Absolutamente normal: aquele desconhecido passa levando o cachorro de estimação e um periquito ao passeio matinal. O cachorro pequerrucho tem o hábito de cheirar o chão, instintivamente, à procura de uma pista. O periquito pousado ao ombro, dormitando, ao balanço das passadas do condutor. Este se mostra feliz em proporcionar aos bichinhos de estimação o sol morno, trajeto pela pracinha.
É um exemplo a atitude daquele homem: estímulo à paz, à simplicidade em viver. Almas insensíveis nem o notam. Ele nos concede uma lição que não cabe em tudo quanto foi escrito em teses ou erudições, além de discursos pronunciados na ONU.
Exagero? Julguem, lá. O ódio espalhado pelos quatro cantos do mundo, as bombas loucas que devoram inocentes, arrasam futuros, detonam sonhos, nação contra nação, reino contra reino, religião contra religião, picuinhas e detalhes de ideologias mancas, sabemos, jamais retrocederiam diante de um cachorro manso e um periquito dorminhoco. Parece que a insanidade estabelecida é onipotente e deusa impiedosa. Parece. O ser humano está cego às belezas de gestos enormes em pequeninas atitudes. Temos a impressão de que a vida é superada por esta cultura de destruição e morte que, de tão repetida, se torna aceita, vulgar, banal.
O periquito e o cachorro carregados quais troféus quase invisíveis pelas ruas e praças jamais têm a pretensão de se tornarem impedimento, estancarem a sangria geral ou a cura das mazelas do mundo. Mas a leitura que alguém faça quanto ao ícone ou símbolo representado pelos pequenos animais levados pelo dono mostra a harmonia que sugerem. Pelo menos, isso. Sabemos que os pacificadores foram abafados e crucificados, são gritos sem eco.
O periquito amarelo tranquilo, o cão manso inofensivos e o homem que dá o passeio com eles são referenciais, emblemáticos. Um alerta de que o humanitário gesto perdido num beco, caminhando pela praça é resgate. Sinal de salvação.