido de uns dias para cá.
Posto isto, e fazendo jus o que foi dito acima, tomo as linhas deste poderoso rotativo para comunicar aos meus diletos leitores e às estimadas leitoras que nesta quarta-feira, 3 de abril da Graça do Senhor, vou cortar mais um cordão umbilical, no caso do quinto rebento que estou trazendo ao mundo. O ato de obstetrícia em questão ocorrerá às 19h00 na Livraria do Luiz, a do MAG Shopping.
A obstetra será Cibele Laurentino, romancista, poetisa e que se prontificou a cuidar dos procedimentos e apresentar o danadinho ao mundo. Ele já virá com nome de pia e irá chamar-se MEMÓRIAS INDECENTES. Um nome um tanto quanto que profano e que pode sugerir maledicências por parte de almas menores que vivem à nossa espreita esperando oportunidades para descer a borduna da intolerância em nosso cangote. Antes que acionem os tacapes, me atreverei a algumas considerações.
Já lá em priscas este escrevinhador aqui desconfiava que esse mundão onde resolvemos existir definitivamente não é um bosque verdejante, cercado de campinas floridas. Há mais coisas aqui entre o céu e a terra do que possa desconfiar nossa vã filosofia, como já alardeara o bardo inglês, ou como se diz à boca pequena e com mais propriedade, o buraco é mais embaixo.
Por isso mesmo, ando meio empanzinado da literatura bem comportada, cheia de pruridos e com receios de suas páginas caírem em pecado. Resolvi abrir a janela e olhar a vida além dessa cortina de fumaça, vulgo mesmice. Foi então que tive a ousadia trazer como tema essa tal de vida, mas vida como a vida é.
Fui atrás daquele lado escondido, pantanoso, cheio de areias movediças e outras tantas armadilhas. Dessa minha ousadia nasceu o que seria um “conto grande” (que é diferente de um “grande conto”) ou até já o chamaram de romance. Nesses rabiscos deixei o despotismo de ser o condutor do enredo e entreguei a narrativa à responsabilidade de uma mulher. Aída é nome dela.
E aí cabe a pergunta: Onde fui encontrar essa criatura? Ah, meus amigos, minhas amigas, tivesse ela um pouquinho menos de sorte teria eu ido buscá-la nas prateleiras da vida. Ela driblou as maldades do destino e escapou. Conseguiu chegar ao avançado dos anos com um mínimo de dignidade. Haverão de me perguntar: Quem foi, Aída? Quem foi? Aída foi uma prostituta.
Sua trajetória está nas páginas deste folhetim. Precisam conhecê-la mais de perto. Viveu anos nessa penumbra moral, mas não perdeu a dignidade, seu coração não conseguia abrigar o mal e seus aliados próximos. Por vezes tentou escapar, atravessar a invisível fronteira, mas tragédias e outras circunstâncias impediram-na. Não é possível apresentá-la sem antes algumas conjecturas. Vamos lá.
Homens ditos respeitáveis, cidadãos das altas camadas, criaturas comuns, jovens mal saídos do coeiros, rapazes ditos “de família” são capazes de se apaixonar por uma prostituta? São. E elas são capazes de se apaixonar, por mais paradoxal que isso possa parecer? São também. É aí que a coisa pega!
Apresentei Aída a uma amiga (Ceres Barranjard) que gentilmente me rabiscou, ainda no ventre, a orelha desse menino que irei lhes apresentar com a ajuda de Nossa Senhora do Bom Parto, e o que disse ela? Estou falando da psicóloga e não da Santa.
[...] Aída é sociável e com apurado senso de humor é generosa e hábil nos relacionamentos interpessoais [...] Aída transformou a dor em sobrevivência. Superou solidão e tragédias encontrando significado e satisfação em sua vida.
Arrisco dizer que gostarão de Aída. E como é ela a narradora, algumas vezes usa de alguns eufemismos, noutras perde a paciência e recorre à malcriação para dizer o que sente ou pensa. Revelará os bastidores dos cabarés e não terá pejo para descrever pormenores de suas intimidades. No texto, tempera suas desditas com pitadas de humor quando possível.
Aída é do bem. Verão isso. Vejam-na com bons olhos. Nas últimas linhas ela se mostrará capaz de atitudes que só cabem em corações que habitam almas generosas, como a dessa mulher, prostituta, mas antes de tudo gente.
É isso meus amigos e amigas, antes que me venham as contrações, fica aqui o convite para que eu possa partilhar com vocês desse momento único. O endereço da “maternidade” está nas primeiras linhas e hora que o rapazinho (este meu opúsculo) virá à luz deixei lá também, Até lá.