É raro, mas acontece. A prova – e a razão para comemorar – é a notícia da restauração de antigo e belo casarão do Centro Histórico para a instalação da futura sede da Secretaria de Estado da Mulher e da Diversidade Humana (SEMDH). Se não me engano, o imóvel, praticamente em ruínas, se situa nas Trincheiras e foi adquirido pelo governo estadual com a finalidade citada. É um valioso exemplo que é dado aos demais órgãos e entidades públicos, como também ao empresariado paraibano. Muita coisa bonita e importante, do ponto de vista histórico e cultural, ainda pode ser salva no Varadouro e no Centro da Capital se houver vontade para tanto.
Com a natural ampliação da administração pública estadual e a consequente saturação do Centro Administrativo de Jaguaribe, construído há décadas, outras Secretarias, autarquias e fundações poderão ir ocupando os imóveis antigos e degradados da área histórica da cidade, de tal modo que, aos poucos, o que hoje está morto irá ressuscitando e o que está em vias de desaparecer irá ressurgindo, para fruição estética e cultural dos nativos e dos turistas.
O sobrado onde será a nova SEMDH, segundo a notícia, tem mais de 120 anos de construído, possui ares senhoriais e conserva a fachada original. Por dentro, naturalmente será restaurado e modernizado, de acordo com as normas técnicas pertinentes, para atender as necessidades funcionais da Secretaria, tudo conforme se faz na Europa, por exemplo, onde o antigo convive pacificamente com o novo, numa harmonia que causa admiração a todos, inclusive aos nossos governantes tabajaras, quando se dispõem a ultrapassar os muros baixos da aldeia e ver o mundo.
É o que devia ter sido feito – e não foi – com o prédio do jornal A União, na Praça João Pessoa, posto ao chão desnecessariamente, por insensibilidade e provável insciência dos profissionais da época, aos quais cabia a intransferível responsabilidade de convencer os políticos de então da importância de preservar o conjunto arquitetônico e histórico da principal praça da Capital, belamente integrado pelos prédios da Faculdade de Direito, do Palácio da Redenção e do Tribunal de Justiça.
Nos países civilizados, onde já se derrubou muita coisa, diga-se de passagem, sabemos que há décadas se protege eficientemente o patrimônio histórico e cultural, sem prejuízo das novas construções que se fazem necessárias ao desenvolvimento urbano das cidades. A inigualável Paris dos bulevares atuais foi feita à custa de muita demolição no século XIX que talvez hoje não fosse possível, até porque a própria população, mais consciente e participativa, não aceitaria passivamente determinadas decisões do governo, como bem provaram os inesquecíveis acontecimentos de maio de 1968.
Esse imóvel da SEMDH, quando estiver pronto e inaugurado, certamente vai se destacar perante o seu entorno, quem sabe estimulando a restauração e ocupação de seus decadentes vizinhos, num movimento de virtuosa emulação, com ganhos imensos para a cidade. É assim que a coisa acontece: tão somente começando a acontecer.
Além das Trincheiras, a Avenida João Machado, por exemplo, possui vários imóveis antigos em condições de aproveitamento para os mais diversos fins, públicos e privados. Tambiá, idem, e assim por diante. Em pleno Ponto de Cem Réis, em frente ao Paraíba Palace Hotel, há prédios abandonados que requerem urgente atenção das autoridades municipais. A legislação ampara e autoriza a intervenção estatal na propriedade particular, quando feita no comprovado interesse coletivo e ressarcindo-se adequadamente o proprietário. Não é, portanto, por falta de lei que não se age. E justiça seja feita: nessa linha virtuosa, a atual administração estadual assumiu e recuperou o prédio do antigo Colégio das Neves, ao lado da Catedral, para nele instalar uma entidade dedicada à pesquisa. Foi um ganho imenso para a urbe pessoense.
A Capital paraibana é a terceira mais antiga do Brasil, como se sabe, pois já foi fundada com esse status de cidade. Tem, portanto, perante o país e o próprio povo, a obrigação de bem cuidar de seu passado urbano, o qual, se não foi grandioso porque sempre fomos modestos, possui reconhecido valor, cada vez maior à medida que o tempo passa.
Já dizia o saudoso Mocidade que “governo é pra sofrer”, ou seja, para ser criticado. Sim, no sentido construtivo da crítica, mas também, quando é o caso, deve ser louvado, para que não se diga que ninguém reconhece as boas decisões oficiais. Que fique então registrado: esse caso da SEMDH merece todas as comemorações.