Está longe e faz muito tempo. Lembro quando foi o Natal que conheci, o primeiro e o último vivido em Serraria, depois de muitos tentar recordar as oportunidades reveladas a cada badalar o sino à meia noite.
Era o menino de seis anos. A vida estava em volta dos muitos que habitavam os sítios e percorriam as veredas e caminhos que levavam ao mesmo lugar.
Chris Gonzales
A casa não tinha muros, mas janelas escancaradas para receber a brisa e o sol que se esparravam pelas salas. No cantinho da sala, a árvore feita de galho de sucupira era coberta de papel celofane e com lã de algodão. Caixas de fósforos cobertas com papel se transformavam em pequenos presentes que ficavam pendurados nos galhinhos, dando clima natalino, tão esperado. Tudo nos fazia ver o menino que não brincava conosco.
No mais, eram o mulungu, os cedros e as laranjeiras em redor da casa que coavam a luz do sol e as nuvens se engalhavam.
A vida partia de dentro de casa para se misturar com as pessoas que passavam na estrada em frente a caminho de Serraria,
Nunca rabisquei nada sobre as flores do Natal e Ano Novo, tudo o que imaginava se misturava na minha imaginação, os maturis, as flores, os frutos do caju e da manga apareciam neste período do ano, quando não retardava a chuva de verão.
Os frutos pendurados nos galhos, os bolos e sucos na mesa consumidos com os olhos antes do anoitecer. “Não toque antes da hora”. A hora que não chegava. Muitas vezes o sono chegava antes da hora de consumir o que estava guardado para a noite de Natal.
Nada de presentes. O maior presente era relembrar o nascimento de um menino que tinha o nome de todos nós, e nem sabíamos onde morava.
Eduardo Vazquez Murillo
O Natal e Ano Novo que se comunicavam com a chegada pelas flores e no sentido dos frutos, consumidos como manar.
O sítio Tapuio vivia o encantamento, o poético, o mais universal gesto de igual sentimento.
Nas orações, os mais velhos pediam prosperidade, saúde e paz. O espírito do céu e da terra, invocado desde nossa descendência, que se revelava neste período para a eternidade aparecer nos gestos e nos sentimentos.
No íntimo, se pedia a germinação das bênçãos. Verdes para os campos, da terra brotar fartura e nos riachos a água para saciar a sede. Nos versos de Miguel Ángel Asturias, hoje revejo na mais poética e universal visão, igual no sentimento do chamando:
“Espírito do céu. Espírito da terra. Dai-nos nossa descendência, nossa posteridade, enquanto houver dias, enquanto houver alvoradas”.
Acordávamos com os sinos a badalar na manhã tão esperada. Salve o Natal de 1960. Ainda hoje desejo que a germinação de faça! - como cantava o poeta.
“Que numerosos sejam os verdes caminhos, as verdes sendas que nos dás!”