Está aí um universo que nunca me encantou: o das celebridades, principalmente, o daquelas que alcançaram tal patamar sem nenhuma cont...

Eu, enfim uma celebridade

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Está aí um universo que nunca me encantou: o das celebridades, principalmente, o daquelas que alcançaram tal patamar sem nenhuma contribuição à humanidade, sem algum feito notável, estão ali por um suposto direito de herança, ou que é muito comum hoje, enricaram surrupiando o erário público. E como essa gente se acha e como gosta de aparecer.

Claro que há celebridades e celebridades. Há aquelas dignas de admiração e louvor e que não estiveram neste planeta a passeio.
De uma forma ou outra, fizeram ou tentaram fazer desse mundo um espaço melhor de se viver. Estas sim, como eu as admiro.

Diante desse quadro faz-se necessário que eu elenque meus motivos de não estar nem lá e nem cá.

Não estou no primeiro grupo por dois motivos: o meu saldo bancário não me habilita e por valores morais dos quais não abro mão.

Já no segundo grupo, estou de fora por não ter competência para estar nele. Nada fiz de relevante nesta vida para que minha biografia fosse digna de nota. Então, fico por aqui curtindo minha insignificância social.

Mas, não é que noites atrás fui atirado involuntariamente nesse pântano sombrio? Entenderam? Pois, sim; sem mais e nem menos, me senti como gente agasalhada pelo fardão da notoriedade. Meus amigos e minhas amigas, fui contemplado com um programa de televisão inteiramente dedicado à minha pessoa. Pelo menos foi o que vislumbrei por um espaço de tempo.

Uma tradicional emissora de TV teve a ousadia de fazê-lo. Vou contar.

Como algumas vezes acontece, adormeci no sofá da sala assistindo televisão. Naquela noite já vira um filme lá no NetFlix, depois mais um e nada do sono me socorrer.
Dia difícil, preocupações, situações pendentes. Nessas ocasiões ficamos matutando e de nada vale ficarmos contando carneirinhos pulando a cerca. Nada de dormir, até que fui buscar notícias nesses canais de TV aberta, Adormeci depois de dois escândalos em Brasília e um tiroteio no Rio de Janeiro.

Seria o sono dos justos, mas não foi.

De repente acordo com alguém gritando:

⏤ Ei, você aí.

Olhei no entorno. Ninguém. A voz retornou:

⏤ Ei, é com você mesmo.

Então olhei para a TV. Um sujeito engravatado e com cara de poucos amigos apontava o dedo para mim. Com a mão direita espalmada bati três vezes com os dedos no peito como que se eu perguntasse: “É comigo?”. A criatura continuou me encarando e seguiu com sua catilinária.

⏤ Claro, que é com você.

Se dissesse alguma coisa ele não ouviria. Resolvi encarar e ouvir o que aquele atrevido tinha a me dizer.

⏤ Sua vida não está lá essas coisas. Não é verdade?

Acenei a cabeça de um lado para outro como que concordasse um pouco com ele, mas nem tanto.

⏤ Como assim? Para com isso, sua vida tá difícil. Não se faça de desentendido.

Mantive a minha postura e fiquei todo ouvidos.

⏤ Fica nesse sofá velho pensando nos boletos que não vai poder pagar. E aquele empréstimo, hein? Não resolveu e sua dívida aumentou.

Então pensei: “Como é que ele está sabendo dessas coisas?”. Ele insistia:

⏤ Faz tempo que não paga o plano de saúde. Quando sua mulher descobrir, já viu o que vai acontecer.

Tive vontade de pedir para ele parar. Mas ele...

⏤ E fica com essa cara de idiota. Você tem que reagir. Sua vida pode melhorar.

Fiquei com os braços como se estivesse segurando uma melancia e fazendo um ângulo reto com os antebraços abri a palma de uma mão a bombordo e a outra a estibordo. Ele entendeu minha mímica.

⏤ E daí? Como vai sair dessa pindaíba? Vou lhe contar meu irmão. Ainda há esperança. A fé é o caminho de sua salvação.

Neste ponto do relato, reafirmo que o engravatado falava mesmo comigo. Ele percebeu minhas intensões e foi impositivo.

⏤ Nem pense em mudar de canal. Olhe nos meus olhos. Nossa conversa está só começando.

Ganhei macheza e mudei de estação. Dias depois, dei uma investigada e descobri que era um discurso pronto. Sempre é assim naquele canal, naquela hora.

Daí duas conclusões. Uma é que a audiência demonstra que tem muita gente no mesmo sufoco que o bonito aqui, daí o discurso do artista e a outra é que nem como celebridade a situação anda lá essas coisas do meu lado.

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  1. Anônimo8/2/24 15:21

    👏👏👏

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  2. Anônimo8/2/24 21:37

    Muito bom 👏👏👏👏👏👏❤️❤️❤️❤️❤️🪡✂️🧵

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  3. Ah querido Paiva, os relatos intrigantes do seu mundo imaginário me encantam! Encantar é o seu talento. Obrigada por tanto!

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