Em sentido comum, a palavra "nada" se refere à ausência de algo, à inexistência ou ao vazio. Em termos científicos, o mais próximo de tal ideia seria o vácuo no espaço, que consiste num ambiente que contém pouca ou nenhuma matéria, mas que, numa perspectiva mais acurada, está longe de ser realmente “nada”, devido à presença de campos quânticos. Na física e na cosmologia, a ideia do "nada" não se alinha com a ausência total de algo, pois, em escala subatômica, o vácuo quântico é um estado cheio de atividade. Na matemática, o mais próximo da ideia de "nada" são o zero e o conjunto vazio, dois conceitos fundamentais nas operações aritméticas e na teoria dos conjuntos, respectivamente.
Filosoficamente, o “nada” se trata de um conceito complexo e debatido. Parmênides acreditava que o "nada" era inconcebível, uma vez que a mudança, assim como a não existência, não passariam de ilusões.
Mestre Eckhart de Hochheim, representante da mística especulativa alemã, abordou o conceito de "nada" de modo transcendental, explorando a ideia de um estado de quietude e desapego das coisas materiais, em busca uma conexão mais profunda com o divino. O "nada" para Eckhart não era a ausência completa, mas sim um estado místico de plenitude, além das limitações e dualidades do mundo físico, uma abertura para a Presença de Deus. Angelus Silesius, poeta barroco do século XVII, também explorou o conceito do "nada" em suas obras, especialmente em sua coleção de poemas intitulada "O Peregrino Querubínico”.
Para Silesius, o "nada" é um estado de esvaziamento de si mesmo e de renúncia ao ego, na direção de uma maior união com Deus. Em sua concepção, ao se despojar do eu e das preocupações mundanas, a alma pode transcender para um estado de comunhão divina. O "nada" seria, assim, um caminho para a plenitude espiritual. Seguindo o mesmo viés místico, Heinrich Suso aborda a questão do "nada" de uma perspectiva mística e espiritual, segundo a qual o "nada" expressa um estado de ausência de apego ao ego e às coisas materiais. Segundo ele, ao transcender o ego e as preocupações mundanas, o buscador pode experimentar uma união mais profunda com Deus.
Para Schopenhauer, a existência é permeada por um desejo incessante e cego, que busca sua própria autoafirmação. A busca constante dessa Vontade é marcada pelo sofrimento, cujo alívio estaria na negação da Vontade, o que ele associava ao "nada".
Assim como Eckhart, Hegel não via o nada como vazio de significado, como uma ausência de ser. Em sua perspectiva dialética, o "nada" é um conceito dinâmico, desempenhando uma função importante na progressão do pensamento em direção ao absoluto.
Por sua vez, Heidegger considera o confronto com o "nada" como crucial para uma existência significativa, enquanto a inautenticidade ocorre quando as pessoas evitam essa confrontação, buscando distrações para evitar a angústia associada ao "nada".
Já Sartre, em sua abordagem existencialista, destacou a liberdade humana e a responsabilidade vinculada a ela, afirmando que o "nada" é a base do arbítrio humano, pois cada qual seria livre para escolher em um mundo sem significado intrínseco. Ele, inclusive, categoriza o "nada filosófico", chamando-o de "néant", diferenciando-o do "rien" corriqueiro.
O "nada" na literatura também costuma ser explorado como um tema existencial, com autores buscando dar significado ao vazio, seja através do silêncio, da ausência ou da negação, numa abordagem que reflete sobre a condição humana, o seu significado ou falta dele. Autores como Samuel Beckett em "Esperando Godot" exploram a falta de propósito como elementos centrais de suas narrativas. Albert Camus, em sua obra "O Estrangeiro", também aborda a sensação de absurdo e a falta de significado inerente à vida.
As concepções artísticas sobre o "nada" costumam explorar o tema questionando a objetividade na arte e criando obras que desafiam categorizações tradicionais. O compositor norte-americano John Cage, concebeu uma obra musical experimental intitulada de "4'33", e que consiste numa peça que apresenta um tempo de performance no qual os músicos permanecem em silêncio. O título se refere à duração da peça, que tem quatro minutos e trinta e três segundos.
Artistas plásticos também buscaram traduzir o “nada”. A obra do escultor francês Marcel Duchamp, confeccionada em 1913, desafia a ideia tradicional de escultura, apresentando uma roda de bicicleta montada em um banco. Yves Klein igualmente explorou o conceito em sua criação, expondo um espaço vazio, e convidando os espectadores a contemplarem “o nada”.
Em "A Arte do Nada", o artista britânico Martin Creed também concebeu uma instalação em que um quarto oco é apresentado como obra de arte, explorando a ideia do "nada" como conteúdo artístico. Na mesma linha, o norte-americano-sueco Claes Oldenburg, através do seu trabalho "A Ausência Completa de Qualquer Coisa”, criou uma obra que parece ser uma caixa vazia, que destaca a ideia de ausência.
Mestre Eckhart dizia que o pior vazio é estar cheio de si mesmo. Segundo ele, as preocupações pessoais e as coisas materiais sufocam e cegam quem se apega a elas. A cura seria aquela encontrada por Silesius que, deixando as cortes, nas quais atendia como médico, descobriu no socorro gratuito aos doentes pobres, o propósito de sua existência. Para Silesius, o homem é como o zero, pois só ganha significado e valor quando se associa ao 1, que é Deus. Um conjunto de zeros nada vale, mas quando o 1 é posto do seu lado esquerdo, ele pode ganhar diferentes ordens de magnitude, dependendo da quantidade de zeros nele contida.
Particularmente, tenho maior afinidade espiritual com as perspectivas de Eckhart, Silesius e Suso sobre o tema, mas não posso deixar de mencionar a intrigante resposta dada por uma aluna ao seu professor de filosofia, que a perguntou sobre o significado do nada. Intrigada, a estudante apenas respondeu: “Professor, eu não sei o que lhe dizer sobre isso, porque para mim o nada é nada, mas para o senhor deve ser alguma coisa...”