Resolvi começar a caminhar no parque próximo de casa. Logo nos primeiros passos descobri que precisava andar em zig zag desviando dos cocôs de cachorro que tinham por toda parte. Não demorou muito para sentir a necessidade de caminhar não só em zig zag mas de máscara pois um cheiro de xixi era demais. Entendo as necessidades dos animais em marcar território, mesmo que para os animais confinados em apartamento não façam o menor sentido, mas o instinto animal prevalece!
Ando mais um pouco e me deparo com o aglomerado dos tutores (é assim que agora chamam os donos dos animais) à espera de que os bichos se reconheçam. Segui na caminhada e resolvi ir pelas ruas próximas, foi quando observei nos porta lixo de ferro que ficam nas calçadas (aquelas para colocar os sacos grande de lixo) uma coisa inusitada, os tutores quando recolhem os cocôs dos cachorros amarram o saquinho com um nó e colocam nessas lixeiras, (será que imaginam que quando o caminhão do lixo passar, vai ficar esperando os garis catarem os saquinhos de cocô que estão pendurados?) Não sei qual é a lógica de quem faz isso, ou será que não se importam com quem não faz parte do mundo pet?
Tenho observado várias cenas. Foram elas que me levaram a pensar, — quem não é pet não é nada nesse mundo de hoje.
Comecei essa observação quando fui visitar uma amiga em um prédio desses grandes, com um apartamento por andar. Estou no elevador indo para o vigésimo andar. No décimo pára e entra uma senhora com seu pet de porte médio no colo, o cachorro devia estar pesando, a senhora começou a apertar o animal que deveria estar nas últimas para fazer suas necessidades, começou a soltar pum fedorento, e eu ali acuada, sem máscara, um vexame, a senhora sabia que se colocasse ele no chão poderia ser ali mesmo. Ela apenas comentou: só é permitido usar esse elevador com o cachorro no colo e de coleira. Para meu alívio chegou o meu andar.
Quando entro na casa da minha amiga tem três cachorros de pequeno porte que tomavam conta da sala. Ela disse senta no sofá, e eu meio sem jeito, fui procurando um lugar para sentar. De imediato dois dos cachorros subiram no meu colo e começaram a me lamber e fuçar meu corpo. Que situação!
Foi aí que fiquei pensando, pobre desses animais tendo que virar quase gente, andar todo dia de elevador, viver em sofá e ficar lambendo gente. Fui pesquisar sobre as raças que existem hoje e tem específicas para cada perfil de tutor. Será?
Outras situações me fizeram continuar na minha observação empírica. Estava na praia tomando banho de mar, quando vem uma pessoa com dois cachorros pequenos soltos da coleira, o tutor distraidamente caminhava apreciando a paisagem e as "fofuras" resolveram marcar território bem na canga da jovem que bronzeava seus costados ao sol. Não deu outra, foi bem nela. Eu que observava da água fiquei logo na espera, a próxima será a minha bolsa. Ainda bem que passaram direto. De outra vez foi a tutora com três cachorros, assim que chegaram na beira mar ela tirou as coleiras e cada um desembestou para um lado. Ela já não tinha mais fôlego, assoviando para chamá-los sem resultado, passaram por cima das cangas, latiram para as crianças pequenas nas piscinas feita pelos pais, que a essa altura já estavam com os filhos no colo. Ela se aproxima e diz, eles são mansos não mordem. Quem vai confiar?
Já vi chegarem com pet em cafés e a pessoa com o seu animal no colo, pergunta: posso ficar com ele na mesa? É manso, nem late para ninguém. Foi só entrar uma família com criança que o pet demonstrou seu alvoroço e não parava de latir. Os tutores nem ouvem, nem percebem que estão incomodando outras pessoas. São sempre superiores a tudo, chegam a tecer até comentários: precisa acostumar seu filho com animais. É uma fala tão inusitada que passei a entender que deve ser por sermos minorias. Precisamos de proteção.
Foi então que pensei! E se fosse fundada a sociedade protetora dos humanos sem pet. Precisamos de espaços nesse planeta habitado por animais de estimação. Vejam só, no meu bairro inauguraram duas lojas vizinhas, a primeira um hortifruti, loja pequena, mas aconchegante com tudo que necessitamos para o dia a dia. A loja ao lado enorme, parecia até um mini supermercado, cheia de luzes, pé direito alto, fiquei curiosa, o que será? Era um Pet Shopping, tão grande que imaginei, será que vão vender girafas e elefantes? Não, acessórios, comidas, brinquedos e roupas para cães e gatos. Estamos ficando acuados até no comércio. Hoje, damos dois passos e encontramos uma farmácia ou um pet shopping. Estamos perdidos, ou temos um pet ou nos entupimos de tarja preta. Passei por outra loja grande num bairro residencial, fiquei apostando com minha neta será uma loja de brinquedo nova? Resolvemos parar, era para pets. Ela, claro, ficou decepcionada e eu também.
Estava caminhando na praça quando vi uma jovem mãe segurando o seu filho no colo, confortável num saquinho tipo canguru, ele observando tudo com os olhos voltados para frente, observava alegre quem ia passando inclusive os pets. Foi quando se aproximou uma senhora com um cachorro no colo, a criança se animou, balançava as perninhas e sorria, a mãe parou para que ele se divertisse mais um pouco. A tutora do cachorro se aproximou e falou: que lindo os dois bebês com olhos azuis, iguais! De imediato procurei o outro bebê, aí entendi, o outro era o pet. A jovem mãe olhou para a senhora tão espantada como eu.
Já outro dia vi uma cena que quase paro o carro para ir socorrer uma senhorinha. Ela com seu pet (ele bem pequeno magrinho) no colo latindo bravamente para um Pitbull do musculoso rapaz que parado só faltava grunhir também.
Não sei se é só uma impressão, mas os tutores vão ficando parecidos com seus pets, ou são os pets que vão ficando parecidos com seus tutores. Até no andar se parecem. Deve ser pela rotina de descer para as necessidades, caminham numa simbiose que se tornam quase um mesmo ser.
Pode parecer loucura da minha cabeça, mas observem, na calçadinha da praia tem vários grupos que se reúnem toda tarde. Eles fazem festas de aniversário e encontros de pets. Foi lá que observei também essa semelhança.
Não pensem que não gosto de animais de estimação, gosto sim, já tivemos muitos, mas a relação era diferente, os cachorros sempre fora de casa, não entravam nos quartos, nem subiam nas camas e sofás, nem lambiam a boca de ninguém. Mesmo com meus filhos pequenos e a brincadeira solta, lembrava para eles – a língua que coça o furico é a mesma que lambe sua boca. Hoje isso não tem a menor importância para quem tem seus animais, dormem juntos, lambem até os bebês e beijam na boca dos animais. Os pets têm depressão e fazem até terapias. É cuidar do corpo e da mente!
Sei da companhia que os animais fazem para os humanos, cada vez mais solitários e como é importante para as crianças e adolescentes terem um pet por perto. Mas fico pensando, será justo para os animais serem humanizados dessa forma?
Não quero aqui ofender ninguém, mas é humanização demais para minha cabeça!