Na primeira parte do livro “O Homem que viu o disco voador”, de Rubens Teixeira Scavone, uma frase do novelista norte-americano Carl Sandburg é
citada como epígrafe:
“O homem branco riscou na areia um círculo pequeno e falou ao pele vermelha: isto é o que os índios sabem. Depois, riscando um círculo maior em torno do pequeno, acrescentou: e isto é o que o branco sabe. O selvagem tomou o bastão e traçou um círculo ainda maior, abrangendo
ambos os círculos, e disse: isto é o que branco e vermelho não sabem”.
O que é o conhecimento? De onde ele vem? Como emerge no ser humano? Como a humanidade o acumula?
Acho salutar começar um texto sobre esse tema com perguntas, como também concluí-lo.
A humildade diante do conhecimento ilumina o caminho para a sabedoria. Conforme disse Albert Einstein, "mais sabe aquele que se apercebe de que pouco sabe".
Reconhecer as limitações do próprio entendimento é o primeiro passo para a expansão intelectual. Para Sócrates, sábio é quem compreende a extensão da própria ignorância.
Ao aprender com os outros, como ensina Confúcio, abrimos as portas para uma sabedoria coletiva. "Aquele que aprendeu muito, ama muito", disse o sábio chinês.
A humildade perante o conhecimento enriquece o caráter, moldando-nos em seres mais completos e compreensivos. Ser humilde diante da vastidão do que se ignora não se traduz apenas em reconhecer lacunas, mas também em partilhar ideias. O aprendizado é um ato coletivo, onde o bom senso nos impele a reconhecer a influência dos que vieram antes de nós.
Diante do vasto universo do saber, cultivar a humildade é regar a semente de um entendimento mais amplo. Como disse Mahatma Gandhi, "a verdadeira educação consiste em pôr a descoberto ou fazer atualizar o melhor de uma pessoa".
Segundo o paradigma científico dominante, a percepção sensorial emerge como a porta de entrada inicial para o entendimento, com os sentidos desempenhando um papel crucial na absorção de informações do ambiente circundante. Em tal contexto, a memória seria o elemento central nesse processo, atuando como depósito para a retenção e recuperação de conhecimento ao longo do tempo. Nessa abordagem, os mecanismos de aprendizagem associativa, como o condicionamento clássico e operante, evidenciam a capacidade do ser humano em associar estímulos a respostas, contribuindo para a construção gradual do conhecimento, e adentrando o território da compreensão de conceitos, da resolução de problemas e da aplicação flexível do conhecimento em contextos diversos.
O conceito de plasticidade cerebral, ressalta a adaptabilidade do cérebro em resposta à experiência, revelando como o aprendizado não apenas molda a mente, mas também reconfigura sua própria estrutura física. A modelagem cognitiva, por meio da observação e imitação, desempenha um papel significativo na transmissão intergeracional de conhecimento e na formação de habilidades sociais.
A ciência atual aponta para a interação entre fatores neurobiológicos e ambientais. Estudos recentes, como os de Herculano-Houzel e Kandel, enfocam a importância da conectividade neuronal e da formação de sinapses na consolidação do aprendizado, numa abordagem neurocientífica que investiga os mecanismos cerebrais subjacentes à memória e à retenção de conhecimento.
Teorias contemporâneas em psicologia educacional, como as de Bransford e Schwartz, sublinham a relevância do contexto e da aplicação prática no processo de aprendizagem. A ideia de "aprendizagem situada" destaca a importância de incorporar o conhecimento em situações do mundo real para uma compreensão mais profunda e duradoura.
No âmbito da inteligência artificial, estudos de machine learning, como os de Bengio e LeCun, fornecem uma perspectiva inovadora ao investigar como algoritmos podem simular processos cognitivos humanos, contribuindo para a compreensão de padrões complexos de aprendizado.
Essa convergência de evidências e descobertas científicas revela que a apreensão de conhecimento é um fenômeno multidimensional, envolvendo aspectos biológicos, psicológicos e tecnológicos, numa integração que impulsiona a evolução das práticas educacionais e da compreensão sobre como otimizar o aprendizado humano.
Mas o conhecimento humano seria apenas a combinação de informações, experiências e reflexões, tanto internas quanto ambientais, que servem para moldar a nossa percepção do mundo, a partir de interações bioquímicas intra cerebrais?
Numa perspectiva onde a alma e o espírito se reduzem à "mente", a abordagem dominante sobre o tema ainda não está tão distante assim da "tábula rasa" de Locke, segundo o qual a mente humana é, inicialmente, como uma folha em branco, sem ideias inatas, pois todo conhecimento adviria da experiência sensorial, que se dividiria em duas fontes principais: a sensação, que informa sobre as ações provenientes dos sentidos, e a reflexão, que processa internamente as experiências, moldando e construindo gradualmente o conhecimento humano ao longo do tempo.
Fato é que há uma curiosidade inata que nos impulsiona a explorar, questionar e descobrir. Conhecer não é apenas acumular fatos, experiências, conceitos; é a capacidade de aplicar, contextualizar e compreender, num esforço que transcende as telas digitais e as páginas dos livros e se manifesta na prática cotidiana, na resolução de problemas e na tomada de decisões embasadas.
Além dos teóricos contemporâneos e de Locke, diversos outros pensadores e autores, de épocas distintas, contribuíram com diferentes perspectivas sobre a natureza e os limites do conhecimento.
Platão, na antiguidade, delineou a Teoria das Ideias, argumentando que o conhecimento verdadeiro é inato e reside no mundo das formas eternas. Aristóteles, por sua vez, enfatizou a experiência sensorial como a base do entendimento, promovendo a observação empírica como via para o conhecimento.
Na Idade Moderna, René Descartes, com seu "Cogito, ergo sum", inaugurou o racionalismo, defendendo a primazia da razão como fonte de conhecimento seguro.
Immanuel Kant, no século XVIII, propôs uma síntese entre empirismo e racionalismo, introduzindo a ideia de que o conhecimento é moldado pela interação entre a experiência e as estruturas a priori da mente.
No século XX, Ludwig Wittgenstein abordou a linguagem como um instrumento central para o conhecimento, enfatizando sua relação com a realidade. Por outro lado, Sartre explorou a subjetividade e a liberdade na construção do entendimento, destacando o papel ativo do indivíduo na busca pelo conhecimento. Jean Piaget desenvolveu a teoria do desenvolvimento cognitivo, enfatizando como as crianças constroem o conhecimento por meio da interação com o ambiente.
Ivan Pavlov explorou o condicionamento clássico, mostrando como as associações entre estímulos podem levar à aquisição de conhecimento. A teoria de Pavlov está centrada na aprendizagem associativa e no condicionamento clássico. Ele desenvolveu a ideia de que os organismos, incluindo os humanos, aprendem por meio da associação entre estímulos. Em suas experiências com cães, observou que era possível condicionar uma resposta automática a um estímulo previamente neutro após associá-lo repetidamente com um estímulo incondicionado. Segundo Pavlov, o conhecimento é adquirido por meio da formação de conexões entre estímulos e respostas, sugerindo que a experiência e a associação são fundamentais para a aprendizagem e, por extensão, para a aquisição de conhecimento.