Sou fã da escritora, atriz, roteirista, Fernanda Torres, embora não tenha lido o seu romance de estreia, Fim. Acho-a uma atriz de pes...

Triste ''Fim''

serie fim globoplay televisao
Sou fã da escritora, atriz, roteirista, Fernanda Torres, embora não tenha lido o seu romance de estreia, Fim. Acho-a uma atriz de peso e engraçada. “Tapas e Beijos" me fazia rir muito. E os filmes Os Normais, O que é isso, Companheiro?, Terra Estrangeira, Eu sei que vou te amar, Casa de Areia, dentre tantos.

Recentemente foi lançada pela Globo Play a adaptação do romance homônimo para o canal. Direção de Andrucha Waddington e Daniela Thomas. Dez capítulos que percorrem os anos de 1968 a 2012, e os personagens, um grupo de amigos, da juventude à velhice de alguns. “Um grupo de amigos que não acredita que a vida se limita a encontrar o amor e ser feliz pra sempre. Uma história sobre a vida, vista pelos olhos de quem acaba de deixá-la.”, diz a sinopse.

serie fim globoplay televisao
Elenco da série "Fim" (Globoplay) @Marjorie Estiano Total
A abertura da série tem o mar. Revolto. Profundo e ameaçador. A trilha de Antônio Pinto/Gabriel Ferreira, é melancólica, assim como o passar do tempo, as lembranças e principalmente o não dito e não vivido.

A história é contada através dos amigos, e os casais entre eles: Ciro e Ruth (Fábio Assunção e Majorie Estiano), o casal protagonista. Lindos e jovens, amor à primeira vista. Dois belos jovens enamorados e mergulhados nesse amor. Exemplo para os outros. Mas quem gosta de exemplos? Ciro tem lá o seu segredo. E a forma de lidar com a ausência de filhos vai modificar para sempre esse sentimento para uma amargura sem fim.

serie fim globoplay televisao
David Júnior e Heloisa Jorge Paulo Belote
Neto e Célia (David Júnior e Heloisa Jorge) - o casal negro e certinho. Uma nadadora que se torna uma mulher patroa, que tem Neto no cabresto para evitar as tentações da década. Álvaro e Irene, ele um brocha realizado, como mesmo se define, e não só no sexo, mas um brocha na vida e no seu não lugar de amor. Irene, uma mulher literalmente histérica por não saber o que quer. Oprimida pelo tempo, não quer aquele casamento, não quer ser mãe, mas a vida lhe impõe tudo isso em nome da vida das mulheres. Débora Falabella dá um show com essa caracterização da mulher amarga. E Thelmo Fernandes, magistral como esse homem que aceita a sua rejeição e lugar de migalhas.

Ribeiro (Emilio Dantas) é aquele que sobra no amor e está sempre a querer a mulher dos outros, ou as novinhas. Atlético, trabalha à beira mar, e tem uma paixão escondida por Ruth, que em algum momento lhe agradecerá o que está por vir. Ao final da série, não aguenta constatar os (Se) que teriam sido a sua vida, se..... O seu rancor não coube em si.

serie fim globoplay televisao
Bruno Mazzeo e Laila Garin Paulo Belote
E por fim, Silvio e Norma (Bruno Mazzeo e Laila Garin), ele uma mistura dos tipos do seu avô Chico Anísio e um cafajeste que todos conhecemos, aquele que vive na esbórnia e que quer jogar merda no ventilador, no sistema, na sociedade, nos costumes e na aparente felicidade da vida burguesa e comezinha dos amigos. Já Norma, foi salva pelo bombo, e Silvio se considera o seu salvador da roça e da vida interiorana que iria ter. Sílvio, o mais cínico deles todos, só pensa em sexo, drogas e mulheres. Vive e morre para e por isso.

Confesso que nesse painel da revolução dos costumes, triste e amargo, traçado por Fernanda Torres, me reconheci em cada capítulo. É a minha geração, ou aquela que veio um pouco antes da minha, mas com certeza peguei as rebarbas da paixão de Ruth, das dúvidas irritadas de Irene, das tábuas de salvação de Norma, das certezas errôneas de Célia

Quanto aos homens, pude revisitar alguns amigos, da turma, da vizinhança, da minha geração. Dos casais, também vislumbrei pares. Uma personalidade aqui, um azedume dali, uma farra acolá, um desentendimento na esquina, uma ou várias traições atrás de casa, uma mágoa intransponível, aquela que invejava a minha vida e o meu lugar...

serie fim globoplay televisao
Fabio Assunção, Thelmo Fernandes e David Junior @Tudo Mais (Instagram)
Um painel da evolução dos costumes e uma triste amargura no ar, a série iluminou a geração careta de Copacabana e temas sobre o amor, o casamento, a traição, a acomodação, a rejeição, o rancor, o ter ou não filhos, os impedimentos sociais, a “ejaculação imobiliária de Ipanema”; “O que você vai fazer da sua vida?”, a saudade de tudo, a tristeza que não tem fim, a vida que acabou com a gente, a irreversibilidade do tempo, o não vivido, o não dito, e o “todo mundo tem uma história para contar”, me pegaram de cheio. Uma melancolia infinita me doía o estômago a cada capítulo e pude, sim, me reconhecer em muitas cenas.

Uma das músicas tema, “Divino Maravilhoso” , de Caetano Veloso e Gilberto Gil, e mais triste ainda com a perda da sua intérprete maior, Gal Costa, me levou a lugares tristes e saudosos. Os meus anos 70 e 80 com todas as suas alegrias, perdas e danos. “Nunca seremos tão jovens” e ou “com a idade o tesão migra”. Atenção para o refrão! Não tempos tempo de temer a morte! Nem no Carnaval, com as suas marchinhas, a não censura do que naqueles quatro dias tudo pode, a melancolia se escondia.

serie fim globoplay televisao
Ana Adelaide Peixoto e Alain Moszkowicz Acervo da autora
A série me levou às lágrimas muitas. Quanta tragédia de vida! Quantos desencontros e traições no amor e na amizade! Quantos desperdícios! Que nenhuma suruba/bacanal dava conta. E ao mesmo tempo, quantas vivências, experiências ricas, e entregas desenfreadas. Mas não se viveram essas décadas impunemente, e Fernanda Torres soube como ninguém pôr a ênfase nos lugares certos. Parabéns à escalação de atores, mas principalmente a Fabio Assunção que dá um show, e a Bruno Mazzeo como aquele que vive tudo como se o mundo fosse acabar ontem. Marjorie e Débora dão também o tom das mulheres massacradas pelo amor ou a falta dele. Bravo!

E eu? Fui ali olhar o mar, não tão revolto assim dos meus doces, alegres e também amargos anos.

COMENTE, VIA FACEBOOK
COMENTE, VIA GOOGLE

leia também