No Brasil, a Roda dos Expostos foi proibida a partir do Código de Menores de 1927 em seu artigo 15:
“A admissão dos expostos à assistência se fará por consignação directa, excluido o systema das rodas”.
Tive a oportunidade de ver uma em um antigo convento em Igarassu, Pernambuco. Fiquei girando curiosa para ver realmente se a identidade das pessoas poderia ser preservada ao depositar o recém-nascido naquela engenhoca, tocar o sino e sair correndo. Realmente, era um mecanismo interessante para preservar (sobretudo) a honra de famílias abastadas.
Em João Pessoa, resolvi pesquisar no arquivo da Arquidiocese da Paraíba. Verifiquei livros de batismo a partir de 1833. Fui informada, ali, de que não existem livros anteriores a 1833, devido a um incêndio.
Consultei a constituição da antiga cidade da Parahyba e proximidades e me deparei com uma capital formada majoritariamente por uniões de fato e uma população miscigenada, mas sem uniões de mulheres brancas com negros retintos.
Muitas mulheres brancas pobres, mulheres pardas pobres e mulheres negras libertas, a maioria solteiras unidas a homens pardos livres pobres, homens brancos pobres e homens negros escravizados.
As brancas pobres se relacionavam com brancos ou pardos pobres em sua maioria. As negras, com pardos pobres ou negros escravizados em sua maioria. E as mulheres “pardas” se relacionavam com todos os tipos pobres. Pelo registro dos batismos, a população de homens negros escravizados era maior do que a de mulheres negras escravizadas. Os filhos de uniões de fato eram reconhecidos como “naturais”. Os casamentos só ocorriam entre brancos com posses, Potiguaras no litoral norte e geralmente entre negros alforriados. É o que se verifica pelos filhos “legítimos” ou “legitimados”.
A população pobre dificilmente casava. Daí o motivo pelo qual todas as crianças do período de 1833 a 1838 colocadas na Roda dos Expostos crianças brancas adotadas por famílias de posses brancas, o que nos leva a crer que os bebês provavelmente eram fruto do “mau passo” de alguma sinhazinha.
Parei a pesquisa porque me senti afeiçoada àquelas crianças. Eram muitos “párvulos” de nome “José” ou “Senhorinha”… e eu parava para refletir sobre suas existências. Sem dúvida, eu me apeguei a elas. Mas fui atrás de outras curiosidades sobre a Roda dos Expostos.
No Rio de Janeiro, a “bruxa” Bárbara dos Prazeres ficou conhecida por usar crianças da Roda para rituais macabros que pudessem devolver sua beleza, dinheiro e dias de glória entre sua clientela. Por volta de 1790, ela foi parar no Arco do Teles, área do baixo meretrício carioca daquele tempo. Creio que muitas mães tinham medo de deixar seus bebês ao alcance da dita bruxa e o Rio de Janeiro viveu dias perturbadores.
O fato é que a Roda dos Expostos é o retrato de uma sociedade que repercutiu por meio de suas crianças a moral social de classes abastadas ou de mães pobres sem amparo. De qualquer forma, a violência adultocêntrica raramente não passa pelo papel sexual da mulher na sociedade e dos estigmas de classe.