MONÓLOGO A DOIS Falo a história dos dias, assim, despercebido, entoando versos que não ecoam mais o assombro da belez...

Vi essa praia crescer, derramar-se sobre o mar

poesia capizaba jorge elias neto
MONÓLOGO A DOIS
Falo a história dos dias, assim, despercebido, entoando versos que não ecoam mais o assombro da beleza Perto de mim há um anjo que me entende, e chutamos pedras As luzes polvilham a cegueira, e eles já não veem o bordado das asas, as tranças do anjo, a textura desalinhada de seus passos e me condenam a loucura (A praticancia desassistida de sonhos é o testemunho da morte que abomino) Beijo a boca do anjo e tento adivinhar o seu nome antes que desista deste Mundo e me abandone perdido em alguma esquina, repleta de olhares ausentes. (Lisboa, 17 de fevereiro de 2024)


ATERRO
À praia não chegaram rosas, não chegaram as cinzas de Gandhi ou um quase poema (desses que entardecem na memória). Nessa praia, vi a morte, nos olhos do amigo com sua camisa da seleção canarinho. Vi essa praia crescer, tomar forma, derramar-se sobre o mar sob a força das dragas e tratores. Vi Joana, a polonesa, com seus olhos azuis – Num tempo em que eu ignorava a Polônia e a poesia de Wislawa –; passei em suas costas o filtro contra o Sol, e como foi bom tocar a beleza. Despi mulheres nessa praia e alisei suas bundas como não fiz com Joana. Fiz da praia uma cama em um primeiro de Janeiro de um ano qualquer. Confiei nessa praia e me larguei inconsciente ouvindo um trem distante. Hoje, aqui estou na mesma praia embora o tempo da delicadeza tenha se esvaído ou, quem sabe, tenha sido sorvido por uma urgência surda para o que é eterno.


PARQUE MOSCOSO SURREAL
Chère imagination, ce que j’aime surtout en toi, c’est que tu ne pardonnes pas.(André Breton) Houve um tempo de mágicos e suas caixas que pariam imagens lambidas como crias: do chafariz neoclássico onde os jacarés de papo amarelo tiravam sua madorna, da alameda de Oitis que levavam a um velho semáforo ignorado pelos pombos, da grande concha que imitava nossa voz, pontes com galhos de concreto sobre o lago onde brincávamos de equilibristas enquanto enormes tartarugas marinhas carregavam marrecos sobre os cascos.

COMENTE, VIA FACEBOOK
COMENTE, VIA GOOGLE

leia também