André Vidal de Negreiros foi um dos personagens que mais se destacaram, no século 17, na História do Brasil, o que pode se deduzir pelas palavras dos seus contemporâneos. O Padre Antônio Vieira, que “o conhecia pouco mais que de vista e fama”, escreveu que o rei português tinha como ele “mui poucos nos seus reinos”. O neerlandês Gaspar Barléu, que escreveu uma obra encomendada por Maurício de Nassau sobre o período nassoviano no Nordeste brasileiro, considerava Vidal “homem audaz, astuto e, conforme o negócio em que se empenhava, perverso ou enérgico”.
O próprio Maurício de Nassau também reconhecia a importância da liderança de Vidal de Negreiros nas lutas de resistência aos batavos. Em carta encaminhada, à Holanda, em 1640, Nassau relatava:
“A 19 de Janeiro recebemos noticias da Parahiba ácerca de Vidal [...] arrojou-se a entrar pela segunda vez na capitania e desta feita causou grande damno e queimou quase todos os cannaviaes. Resolvemos mandar immediatamente para lá o capitão da guarda Charles de Tourlon com cerca de mil homens, tanto soldados como indios, para livrar a capitania de novos damnos e ver se apanhava Vidal em alguma parte”.
Outro contemporâneo, Frei Manoel Calado, escreveu que André Vidal se tornara tão importante na resistência aos flamengos que Nassau mandara afixar editais “nas portas das freguesias” nos quais, segundo Calado, prometia “dois mil florins de prêmio, e perdão de quaisquer crimes que tivesse, a quem lhe desse a cabeça do Capitão André Vidal, ou o matasse”.
São obscuros os primeiros anos da vida de André Vidal de Negreiros. Ao que se sabe, ele nasceu na Paraíba, em data incerta, talvez na primeira década do século 17. Segundo o escritor paraibano Luiz Pinto, que fez uma biografia de André Vidal (utilizando-se de obra do historiador Maximiano Machado), ele era filho de um casal de portugueses que já residia, há muitos anos, no Brasil. Ainda conforme Luiz Pinto/Maximiano Machado, Francisco Vidal, pai de André, era senhor de um engenho localizado na várzea do Rio Paraíba.
André Vidal, ao final da sua vida, depois de ter governado o Maranhão, Pernambuco e Angola, passou a morar em um engenho localizado em Goiana e possuía várias propriedades e bens em Pernambuco e na Paraíba. Em testamento lavrado em 1680, dois anos antes da sua morte, Vidal de Negreiros declarou ser proprietário do engenho São João, na Paraíba. Desta sua declaração, alguns historiadores concluíram que este engenho seria de propriedade do pai de Vidal no Tempo dos Flamengos. Essa dedução não encontra respaldo nos detalhados documentos neerlandeses sobre os engenhos da Paraíba no período do chamado Brasil holandês, que indicam a inexistência, naquela época, de qualquer engenho pertencente à família Vidal. Um documento batavo chega a descrever o pai de André Vidal, não como “senhor de engenho”, mas como “um velho carpinteiro residente na Paraíba”. Meu saudoso amigo Guilherme Gomes da Silveira d'Avila Lins, um dos mais rigorosos pesquisadores da História Colonial paraibana, acreditava que o pai de Vidal poderia ter sido proprietário de um canavial.
Com poucas exceções, como a do historiador e professor Ângelo Emílio Pessoa, o fato é que a designação do pai de André Vidal como “senhor de engenho” vem sendo repetida, sem maiores ressalvas, nos escritos históricos, o que levou o escritor paraibano Celso Mariz a se referir ao antigo Engenho Itapuá, localizado no atual município de São Miguel de Taipú, como tendo pertencido à família Vidal no período da dominação holandesa na Paraíba, uma situação que poderia ter ocorrido após a expulsão dos batavos do Nordeste. Escreveu Celso Mariz sobre o Itapuá:
“No tempo dos holandeses pertencia ao pai de Vidal de Negreiros. O filho glorioso queimou-lhe os canaviais para deixar terra arrasada na frente do inimigo.”
O engenho Itapuá era um dos engenhos que pertenciam aos domínios de José Lins Cavalcanti de Albuquerque, avô materno do notável escritor paraibano José Lins do Rego. Embora não tivesse morado no Itapuá, o engenho fez parte da infância de José Lins, período no qual se baseou o escritor para a construção de grande parte da sua magistral obra. Nas suas visitas à Paraíba, José Lins ia ao engenho Itapuá, como ocorreu no seu aniversário de 50 anos, comemorado com um almoço no engenho. No seu livro memorialístico Meus Verdes Anos, Zé Lins escreveu sobre o engenho Itapuá:José Lins do Rego
“O meu avô todas as tardes sentava-se numa cadeira de palhinha ao lado de um grande banco. Já entrara o gado para o curral e os moleques tocavam a bomba que enchia o tanque para a serventia da casa. A água de beber vinha das vertentes do Itapuá, água doce e fina que se guardava em jarras enormes. Meu avô olhava para as suas posses sem arrogância de dono.”
Independentemente de ter pertencido ou não ao pai de André Vidal de Negreiros, merece ser transcrita a descrição de Celso Mariz para os últimos tempos de opulência do Engenho Itapuá:
“De ricas em ricas mãos, no fim do Império, estava nas mãos de um célebre e poderoso major Ursulino (Nota: Ursulino Cavalcanti Rego de Vasconcelos) [...] Com a morte de Ursulino toda a grande propriedade e fábrica passou a um genro e pouco depois ao coronel José Lins que a deu em dote de casamento à sua filha D. Maria e esposo Henrique Vieira [...] Morrendo Henrique antes de 1930, Dona Maria ficou à testa do engenho todo o resto da longa vida.
Sob seu domínio e hospitalidade, Itapuá subia de movimentação econômica e social. Não apenas quem era parente ou tinha negócio, famílias, turistas, literatos, políticos afluíam, José Américo foi conviva de muitas vezes. A dignidade e bondade da anfitriã, a alegria e beleza de filhos e filhas, o trato à mesa, o ambiente natural, explicavam esta atração.
E por fim o renome e a volta ali, em certas épocas, de José Lins do Rego, o grande escritor sobrinho de Dona Maria, prestigiando tudo. Ele de quem tudo ali fora enlevo da infância e era fonte de inspiração dos seus livros.
Dona Maria morreu em 1965, dando fim ao período áureo do Itapuá”.
Sob seu domínio e hospitalidade, Itapuá subia de movimentação econômica e social. Não apenas quem era parente ou tinha negócio, famílias, turistas, literatos, políticos afluíam, José Américo foi conviva de muitas vezes. A dignidade e bondade da anfitriã, a alegria e beleza de filhos e filhas, o trato à mesa, o ambiente natural, explicavam esta atração.
E por fim o renome e a volta ali, em certas épocas, de José Lins do Rego, o grande escritor sobrinho de Dona Maria, prestigiando tudo. Ele de quem tudo ali fora enlevo da infância e era fonte de inspiração dos seus livros.
Dona Maria morreu em 1965, dando fim ao período áureo do Itapuá”.